TJMA - 0800124-59.2022.8.10.0119
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gabinete Do(A) Desembargador(A) Douglas Airton Ferreira Amorim
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Partes
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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27/10/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO MARANHÃO COMARCA DE SANTO ANTONIO DOS LOPES PROCESSO Nº 0800124-59.2022.8.10.0119 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE(S): LUIS GONCALVES SILVA REQUERIDO(S): BANCO BRADESCO S.A.
SENTENÇA Trata-se de ação cancelamento de empréstimo consignado c/c repetição de indébito c/c indenização por danos morais, proposta por LUIS GONCALVES SILVA contra BANCO BRADESCO S.A., ambos já devidamente qualificados nos autos.
A parte autora solicita a declaração de nulidade ou inexistente o contrato tabulado entre as partes, mais repetição do indébito, e indenização por danos morais.
A parte requerida citada apresentou contestação (id 93959131) requerendo o acolhimento de preliminares, bem como a improcedência da ação e elencou pedidos subsidiários em caso de procedência da ação, tais como a repetição simples, danos morais reduzido e abatimento dos valores depositados.
Em réplica a contestação (id 95781712) a parte autora rebateu as preliminares apresentada, o contrato acostado aos autos e enfatizou na procedência da ação.
Este é o relatório.
Passo a decidir.
Convém observar, de início, que, além de presentes os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular, o processo encontra-se apto para julgamento, em razão de não haver necessidade de produção de provas em audiência de instrução e julgamento, pois os informes documentais trazidos pela parte Autora e acostados ao caderno processual são suficientes para o julgamento da presente demanda, de forma que o julgamento antecipado da lide deve ser efetivado por este juízo, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil. É que o magistrado tem o poder-dever de julgar antecipadamente a lide, desprezando a realização da audiência para a produção de prova testemunhal, ao constatar que o acervo documental acostado aos autos possui suficiente força probante para nortear e instruir seu entendimento (STJ - Resp 66632/SP). "Presente as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever do juiz, e não mera faculdade, assim proceder" (STJ - REsp nº 2832/RJ).
Por certo, incumbe ao julgador repelir a produção de provas desnecessárias ao desate da questão, de natureza meramente protelatórias (art. 370, CPC), mormente quando se trata apenas de matéria de direito.
Ao que parece, esse é o caso dos autos, alicerçado em prova material.
Passo a análise das preliminares.
A preliminar de Falta de Interesse de Agir arguida pela requerida, não merece prosperar, posto que a discussão travada nestes autos gira em torno se ocorreu pretensão resistida para a devolução dos valores devidamente descontados de forma indevida na conta-corrente do autor.
A pretensão resistida é evidente, porque a reclamada, mesmo após o ajuizamento da ação em sua peça de Defesa, demonstra de forma clara e inequívoca que não concorda com os argumentos autorais e refutou em sua peça de defesa as alegações tabuladas na inicial.
Defiro o pedido de assistência judiciária gratuita, considerando que a possibilidade de sua concessão já encontrou solução pacífica em nossos Tribunais, sobretudo quando se reveste em elemento de reconhecido valor social, bastando que a parte o requeira com a simples afirmação de pobreza na forma da lei e que seja firmada pelo próprio interessado ou por procurador com poderes especiais, cabendo à parte contrária o ônus de comprovar tratar-se de declaração inverídica.
No presente caso, a requerida se contrapôs ao pedido autoral, entretanto não trouxe aos autos a prova da capacidade econômica da parte autora que pudesse inviabilizar tal pleito.
Assim, não acolho os argumentos da parte requerida.
Verificados os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido do processo, bem como as condições para o legítimo exercício do direito de ação, passo a decisão de mérito.
Merece ser destacado que a relação entre a parte autora e a parte requerida caracteriza a clássica relação de consumo, com a presença do consumidor e fornecedor, nos termos dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor.
Neste contexto também, mostra-se perfeitamente aplicável o disposto no art. 6º, VIII do Código de Defesa do Consumidor, o qual assevera que são direitos básicos do consumidor a facilitação de seus direitos, inclusive com inversão do ônus da prova a seu favor, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente.
Assim, constatada a hipossuficiência econômica, técnica e informacional da parte requerente frente a requerida, determino a inversão do ônus da prova, como medida de facilitação dos direitos do consumidor, o que o faço nos termos do art. 6º, inciso VIII do CDC.
Analisando as alegações deduzidas em exordial e na contestação, bem como documentos colacionados aos autos, verifico que merece prosperar, em parte, a pretensão autoral, tendo em vista a ocorrência de falha na prestação de serviço pela requerida.
Segundo a parte autora, não firmou o contrato de empréstimo consignado junto ao Banco requerido.
E, em casos como esse, não há como exigir que a parte autora forneça os documentos que atestem a inexistência de celebração de negócio jurídico entre ele e a empresa demandada, eis que é impossível à parte produzir prova negativa, no sentido de atestar que não realizou o contrato de empréstimo discutido nos autos.
A parte promovida, por sua vez, não se desincumbiu desse ônus, uma vez que o contrato trazido aos autos é claramente produto de fraude, como se verifica pelo contrato acostado aos autos em que se verifica que ele foi realizado de maneira contrária aos ditames do art. 595 do Código Civil para pessoas que não sabem ler e nem escrever.
O artigo 595 do Código Civil prevê que, quando um dos contratantes não souber ler ou escrever, o contrato deverá ser firmado a rogo e subscrito por duas testemunhas.
O contrato de empréstimo impugnado não cumpriram os requisitos de validade, pois foi apenas subscritos por uma testemunha, conforme se visualiza em Num. 93959132 .
Para celebrar contrato particular escrito, o analfabeto deve ser representado por terceiro que assinará a rogo, ou seja, terceiro que assinará no seu lugar, cuja assinatura não poderá ser substituída pela mera aposição de digital, bem como há a necessidade desse fato ser subscrito por duas testemunhas.
Compulsando o instrumento contratual acostado pelas partes se observa que a formalidade das duas testemunhas não foi cumprida, apenas a assinatura a rogo.
No aludido contrato apresentado pelo Banco requerido na página destinado para a assinatura de 02 (duas) testemunhas, não constam as assinaturas para dar validade ao contrato.
O art. 104 do Código Civil estabelece os requisitos para a validade do negócio jurídico: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei".
Diploma Civil normativo prevê ainda: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: (...) IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua Pontua-se que o Código Civil prevê que nos contratos, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por 02 (duas) testemunhas (art. 595, CC), todavia, no caso em apreço envolve um contrato de empréstimo bancário concedido a uma pessoa analfabeta, onde exige um maior rigor formalidade para a celebração do negócio.
No entanto a parte requerida apresentou o contrato sem as assinaturas das 02 (duas) testemunhas, demonstrando assim ausência de um dos requisitos para que o contrato tenha validade.
Destarte, considerando que no contrato bancário celebrado não tenha a subscrito ainda por 02 (duas) testemunhas no caso de analfabeto, este procedimento não se mostra revestido das formalidades legais, não sendo admitido, e, portanto, conclui-se que o instrumento é inválido para os fins a que se destina, sendo assim nulo o negócio e também seus efeitos.
Portanto, não havendo comprovação que, de fato, foi a parte autora quem contratou o empréstimo consignado, deve o Requerido reparar o prejuízo material suportado pelo Autor, restituindo todo o valor indevidamente descontado de sua aposentadoria.
Neste caso, considerando a nulidade do contrato, indevidos são todos os descontos efetuados no benefício previdenciário do autor.
Desta forma, havendo indícios de fraude caberia à instituição bancária comprovar a ausência de falha na prestação de serviços ou a culpa exclusiva do consumidor, mormente quando é de conhecimento comum que a segurança nas transações bancárias é passível de violação.
Verifico, assim, que o BANCO requerido não comprovou minimamente a regularidade da pactuação impugnada pela parte autora.
Nesse sentido, o ônus de provar a contratação do empréstimo de forma regular é do Banco Requerido, contudo esse não trouxe aos autos qualquer elemento cognitivo que garantisse que a negociação foi legitimamente feita, não trouxe contrato válido da suposta negociação.
Na medida em que o Banco foi desidioso quando da prestação dos seus serviços, ele naturalmente deve assumir os riscos decorrentes dessa conduta, sobretudo porque aufere expressivos lucros com sua atividade.
Falho o sistema, quem deve arcar com suas consequências não é o consumidor, mas aquele que exerce a atividade empresarial.
Em conformidade com o que preceitua a teoria do risco, é o banco requerido que deve ser responsabilizado pelos danos decorrentes da sua conduta.
Assim, aplica-se, na espécie, a Teoria do Risco, segundo a qual as atividades desenvolvidas pelo demandado possuem naturalmente riscos de que terceiro tente fraudar o negócio jurídico não sendo, portanto, fato estranho, logo cabe ao Banco, ora requerido, adotar todas as medidas para evitar este evento.
Sobre o tema, trago à colação o que dispõe o artigo 927 do Código Civil, verbis: Art. 927.
Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único.
Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (grifo nosso).
Os fornecedores de serviços ou produtos devem ter cautela quando da realização dos contratos, pois, diante das normas previstas no CDC, assumem a responsabilidade pelo dano causado aos consumidores.
No caso sob análise, entendo ter havido negligência da empresa requerida, mormente quando não tomou os cuidados necessários quando da pactuação do contrato impugnado pela parte promovente.
Dessa forma, a instituição ré tem responsabilidade para com a parte autora, já que, com sua conduta desidiosa, causou-lhe danos que devem ser reparados.
Na espécie, a parte requerente teve sua aposentadoria reduzida em virtude de descontos provenientes de uma contratação que não realizou.
Sendo importante destacar que tal verba tem natureza alimentar, o que torna a conduta do banco requerido ainda mais reprovável.
Portanto, entendo indevidos os descontos realizados no benefício previdenciário da parte promovente.
Atinente ao pedido de repetição do indébito, entendo cabível.
O CDC assim prevê: Art. 42. (...) Parágrafo único.
O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
No caso em apreço, é inegável que o consumidor autor, pessoa já idosa e, portanto, hipervulnerável no mercado de consumo, foi cobrada em quantia indevida.
Outrossim, a ressalva de engano justificável constante do referido dispositivo legal não se aplica, pois os descontos foram realizados no benefício previdenciário da parte promovente sem amparo em negócio jurídico-legal que os legitimasse.
Admissível, pois, por determinação do parágrafo único do art. 42 do CDC, a restituição de todos os valores subtraídos indevidamente do benefício previdenciário da demandante decorrentes do contrato objeto desta lide.
Cabível, desse modo, a declaração de inexistência do negócio jurídico, bem como a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente do benefício previdenciário da parte demandante, conforme requerido na inicial.
Desta feita, à luz dos documentos juntados pela autora, verifico que foram comprovados os descontados os valores de e R$ 325,85 (trezentos e vinte e cinco reais e oitenta e cinco centavos), que dobrados importam em R$ 651,17 (seiscentos e cinquenta e um reais e dezessete centavos), devendo ser corrigidos da data de cada desconto.
Indefiro o pedido de compensação de crédito da parte requerida, tendo em vista não ter sido comprovado que o depósito dos valores por meio de TED.
No que se refere ao pedido de condenação em danos morais, entendo que merece prosperar, em parte, a pretensão da parte requerente.
Aqui o dano moral não depende de prova do abalo psicológico sofrido pela vítima.
Trata-se de dano que resulta da simples conduta desidiosa e gravosa do agente ofensor, sendo presumidos os prejuízos alegados pela parte autora, que, vale repisar, teve parte de seu benefício previdenciário limitado, verba de natureza alimentar.
A partir de tais ponderações, é inegável a responsabilidade civil da requerida pelos danos causados à parte promovente, assim, tenho como configurados o dano moral e o dever de indenizar.
Ultrapassada essa questão, passo a analisar o “quantum” indenizatório a ser arbitrado, que deve o magistrado se orientar pelo princípio da razoabilidade e proporcionalidade.
Não se deve fixar um valor a permitir enriquecimento ilícito, assim como não se pode condenar em quantia que não represente uma sanção efetiva ao ofensor.
Ademais, tenho que a reparação pecuniária visa a proporcionar uma espécie de compensação que atenue a ofensa causada, atentando-se que, ao beneficiário, não é dado tirar proveito do sinistro, pois não se destina a indenização ao seu enriquecimento.
Por conseguinte, o valor deve ser apenas o suficiente ao reparo, sob pena de estar o Judiciário autorizando o enriquecimento sem causa da vítima e, dessa forma, contribuindo para a formação da desditosa “indústria das indenizações”.
Por outro lado, também é preciso observar a indiscutível função punitiva de que se reveste a reparação por dano moral.
Em suma, o valor da indenização deverá ser estipulado não apenas visando à compensação do dano, mas, também, como forma de sanção ao responsável pela atividade danosa, ou seja, em quantia que realmente atinja o causador do prejuízo, com intuito pedagógico, a fim de evitar comportamento semelhante em outros casos.
Finalmente, quanto ao pedido contraposto requerido pela parte demandada em sua contestação, entendo não ser cabível, posto que não logrou êxito em demonstrá-lo, uma vez que não juntou comprovante de que o valor do empréstimo combatido foi depositado na conta da parte autora e que essa tenha recebido/usufruído.
Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do novel Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS, para resolver o mérito da demanda e: a) Declarar inválido o contrato de cartão de empréstimo consignado nº 0123319605679, condenando o Banco requerido a pagar os danos materiais no valor de R$ 651,17 (seiscentos e cinquenta e um reais e dezessete centavos), corrigidos monetariamente da data de cada parcela indevidamente descontada com base no INPC. b) condenar o requerido a pagar a autora, pelos danos morais suportados, a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais) corrigidos com juros de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária pelo INPC, a partir do arbitramento (sentença); Condeno a ré ao pagamento das custas judiciais, bem como, honorários de sucumbência, estes no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, com fulcro no art. 85, §2º do NCPC.
Havendo interposição de recurso (s) na forma legal, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões.
Após, remetam-se os presentes autos ao Tribunal de Justiça do Maranhão, com nossas homenagens de estilo, uma vez que não cabe juízo de admissibilidade nesta instância singular.
Após o trânsito em julgado, e cumprimento da obrigação de fazer e pagar, inexistindo pendências, arquivem-se estes autos.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Santo Antônio dos Lopes/MA, na data do sistema.
JOÃO BATISTA COELHO NETO Juiz de Direito Titular da Comarca de Santo Antônio dos Lopes/MA -
10/05/2023 08:10
Baixa Definitiva
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10/05/2023 08:10
Remetidos os Autos (outros motivos) para Instância de origem
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10/05/2023 08:10
Expedição de Certidão de trânsito em julgado.
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10/05/2023 00:02
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 09/05/2023 23:59.
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10/05/2023 00:02
Decorrido prazo de LUIS GONCALVES SILVA em 09/05/2023 23:59.
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24/04/2023 15:53
Publicado Decisão em 14/04/2023.
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24/04/2023 15:53
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 13/04/2023
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13/04/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MARANHÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0800124-59.2022.8.10.0119 APELANTE: LUIS GONCALVES SILVA Advogado: Kayo Francescolly de Azevedo Leoncio (OAB/PI 19.066) APELADO: BANCO BRADESCO S/A Advogado: Wilson Sales Belchior (OAB/MA 11.099 A) RELATOR: Desembargador DOUGLAS AIRTON FERREIRA AMORIM EMENTA: PROCESSO CIVIL.
RECURSO DE APELAÇÃO.
DE NULIDADE DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO CC COM DANOS MORAIS.
AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL.
INDEFERIMENTO DA INICIAL.
EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
ARTS. 321, §ÚNICO, E 485, I, DO CPC.
DESCUMPRIMENTO DE DETERMINAÇÃO JUDICIAL.
COMPROVAÇÃO DE PRETENSÃO RESISTIDA.
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO PRÉVIO.
EMPREGO DE MEIO EXTRAJUDICIAL DE RESOLUÇÃO DO CONFLITO NÃO OBRIGATÓRIO.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL.
AFRONTA A PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL.
ACESSO AO JUDICIÁRIO.
INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO.
MATÉRIA CONSOLIDADA NESTA CORTE.
DECISÃO MONOCRÁTICA.
PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E DA PRESTEZA JURISDICIONAL.
ART. 932 DO CPC.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Apelação Cível interposta por Luis Gonçalves Silva, em face da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Santo Antônio Dos Lopes/MA que, nos autos da presente ação, indeferiu a petição inicial, extinguindo o processo sem resolução do mérito, uma vez que a parte autora, ora recorrente, não demonstrou seu interesse de agir através da comprovação de pretensão resistida.
Irresignado, o recorrente alega, em síntese, que o indeferimento da inicial é injustificado, uma vez que a exordial preenche os requisitos legais, bem como fora instruída com os documentos que comprovam a verossimilhança de suas alegações.
Acrescenta que o uso dos meios alternativos de resolução de conflito é uma opção potestativa do consumidor e não obrigatória, tampouco constitui condição da ação.
Por fim, sustenta que a extinção do processo sem resolução do mérito, nos moldes realizados, dificulta o acesso à jurisdição e a fluência natural do processo, a qual tem como primazia a resolução do mérito.
Sem Contrarrazões do apelado, conforme Certidão de Id.21305332.
Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça (Id. 22884032) se manifestando apenas pelo conhecimento do recurso, deixando de opinar sobre o seu mérito por inexistir, na espécie, qualquer das hipóteses elencadas no art. 178 do Código de Processo Civil.
Era o que importava relatar.
DECIDO.
Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, sendo o recorrente beneficiário da Justiça Gratuita, conheço do presente recurso e faço uso da prerrogativa constante no art. 932 do CPC, bem como dos princípios da celeridade processual e da presteza jurisdicional, para decidi-lo monocraticamente.
Compulsando os autos, verifico que o juízo de origem indeferiu a inicial, sob a justificativa de que o apelante não comprovou seu interesse de agir (pretensão resistida), através da apresentação de requerimento administrativo prévio.
In casu, considero que o entendimento lançado na sentença recorrida não aplicou o melhor direito à espécie.
Explico: O interesse de agir da parte promovente independe de anterior busca extrajudicial de resolução do problema, seja por meio de canais oficiais do banco apelado seja através de plataformas digitais de conciliação.
Acrescento que na Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), não há a imposição de utilização de meios extrajudiciais de resolução de conflito.
Da mesma maneira, na Resolução GP nº 43/2017 deste Egrégio Tribunal se identificava apenas a recomendação de utilização das plataformas digitais ou outros meios de conciliação.
Cumpre, ainda, ressaltar que com a edição da Resolução GP 31/2021 TJMA, o Pleno desta Corte revogou a Resolução GP nº 43/2017, supramencionada.
Nesse cenário, não restam dúvidas a respeito da irrazoabilidade da imposição do emprego das plataformas digitais de conciliação ou de qualquer outro meio de resolução extrajudicial de conflito à parte que ingressa com ação no Poder Judiciário.
Ademais, a Constituição Federal Brasileira consagra o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV), lhe conferindo, inclusive, o caráter de direito fundamental inserido em cláusula pétrea. À vista disso, não há de se falar em extinção do feito no molde realizado pelo juízo a quo, perante a ausência de amparo legal e a flagrante afronta a princípio constitucional.
Corroborando o exposto, seguem os seguintes arestos deste Egrégio Tribunal: EMENTA DIREITO CONSTITUCIONAL, DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO ORDINÁRIA.
DECISÃO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO PARA COMPROVAÇÃO DE CADASTRO DE RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA.
PEDIDO DE REFORMA.
PROCEDÊNCIA.
RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA OU TENTATIVA DE SOLUÇÃO EXTRAJUDICIAL DO CONFLITO QUE NÃO CONSTITUEM REQUISITOS INDISPENSÁVEIS PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO NOS TERMOS DOS ARTS. 319 E 320 DO CPC.
REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA QUE SE IMPÕE PARA DETERMINAR A CONTINUIDADE DO FEITO.
AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO. 1) Dispõe o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. 2) Na mesma linha, o art. 3º, caput, do CPC, reiterando garantia constitucional já citada, determina que “não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito”. 3) Já o art. 3º, § 3º, do CPC, estabelece que “a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”. 4) Nesse contexto, no âmbito das demandas abrangidas pelo Código de Defesa do Consumidor, a propositura de ação judicial e o seu processamento não estão condicionados à juntada de protocolo de reclamação administrativa ou de qualquer tipo de comprovação de tentativa de resolução extrajudicial do conflito, mesmo porque não há amparo legal para essa imposição, de modo que a suspensão do processo se mostra indevida quando impõe à parte um ônus não previsto em lei para o ajuizamento de sua demanda. 5) Agravo de Instrumento conhecido e provido. (TJMA – AI: 0802333-67.2022.8.10.0000, SÉTIMA CÂMARA CÍVEL, Rel.: Des.
TYRONE JOSE SILVA, Sessão Virtual de 26 de abril a 03 de maio de 2022) APELAÇÃO CÍVEL.
DIREITO CIVIL E CONSTITUCIONAL.
AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM.
ALEGAÇÃO DE EMPRÉSTIMO FRAUDULENTO.
DETERMINAÇÃO JUDICIAL DE EMENDA À INICIAL PARA JUNTADA DE COMPROVANTE DE ENDEREÇO ATUALIZADOS E DEMONSTRAÇÃO DA RESISTÊNCIA DA PRETENSÃO.
NÃO ATENDIMENTO.
EXTINÇÃO DO PROCESSO.
DESNECESSIDADE DA JUNTADA DE TAIS DOCUMENTOS.
PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DE MÉRITO.
SENTENÇA ANULADA.
APELO CONHECIDO E PROVIDO.
UNANIMIDADE.
I.
Ao revés do assentado pelo magistrado a quo, não é necessária a juntada de comprovante de endereço atualizados, pois todos os documentos juntados pela apelante presumem-se autênticos, até que sejam impugnados pela parte contrária, sendo, portanto, equivocada a determinação de emenda à inicial, neste particular.
II.
Em relação à necessidade de comprovação da pretensão resistida afirmada pelo magistrado, entendo que a manutenção da sentença tal como proferida configura violação ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, isso porque a resistência da pretensão ocorrerá com o oferecimento da contestação, além do que, na hipótese, não há exigência expressa de prévio requerimento administrativo, logo descabida a extinção do feito, até mesmo em homenagem ao princípio da primazia do mérito.
III.
Sentença anulada.
Retorno dos autos ao 1º grau para regular processamento da demanda.
IV.
Apelação conhecida e provida. (TJMA – ApCiv: 0801111-27.2021.8.10.0056, QUINTA CÂMARA CÍVEL, Rel.: Des.
RAIMUNDO JOSE BARROS DE SOUSA, Sessão Virtual de 14 a 21 de março de 2022).
EMENTA APELAÇÃO CÍVEL.
RECURSO DESPROVIDO.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL.
EXTINÇÃO DO FEITO POR AUSÊNCIA DE JUNTADA DE COMPROVANTE DE CADASTRO DA RECLAMAÇÃO ADMINISTRATIVA POR MEIO DE CANAIS DE CONCILIAÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE.
VIOLAÇÃO À GARANTIA DE ACESSO À JUSTIÇA.
ART. 5º, INC.
XXXV, DA CF E ART. 3º DO CPC/15.
RECURSO PROVIDO.
I - Relativamente a ações que questionam a existência de contratos de empréstimos, como a presente, inexiste qualquer norma processual que preveja a imperatividade de tentativa de conciliação administrativa prévia, sob pena de reconhecimento de falta de interesse processual, como reconhecido na sentença recorrida.
II - Mesmo havendo uma nova diretriz de maior autonomia na resolução dos conflitos, não se pode obrigar a parte autora à uma tentativa de conciliação pelos meios extrajudiciais, sob pena de extinção da ação por ausência de interesse de agir.
III – Recurso provido. (TJMA – ApCiv: 0800582-26.2020.8.10.0029, SEXTA CÂMARA CÍVEL, Rel.: Des.
DOUGLAS AIRTON FERREIRA AMORIM, Sessão Virtual de 27 de maio a 3 de junho de 2021).
Por fim, ressalto que ocorrendo a extinção prematura do processo, antes da instrução da ação, é inaplicável o art. art. 1.013, § 3º, do CPC, visto que a causa não se encontra madura para julgamento, ante a necessidade de preservar os princípios contraditório e ampla defesa.
Ante o exposto, conheço e DOU PROVIMENTO ao apelo, a fim de anular a sentença vergastada e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem, para o regular prosseguimento do feito, tudo nos termos da fundamentação supra.
Publique-se.
Intime-se.
Cumpra-se.
São Luís/MA, data do sistema.
Desembargador DOUGLAS AIRTON FERREIRA AMORIM Relator -
12/04/2023 10:22
Enviado ao Diário da Justiça Eletrônico
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12/04/2023 08:34
Conhecido o recurso de LUIS GONCALVES SILVA - CPF: *78.***.*08-20 (APELANTE) e provido
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19/01/2023 14:03
Conclusos ao relator ou relator substituto
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19/01/2023 13:06
Juntada de parecer - falta de interesse (mp)
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12/01/2023 08:54
Expedição de Comunicação eletrônica.
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12/01/2023 08:27
Proferido despacho de mero expediente
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08/01/2023 16:13
Conclusos para despacho
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31/10/2022 14:21
Recebidos os autos
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31/10/2022 14:21
Conclusos para despacho
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31/10/2022 14:21
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
31/10/2022
Ultima Atualização
27/10/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
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