TJRN - 0801440-09.2023.8.20.5159
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Lourdes de Azevedo
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
21/03/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801440-09.2023.8.20.5159 Polo ativo TEREZINHA INACIA DA SILVA Advogado(s): HUGLISON DE PAIVA NUNES Polo passivo Banco do Brasil S/A Advogado(s): MARCOS DELLI RIBEIRO RODRIGUES Apelação Cível nº 0801440-09.2023.8.20.5159 Apelante: Terezinha Inácia da Silva Advogado: Huglison de Paiva Nunes (OAB/RN 18.323) Apelado: Banco do Brasil S.A.
Advogado: Marcos Délli Ribeiro Rodrigues (OAB/RN 5.553) Relatora: Desembargadora Maria de Lourdes Azevêdo EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
CONTRATO BANCÁRIO.
DESCONTOS INDEVIDOS RELATIVOS A TARIFAS DE SERVIÇOS.
EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
FRACIONAMENTO E PULVERIZAÇÃO DE AÇÕES DA MESMA PARTE E EM RELAÇÃO À MESMA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
PEDIDO E CAUSA DE PEDIR SEMELHANTES OU DECORRENTES DA MESMA RELAÇÃO JURÍDICA.
CONDUTA NÃO ADMISSÍVEL.
VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA TRANSPARÊNCIA, DA LEALDADE, DA BOA-FÉ PROCESSUAL, DA COOPERAÇÃO E DA ECONOMIA PROCESSUAL.
ARTIGOS 5º, 6º E 8º DO CPC.
NOTA TÉCNICA DO CIJ/TJRN.
PRECEDENTES DE VÁRIOS TRIBUNAIS.
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.
A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora, que integra o Acórdão.
R E L A T Ó R I O Apelação Cível interposta por Terezinha Inácia da Silva, em face da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Umarizal que, nos autos da Ação Declaratória de Nulidade Contratual c/c Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Materiais e Morais, ajuizada pela ora apelante em desfavor do Banco do Brasil S.A., julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, IV e VI, do Código de Processo Civil, em razão de ter sido verificada a existência de mais de um processo envolvendo as mesmas partes, com narrativas idênticas, os quais poderiam ter sido apresentados numa única demanda.
Em suas razões recursais (ID Num. 23002452), sustenta que as demandas apontadas, na sentença hostilizada, não possuem o mesmo pedido e causa de pedir, e estão embasadas em contratos diferentes, de modo que não há litispendência.
Requer, assim, o conhecimento e provimento do apelo, para que seja dado prosseguimento à pretensão inaugural.
Contrarrazões acostadas no ID Num. 23002460, pugnando pelo desprovimento do recurso. É o relatório.
V O T O Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
De início, observa-se que a sentença registrou que a parte autora, ora apelante, propôs outras demandas judiciais com base em narrativas quase idênticas (valores indevidamente descontados em sua conta bancária), bem como que “a autora poderia ter manejado apenas uma ação, sem que houvesse qualquer prejuízo para a defesa de seus interesses” e o processo foi extinto sem resolução do mérito (artigo 485, IV e VI, do CPC).
Com efeito, verifica-se que as ações apontadas no r. decisum discutem a cobrança de valores debitados em conta corrente da parte apelante, provenientes de empréstimos e/ou tarifas bancárias, e em todas as demandas, a parte autora postulou indenização por danos materiais e morais decorrentes de tais cobranças.
Ou seja, os processos envolvem as mesmas partes (ou pessoas jurídicas do mesmo conglomerado) e possuem a mesma causa de pedir e pedidos semelhantes, cuja única diferença é o fato de que os descontos se referem a nomenclaturas e possíveis contratos distintos, porém realizados na mesma conta (às vezes, o número do contrato é distinto porque se coloca o número da parcela).
Nesse passo, cinge-se o presente recurso em examinar a possibilidade de a parte autora diluir sua pretensão inicial – que poderia ser cumulada em uma única demanda - no maior número possível de ações, mediante o fracionamento da causa de pedir, utilizando-se do Poder Judiciário para conseguir vantagens indevidas ou várias indenizações decorrentes da mesma relação jurídica.
Esse método, assemelhado a um “modelo de negócio”, muitas vezes traz grandes benefícios à parte e a seus patronos porque aumenta suas chances de, ao menos em uma das ações, por exemplo, ocorrer revelia ou a instituição financeira demandada deixar de apresentar provas, em especial o contrato assinado, a refutar as alegações da parte autora, sobretudo nas relações de consumo que se tem em seu favor a inversão do ônus da prova.
O uso de tal prática tem se tornado comum: o ajuizamento de ações, de forma fracionada e pulverizada, que poderiam ser aglutinadas em um único processo.
Isso causa prejuízos ao Judiciário e contraria o princípio da lealdade processual, ante o uso da Justiça para obter vantagem indevida. É um artifício, portanto, que viola frontalmente os princípios da transparência, da lealdade, da boa-fé, da cooperação e da economia processual.
Sendo assim, a pulverização ou o fracionamento de demandas não pode ser admitida.
Se é possível solucionar o conflito em um único processo, não há razão a justificar o ingresso de várias ações com o nítido propósito de dificultar a defesa dos réus e obter a cumulação de indenizações, confiando, muitas vezes, que em algumas haverá deficiência de defesa ou até mesmo total ausência de contestação dos pedidos.
Sobre o tema, veja-se os artigos 4º, 5º, 6º e 8º do Código de Processo Civil: Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.
Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.
Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.
Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.
Desse modo, o exercício abusivo do direito de acesso à justiça pode e deve ser reprimido pelo Judiciário, e o ajuizamento em massa de litígios, de maneira indevida, prejudica o acesso de quem realmente necessita de intervenção judicial para solucionar alguma questão, eis que assoberba os tribunais, influindo na qualidade da prestação jurisdicional.
Por conseguinte, restando demonstrado que a presente demanda se caracteriza como artificial e predatória, correta a conclusão do magistrado de primeira instância, ao extinguir o feito sem resolução do mérito, especialmente pela dicção do artigo 485, inciso VI, do CPC (ausência de interesse processual).
De fato, a ação em exame apresenta forte carga de litigiosidade artificial e essa conclusão, também, encontra abrigo no artigo 375 do diploma processual civil, que impõe ao juiz aplicar as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece, e ninguém melhor do que ele para observar e combater tal fenômeno, o que fez com maestria o magistrado singular.
A sentença, portanto, deu fiel interpretação e correta aplicação à norma legal, fazendo uso adequado dos poderes e deveres conferidos ao julgador pelo artigo 139, III, do CPC: “Art. 139.
O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: I ( …) II ( …) III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias” (negrito acrescido).
Os Tribunais também reconhecem o poder-dever do juiz de reprimir demandas predatórias.
Eis alguns julgados recentes: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO - DEMANDA ARTIFICIAL E PREDATÓRIA - IRREGULARIDADE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - CABIMENTO.
Para evitar a litigiosidade artificial e práticas predatórias no âmbito do Poder Judiciário, o Magistrado possui o poder-dever de tomar medidas saneadoras para coibir o uso abusivo do acesso à Justiça.
A capacidade processual e a representação judicial das partes constituem pressupostos processuais de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.
Tendo o procurador dado ensejo à movimentação indevida do aparato judicial, pelo princípio da causalidade, cabível sua condenação ao pagamento das custas e despesas do processo”. (TJMG - Ap.
Civ. 1.0000.23.169309-4/001, Rel.
Des.
Estevão Lucchesi, 14ª CÂMARA CÍVEL, j. em 19/10/2023, pub. da súmula em 19/10/2023). “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA - NEGATIVAÇÃO INDEVIDA - NOTA TÉCNICA Nº 01/2022 EMITIDA PELO CIJMG - LITIGÂNCIA PREDATÓRIA - VICIO DE REPRESENTAÇÃO - AUSENCIA DE PODERES VÁLIDOS - PRESSUPOSTO DE VALIDADE INOCORRENTE - EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. - A nota técnica nº 01/2022 - emitida pelo CIJMG - aponta parâmetros para identificação de demandas predatórias e orienta boas práticas de gestão de processos judiciais para o enfrentamento (prevenção e combate) da litigância predatória. (TJMG - Ap.
Civ. 1.0000.23.091864-1/001, Relatora: Des.(a) Lílian Maciel, 20ª CÂMARA CÍVEL, j. em 18/10/2023, pub da súmula em 19/10/2023). “Para evitar a litigiosidade artificial e práticas predatórias no âmbito do Poder Judiciário, o Magistrado possui o poder-dever de tomar medidas saneadoras para coibir o uso abusivo do acesso à Justiça.
A capacidade processual e a representação judicial das partes constituem pressupostos processuais de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.
Tendo o procurador dado ensejo à movimentação indevida do aparato judicial, pelo princípio da causalidade, cabível sua condenação ao pagamento das custas e despesas do processo”. (TJMG - Ap.
Cív. 1.0000.22.107335-6/002, Rel.
Des.
Estevão Lucchesi, 14ª CÂMARA CÍVEL, J. em 05/10/2023, pub. da súmula em 06/10/2023).
Insta ressaltar que, há bem pouco tempo, falava-se em “indústria do dano moral”, ações a buscar indenização por dano moral, em que se denunciava a banalização daquele instituto.
Com as facilidades criadas pelo CNJ por meio “Juízo 100% digital”, que gerou como consequência o baixo custo financeiro para ajuizar cada demanda, para quem exerce a nobilitante função da advocacia, essa prática alcançou atualmente proporções geométricas mediante a confecção de petições padronizadas, elaboradas em mídias digitais, que narram fatos idênticos, muitas vezes sem sequer constar a qualificação do(a) autor(a).
Nesse contexto, o que antes era a “indústria do dano moral”, hoje trocou de roupagem e avançou para "demandismo judicial", "demandas predatórias", “litigiosidade artificial”, “demandas fabricadas”, "demandas frívolas”, “loteria judicial”, Sham Litigation (falso litígio) ou "fake lides".
No combate às demandas desse quilate, esta Corte foi pioneira quando o Núcleo de Cooperação Judiciária - NUCOOP, vinculado à Vice-Presidência, firmou o ATO DE COOPERAÇÃO JURISDICIONAL N° 01/2023, que estabelece protocolo de cooperação judicial para tratamento e combate das demandas predatórias, com criação de núcleo próprio para tratar as ações que tramitam nas unidades do 11°, 12° e 13° Juizados Especiais Cíveis de Natal, mediante análise minuciosa da inicial e dos documentos que a acompanham.
Vários Tribunais estão atentos a essa realidade e não mais relutam em agir e combater o uso do processo como “modelo de negócio”.
Em casos extremos, quando devidamente comprovado, condenam o advogado em litigância de má-fé.
E isso se dá diante do cenário visto em quase todo o território nacional e do mal que atormenta todas as esferas do Judiciário, que tem reagido, adotando medidas enérgicas na tentativa de barrar aqueles que buscam, no processo judicial, outros fins que não dirimir contendas legítimas e concretas.
Nesse sentido, recentes julgados do TJMT e do TJAL: “EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – IMPROCEDÊNCIA – ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA CONDENAÇÃO EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ, TANTO DA PARTE AUTORA QUANTO DO SEU ADVOGADO – DESCABIMENTO – CONTRATAÇÃO EVIDENCIADA PELA APRESENTAÇÃO DA CÓPIA DO CONTRATO, DA LIBERAÇÃO DO CRÉDITO PELO REQUERIDO E DA LEGALIDADE DE TODOS OS ENCARGOS CONTRATADOS – FATOS INCONTROVERSOS – ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS E AJUIZAMENTO DE TRÊS (3) AÇÕES EM NOME DO AUTOR – OBRIGAÇÕES/CONTRATOS QUE PODERIAM SER DISCUTIDAS EM UNICAMENTE UMA AÇÃO – ABUSO DO DIREITO DE DEMANDAR – CONDUTA TEMERÁRIA – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ CONFIGURADA –– CONDENAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO. (...) Deve ser mantida a condenação da parte autora e de seu patrono às penas de litigância de má-fé, porquanto além de deduzir pretensão contra questão devidamente contratada, procedeu a alteração da verdade dos fatos e utilizou do processo para conseguir objetivo ilegal, por flagrante abuso do direito de demandar, visto que distribuiu na Comarca de Juara - MT, nada menos do que três (3) ações distintas em nome do autor para demandar contra três instituições financeiras, quando na realidade todas as obrigações/contratos poderiam ser discutidos unicamente em uma ação.
Logo, a conclusão possível é que o propósito único para o ajuizamento de tantas demandas dessa natureza, caracteriza verdadeiro “demandismo” ou a denominada “demanda predatória”, que se traduz na mera busca pela condenação das instituições financeiras nas verbas de sucumbência, abarrotando o Poder Judiciário com ações repetidas/fragmentadas e idênticas, circunstância que evidencia a má-fé processual e que deve ser rechaçada pelo julgador”. (N.U 1002205-16.2021.8.11.0018, _ TJMT - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, 2ª Câmara de Direito Privado, Julg. em 05/07/2023, DJE 12/07/2023). “APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO.
INDEFERIMENTO DA INICIAL POR INÉPCIA.
AJUIZAMENTO DE SENTENTA DE AÇÕES COM A MESMA CAUSA DE PEDIR, ALTERANDO, TÃO SOMENTE, A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ.
MEDIDA QUE EXTRAPOLA, EXCEPCIONALMENTE, O DIREITO FUNDAMENTAL AO ACESSO À JUSTIÇA.
AÇÃO QUE SE ASSEMELHA À SHAM LITIGATION (FALSO LITÍGIO).
O EXERCÍCIO DESENFREADO, REPETITIVO E DESPROVIDO DE FUNDAMENTAÇÃO SÉRIA E IDÔNEA PODE, AINDA QUE EM CARÁTER EXCEPCIONAL, CONFIGURAR ABUSO DO DIREITO DE AÇÃO.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO NÃO VERIFICADA.
CONDENAÇÃO DO ADVOGADO AO ADIMPLEMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS.
POSSIBILIDADE.
APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE.
PATRONO DA PARTE AUTORA QUE DEU AZO À MOVIMENTAÇÃO DESENFREADA E INDEVIDA DO PODER JUDICIÁRIO, EM NÍTIDO ABUSO DO DIREITO DE DEMANDAR.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO”. (Ap.
Civ. n. 0700130-60.2021.8.02.0040).
Cita o voto do relator a Nota Técnica do CIJ/TJRN, conforme trecho abaixo transcrito: “Tais demandas em massa, inclusive, vem sendo observadas em outros Tribunais, como no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, onde o Centro de Inteligência dos Juizados Especiais do Rio Grande do Norte afirmou que advogados usam os processos de pequenas causas para "captação de clientela em massa" e enriquecimento ilícito.
Nas palavras do magistrado responsável pelo estudo, "a demanda agressora se caracteriza pelo ajuizamento de causas fabricadas em lotes imensos de processos, geralmente trazidas por poucos escritórios de advocacia que praticam captação de clientela em massa e dizem respeito a uma tese jurídica 'fabricada' com o objetivo de enriquecer ilicitamente partes e advogados, independentemente da plausibilidade daquele pedido" (Nota Técnica nº 01/2020.
Relator: Juiz Paulo Luciano Maia Marques.
TJRN.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/justica-rn-advogados-usam-acoes.Pdf.) (...) "O que rechaço, deste modo, é o exercício desenfreado, repetitivo, com peças e fundamentos genéricos, com a interposição de processos em lotes, que, a meu sentir, demonstram ato ilícito de abuso do direito de ação. É importante salientar que a figura do abuso de direito é mais conhecida e estudada no Brasil sob a perspectiva do direito material e, sobretudo, no âmbito do direito privado.
No entanto, embora não seja da tradição do direito processual civil brasileiro, é admissível o reconhecimento da existência do ato ilícito de abuso processual, tais como o abuso do direito fundamental de ação ou de defesa, não apenas em hipóteses previamente tipificadas na legislação, mas também quando configurada a má utilização dos direitos fundamentais processuais.
Assim, conforme entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça, o ajuizamento de sucessivas ações judiciais, desprovidas de fundamentação idônea e intentadas com propósito doloso, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa, o denominado assédio processual. (STJ. 3ª Turma.
REsp 1.817.845-MS, Rel.
Min.
Paulo de Tarso Sanseverino, Rel.
Acd.
Min.
Nancy Andrighi, julgado em 10/10/2019).
Saliento, por fim, que não merecem retoques a condenação do próprio advogado ao adimplemento das custas processuais.
Conforme esclarecido na sentença, deve ser aplicado o princípio da causalidade, extraído a partir do art. 85 do CPC, ou seja: arca com as custas e com os honorários advocatícios a parte que deu causa, indevidamente, à demanda.
No caso vertente, quem deu azo à movimentação indevida de todo o aparato do Poder Judiciário estatal foi o próprio patrono da parte autora, o qual, desde a petição inicial, não se preocupou em cumprir seu dever legal de advogado, em nítido abuso do direito do acesso à justiça”.
Tem-se, ainda, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que: “Entrar na Justiça com sucessivas ações desprovidas de fundamentação idônea, intentadas com propósito doloso e abusivo, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa e levar ao reconhecimento do assédio processual” (Entendimento adotado pela 3ª Turma, no REsp 1.817.845).
Oportuno destacar que a litigância predatória é, também, uma preocupação do Conselho Nacional de Justiça, cuja Meta 5 aplica-se somente às Corregedorias dos Tribunais de Justiça, que expediu quinze Diretrizes Estratégicas (DE) para 2023, dentre elas a DIRETRIZ ESTRATÉGICA 7, que visa a: “Regulamentar e promover práticas e protocolos para o combate à litigância predatória, preferencialmente com a criação de meios eletrônicos para o monitoramento de processos, bem como transmitir as respectivas informações à Corregedoria Nacional, com vistas à alimentação de um painel único, que deverá ser criado com essa finalidade”.
Há, ainda, no site do CNJ a “Rede de Informações sobre a Litigância Predatória”, que disponibiliza Banco de Decisões e Notas Técnicas.
O CNJ publicou a Portaria nº 389 de 04/11/2022, que institui Grupo de Trabalho com o objetivo de apresentar propostas para o enfrentamento da litigância predatória associativa. É indubitável, portanto, que as demandas predatórias causam o aumento exacerbado do número de processos nas unidades judiciais e, em consequência, um tempo maior de tramitação; o esgotamento dos recursos dos Tribunais (humanos e materiais, muitas vezes já insuficientes); impede o cidadão que tem uma demanda concreta e legítima de receber a prestação jurisdicional em tempo razoável.
Do ponto de vista processual, o princípio constitucional do acesso à Justiça e da inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal) deve ser mitigado, pois o juiz de origem, nesse caso, agiu nos limites da lei e de acordo com o ordenamento jurídico, de modo a afastar a proliferação de demandas deste quilate.
Feitos tais registros, conclui-se que a sentença coaduna-se com a Recomendação nº 127/2022, com as metas e diretrizes do Conselho Nacional de Justiça e com a Nota Técnica nº 01/2020 do Centro de Inteligência dos Juizados Especiais do RN – CIJESP/TJRN, a implicar a atitude da parte autora em violação aos princípios norteadores do processo civil, conforme demonstrado, razão pela qual o entendimento adotado no r. decisum deve ser mantido.
Ante o exposto, voto por desprover o apelo.
Natal, data registrada no sistema.
Desembargadora Maria de Lourdes Azevêdo Relatora Natal/RN, 4 de Março de 2024. -
22/01/2024 17:01
Recebidos os autos
-
22/01/2024 17:01
Conclusos para despacho
-
22/01/2024 17:01
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
22/01/2024
Ultima Atualização
11/03/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Despacho • Arquivo
Acórdão • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Sentença • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 0801941-88.2022.8.20.5161
Helena Rodrigues da Silva
Municipio de Barauna
Advogado: Liecio de Morais Nogueira
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 23/06/2025 12:31
Processo nº 0807039-15.2023.8.20.5001
Condominio Residencial Solar Portal do P...
Joao Maria dos Santos
Advogado: Roberto Fernando de Amorim Junior
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 12/02/2023 22:42
Processo nº 0817504-49.2024.8.20.5001
Banco Bradesco S/A.
Roberto Figueiredo de Araujo
Advogado: Rosany Araujo Parente
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 14/03/2024 15:08
Processo nº 0808594-23.2022.8.20.5124
Fernanda Alves Pinheiro
Isis Passos de Matias Nunes Fontenele
Advogado: Maria Michele Craciun Brutten
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 11/05/2022 23:37
Processo nº 0842008-56.2023.8.20.5001
Fabio Henrique de Oliveira Lima
Oi Movel S.A.
Advogado: Thiago de Souza Barreto
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 30/07/2023 21:27