TJRN - 0805573-34.2024.8.20.5103
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Cornelio Alves
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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24/04/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0805573-34.2024.8.20.5103 Polo ativo EUCLECIO ILARIO DA SILVA Advogado(s): FLAVIA MAIA FERNANDES Polo passivo BANCO BRADESCO S/A Advogado(s): CARLOS AUGUSTO MONTEIRO NASCIMENTO EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CÍVEL.
APELAÇÃO.
NULIDADE DE COBRANÇA DE TARIFA BANCÁRIA.
AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO.
REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO NA FORMA DO ART. 42 DO CDC.
DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.
PROVIMENTO PARCIAL.
I.
CASO EM EXAME: Apelação Cível interposta pelo Banco Bradesco S/A em face de sentença que julgou procedente o pedido de declaração de nulidade de cobrança de tarifa bancária e condenou a instituição financeira à repetição do indébito e ao pagamento de indenização por danos morais.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO: As questões em discussão consistem em: (i) verificar a ocorrência de prescrição; (ii) analisar a legalidade da cobrança de tarifa bancária não contratada; (iii) determinar a forma de restituição dos valores cobrados indevidamente; e (iv) verificar a configuração de dano moral indenizável.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 1.
Rejeita-se a prejudicial de prescrição, pois, em se tratando de relação de trato sucessivo, o prazo prescricional renova-se a cada desconto, prescrevendo apenas as parcelas anteriores a cinco anos do ajuizamento da ação. 2.
A relação entre as partes é de consumo, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor. 3.
A responsabilidade da instituição financeira é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC e da Súmula 479 do STJ. 4.
A cobrança de tarifas bancárias exige previsão contratual ou prévia autorização do cliente, conforme Resolução nº 3.919/2010 do BACEN. 5.
A mera utilização de serviços além dos essenciais não implica anuência tácita do consumidor. 6.
O ônus de comprovar a contratação do serviço é da instituição financeira, nos termos do art. 373, II, do CPC e art. 6º, VIII, do CDC. 7.
A ausência de comprovação da contratação torna a cobrança ilegítima, devendo haver a repetição do indébito. 8.
A repetição do indébito em dobro é cabível quando a cobrança indevida contrariar a boa-fé objetiva, conforme tese fixada no EREsp n. 1.413.542/RS do STJ. 9.
Para as cobranças realizadas antes de 30/03/2021, a repetição em dobro pressupõe a comprovação de má-fé. 10.
No caso, a má-fé da instituição financeira é caracterizada pela imposição unilateral de cobrança de serviços não contratados, sem qualquer amparo legal ou contratual. 11.
O dano moral indenizável exige a comprovação de violação a direito da personalidade, não sendo presumido em casos de cobrança indevida. 12.
A situação dos autos não configura dano moral, tratando-se de mero dissabor cotidiano.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 13.
Dá-se provimento em parte ao apelo para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido de indenização por dano moral, mantendo-se a condenação à repetição do indébito.
Tese de Julgamento: 14.
A cobrança de tarifa bancária sem comprovação de contratação válida é ilegítima, autorizando a restituição em dobro em caso de má-fé. 15.
O mero aborrecimento decorrente de cobrança indevida, sem ofensa à honra, não configura dano moral.
Dispositivos Relevantes Citados: CDC, arts. 2º, 3º, 6º, III, 7º, 14, 39, III e 42; CPC, arts. 85, 98, 373; Resolução nº 3.919/2010 e nº 4.196/2013 do BACEN Jurisprudência Relevante Citada: STJ, AgInt no AREsp n. 1.728.230/MS; STJ, EREsp n. 1.413.542/RS; TJRN, Apelação Cível, 0801125-62.2024.8.20.5153 e 0800646-02.2024.8.20.5143; Súmulas nº 297 e 479 do STJ.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.
Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e dar provimento, em parte, ao apelo interposto pelo Banco Bradesco S/A, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.
RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta pelo Banco Bradesco S/A em face de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Currais Novos/RN que, analisando a controvérsia dos autos, proposta por Euclecio Ilario da Silva em desfavor da instituição financeira, julgou procedentes os pedidos iniciais pelos seguintes termos (Id. 29876715): “[…] De acordo com as razões acima explicitadas, JULGO PROCEDENTES os pedidos autorais, nos termos do art. 487, I, do CPC, para: a) DECLARAR a nulidade das cobranças relativas à tarifa bancária objeto da presente demanda (tarifa “Cesta B.Expresso4”); b) Condenar a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais em favor do autor no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais); c) Condenar a parte demandada ao ressarcimento em dobro dos valores indevidamente descontados no benefício do autor, a título de indenização por danos materiais na modalidade de repetição de indébito, no valor de RR$ 4.943,70 (quatro mil, novecentos e quarenta e três reais e setenta centavos), acrescidos das tarifas eventualmente cobradas no curso da presente ação, a serem apuradas em sede de liquidação/cumprimento de sentença.
Sobre a condenação em danos materiais, deverá incidir correção monetária a partir do efetivo prejuízo (súmula 43 do STJ) e juros de mora a contar da citação válida (art. 405 do CC) calculados pela taxa legal SELIC, deduzido o IPCA (art. 406, §1º, do Código Civil, com redação dada pela Lei n°14.905/24).
No tocante à condenação em danos morais deverá incidir correção monetária e juros de mora contados da sentença (súmula 362 do STJ e REsp 903258/RS) calculados pela taxa legal SELIC, deduzido o IPCA (art. 406, §1º, do Código Civil, com redação dada pela Lei n°14.905/24).
Considerando que a parte autora sucumbiu apenas no valor da indenização, o que não configura sucumbência recíproca, nos termos da súmula 326 do STJ, condeno a parte demandada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do §2º do art. 85 do Código de Processo Civil.
Alega em suas razões recursais: a) prejudicialmente, a fulminação da pretensão autoral pela prescrição; b) no mérito: b.1) a inexistência de ato ilícito que lhe possa ser imputado, advogando ter agido no exercício regular do direito, sendo lícita a cobrança da tarifa bancária; b.2) a impossibilidade de restituição em dobro dos valores descontados, não demonstrada a existência de má-fé na conduta, devendo-se ainda considerar ao caso a modulação dos efeitos nos termos do Recurso Especial nº 676.608 – RS (2015/0049776-9) do STJ e; b.3) a ausência de dano moral indenizável, com base na Súmula 39 da TUJ/TJRN, ou, subsidiariamente, que o valor fixado a título de danos morais é excessivo, devendo ser reduzido, especialmente quando o alegado evento danoso decorreu de conduta da própria parte, que tem o dever de mitigar seu prejuízo, isso porque, além de nunca ter se insurgido administrativamente contra os descontos, demorou anos para ajuizar a presente ação.
Requer, ao final, a reforma do julgado de origem nos termos de sua tese recursal (Id. 29876718).
Intimado, o autor apresentou suas contrarrazões ao Id. 29877423.
Desnecessidade de intervenção do Órgão Ministerial, nos termos do art. 127 da CF/88, dos arts. 176 e 178 do CPC, da Recomendação Conjunta nº 001/2021-PGJ/CGMP, das Recomendações nº 34/2016 e nº 57/2017, do Conselho Nacional do Ministério Público. É o relatório.
VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, intrínsecos e extrínsecos, conheço da Apelação Cível.
Antes de analisar o mérito, rejeito a prejudicial de prescrição levantada na tese recursal.
Sobre o tópico, o Superior Tribunal de Justiça entende que: “fundando-se o pedido na ausência de contratação de empréstimo com instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor” (AgInt no AREsp n. 1.728.230/MS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 8/3/2021, DJe de 15/3/2021.), tratando-se de prestação caracterizada como de trato sucessivo, renovando-se o prazo prescricional a cada novo desconto, considerando-se prescritas apenas as parcelas anteriores ao cinco anos anteriores ao ajuizamento da matéria controvertida.
Ao caso, considerando que o primeiro desconto tido por indevido foi realizado em dezembro de 2019, tendo a presente ação sido distribuída ainda em novembro de 2024, quando não ultrapassado o prazo fulminatório, estando todos os descontos dentro do quinquênio legal.
Passo ao mérito da controvérsia.
Pois bem, cinge-se o cerne da questão em aferir se a utilização de serviço bancário oneroso, disponibilizado sem prévio consentimento, constituiria hipótese de anuência tácita apta a legitimar as cobranças respectivas.
De início, ressalto que a relação estabelecida entre as partes é de consumo, uma vez que se enquadram respectivamente nos conceitos de destinatária final e fornecedora de produtos/serviços bancários, conforme os arts. 2º e 3º do CDC1 c/c Súmula 297 do STJ2, atraindo, portanto, a incidência das normas protetivas da Lei nº 8.078/90, sem prejuízo dos demais preceitos com ela compatíveis, à luz da teoria do diálogo das fontes (art. 7º, caput, CDC3).
Eventual responsabilidade deve, portanto, ser aferida sob seu viés objetivo, que pressupões apenas a existência de dano relacionado a falha na prestação do serviço, independentemente de dolo ou culpa, considerando o que determina o caput do art. 14, do CDC4.
A propósito, a teor da Súmula nº 479 do Superior Tribunal de Justiça, "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias".
Isso porque a teoria da responsabilidade objetiva vincula-se a ideia do risco, de modo que quem provoca determinada lesão a bem jurídico alheio é, de fato, responsável pelo ressarcimento decorrente, afastada somente quando a situação constituir hipótese de excludente prevista no § 3º, do artigo citado5.
Sobre a disponibilização de serviços e a onerosidade tarifária, a Resolução nº 3.919/2010 do Banco Central do Brasil – BACEN, exige a previsão contratual ou prévia autorização/solicitação do cliente para que haja a cobrança de qualquer tarifa pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras, em harmonia com os preceitos consumeristas: Art. 1º A cobrança de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução, deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário. [...] Art. 8º A contratação de pacotes de serviços deve ser realizada mediante contrato específico.
No mesmo sentido, a Resolução n. 4.196/2013, também editada pela autarquia: “Parágrafo único.
A opção pela utilização de serviços e tarifas individualizados ou por pacotes oferecidos pela instituição deve constar, de forma destacada, do contrato de abertura de conta de depósitos." Logo, como corolário ao princípio da informação, é imprescindível o prévio esclarecimento pela instituição financeira quanto a natureza e condições relacionadas do que se está contratando, de forma detalhada e compreensível, destacada em avença, a onerosidade tarifária pela disponibilização de serviços bancários.
Não é razoável inferir que o consumidor, parte vulnerável na relação, possa pressupor quais serviços são ou não onerosos e em que quantidades, sem qualquer informação nesse sentido, especialmente pela sutilidade das diferenças entre os serviços tidos por essenciais (gratuitos)6 e os onerosos, normalmente apenas quanto a quantidade de serviços disponíveis.
Assim, a mera utilização de serviços além daqueles ditos por não tarifados não implica em anuência tácita, principalmente quanto o(a) consumidor(a) – pessoa sem o conhecimento específico (presunção ex lege) –, informa que o único propósito contratual era restrito a disponibilização de conta bancária destinada ao recebimento de benefício previdenciário, o que não foi infirmado pelo banco.
Sob esse viés protetivo, o art. 6, inciso III, da Lei 8.078/90 aloca como direito básico do consumidor o acesso à “informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”.
Preceitua ainda o art. 46 do mesmo Diploma Consumerista que “os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance”.
Ao caso aqui tratado, tendo por incontroversa a imputação inicial quanto aos descontos tarifários e, negada a existência de qualquer consentimento nesse sentido, caberia à instituição financeira, a quem lhe foi atribuído o ônus probatório, a demonstração de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral, dos termos do art. 373, inciso II do CPC e art. 6º, VIII, da Lei nº 8.078/90, comprovando-se a adesão (contratual) expressa à modalidade de abertura de conta-corrente, presumidamente onerosa, ou, a opção quanto à adesão específica aos serviços além daqueles tidos por essenciais na conta de benefício.
Contudo, deixou o Banco de colacionar o respectivo instrumento contratual e, ao negligenciar o ônus probatório a ele imputado, incorreu em má prestação do serviço, caracterizada pela não observância das cautelas essenciais à celebração/perfectibilização do negócio jurídico subjacente, ausente a respectiva manifestação volitiva da parte contratante, violando ainda os preceitos da boa-fé objetiva (art. 422 do Código Civil7) e seus consectários axiológicos, com destaque para os deveres de informação e transparência.
Inclusive, a disponibilização de serviço sem prévia adesão constitui prática considerada abusiva vedada pelo CDC no art. 39, III, “enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço”.
Pontuo que, comprovado o vício de informação, o fato de existir na conta da parte eventual movimentação financeira que exceda os limites disponibilizados a título de serviços essenciais, por si só, não altera a natureza da conta bancária aberta para recebimento de benefício da Previdência Social.
Aliás, ainda que evidenciada sua respectiva utilização, a conduta se insere no permissivo legal tratado no art. 39, parágrafo único do CDC8, sendo descabido associar tal circunstância à ocorrência de surrectio, que não se confunde com permissão ou convalidação de atos ilícitos.
A aplicação do referido instituto em desfavor do consumidor deve ocorrer com extrema cautela, afinal, a presunção de vulnerabilidade, dentre elas a jurídica, constitui pilar fundamental corolário ao próprio princípio da igualdade material e da boa fé em sua acepção subjetiva, que busca equilibrar as relações entre fornecedor e consumidor, garantindo a proteção da parte mais frágil. É dizer, dada a vulnerabilidade do consumidor, presume-se a ausência de conhecimento pleno de seus direitos, especialmente em casos técnico-jurídicos que pressupõem domínio específico quanto às consequências relacionadas à assunção de obrigações contratuais, cláusulas abusivas ou outras práticas negociais, no mínimo, obscuras, de modo que, utilização desse instrumento agravaria a situação de injustiça, atribuindo ao consumidor responsabilidades ou ônus que não teria condições de antever ou contestar, não sendo possível a ele ser imputada conduta contrária à boa-fé.
Assim, pressupor que o consumidor tinha ou deveria ter conhecimento quanto à ilicitude das cobranças e que, ainda assim, teria optado deliberadamente com os pagamentos, inverte a própria essência protetiva do CDC, permitindo que o fornecedor se beneficie da inércia ou desconhecimento do consumidor para estabelecer direitos que vão de encontro aos princípios fundamentais do Direito do Consumidor, chancelando comportamento sem qualquer respaldo contratual ou legal.
Ressalto que até seria possível, em abstrato, cogitar-se a aplicação da referida teoria, tipicamente civilista, dentro de uma relação de consumo, desde que o fornecedor demonstrasse que, no caso concreto, o consumidor detinha o conhecimento do caráter e da natureza da cobrança, afastando-se sua vulnerabilidade em específico.
Portanto, à luz do que preconiza o Banco Central e tendo por fundamento os princípios da transparência e informação, além da boa-fé subjetiva e objetiva, não há como chancelar os descontos à espécie.
A propósito, colaciono precedentes desta Câmara Cível: EMENTA: DIREITO CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO ORDINÁRIA.
SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
COBRANÇA DE TARIFA BANCÁRIA, QUE A PARTE CONSUMIDORA ADUZ NÃO TER FIRMADO.
AUSÊNCIA DE JUNTADA DO CONTRATO. ÔNUS PERTENCENTE AO DEMANDADO, NA FORMA DO ART. 373, II, DO CPC.
CONTRATAÇÃO ILEGAL.
COBRANÇA INDEVIDA EVIDENCIADA NOS AUTOS.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO CABÍVEL.
ART. 42 DO CDC.
VIOLAÇÃO A BOA-FÉ OBJETIVA.
PRECEDENTE DO STJ NO EARESP/RS 676608.
DANO MORAL INEXISTENTE.
LESÃO EXTRAPATRIMONIAL QUE NÃO É PRESUMIDA.
NECESSIDADE DE PROVA DA OFENSA A DIREITO DA PERSONALIDADE.
INOCORRÊNCIA.
JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DESTA CORTE.
REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE.
CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DO APELO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0801125-62.2024.8.20.5153, Des.
Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 08/02/2025, PUBLICADO em 10/02/2025); Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS.
COBRANÇA DE TARIFA BANCÁRIA SEM COMPROVAÇÃO DE CONTRATAÇÃO.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO.
DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.
REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS.
APELO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
APELO DA PARTE RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO.
I.
Caso em exame 1.
Apelações interpostas contra sentença que reconheceu a invalidade da cobrança de tarifa bancária denominada “SERVICO CARTAO PROTEGIDO,” determinando a repetição do indébito em forma simples, julgando improcedente o pedido de danos morais e fixando a sucumbência recíproca. 2.
Banco apelante defende a validade da cobrança e a improcedência da restituição.
Parte autora busca a restituição em dobro e condenação por danos morais.II.
Questão em discussão 3.
As questões a serem analisadas consistem em saber:(i) se há comprovação da contratação que justifique a cobrança da tarifa bancária;(ii) se há má-fé que autorize a restituição em dobro;(iii) se estão presentes elementos para a configuração de dano moral.III.
Razões de decidir 4.
Parte requerida não comprovou a contratação regular do serviço bancário, sendo ilegítima a cobrança. 5.
Caracterizada a má-fé pela ausência de contrato válido, sendo cabível a restituição em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 6.
Não configurado dano moral, diante do valor ínfimo dos descontos e da inexistência de ofensa à honra subjetiva da parte autora, caracterizando mero aborrecimento. 7.
Redistribuição dos ônus sucumbenciais, com condenação integral da parte ré em razão da sucumbência mínima da parte autora.
IV.
Dispositivo e tese 8.
Apelação da parte autora conhecida e parcialmente provida.
Apelação do banco réu conhecida e desprovida.
Tese de julgamento: “1.
A cobrança de tarifa bancária sem comprovação de contratação válida é ilegítima, autorizando a restituição em dobro em caso de má-fé.2.
O mero aborrecimento decorrente de cobrança indevida, sem ofensa à honra, não configura dano moral.” Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 14 e art. 42, parágrafo único; CPC, art. 86, parágrafo único. (APELAÇÃO CÍVEL, 0800646-02.2024.8.20.5143, Des.
Expedito Ferreira, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 08/02/2025, PUBLICADO em 10/02/2025) Portanto, evidenciada a antijuridicidade da conduta vertida pela instituição, patente o dever de reparação material pelos descontos realizados indevidamente em conta.
Convém assinalar que o parágrafo único do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor, prevê a possibilidade de o consumidor receber, em dobro, as quantias indevidamente cobradas: “O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".
Sobre o tópico, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça fixou a tese de que "a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo" (EREsp n. 1.413.542/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021).
Assim, na linha do que restou assentado pela Corte Superior, a repetição do indébito em dobro dispensa a comprovação do elemento volitivo (má-fé), sendo suficiente que a conduta analisada contrarie a boa-fé objetiva.
Contudo, de modo a preservar a segurança jurídica, a tese fixada no citado precedente teve seus efeitos modulados, aplicando-se suas conclusões tão somente as cobranças realizadas após a data da publicação do acórdão, que se deu em 30/03/2021.
Confira-se: “Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado – quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público – se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão [...]”.
Portanto, forçoso concluir que, para as cobranças anteriores ao citado marco temporal, a má-fé constitui elemento indispensável à aplicação dos efeitos reparatórios na forma do art. 42 do CDC.
Ao caso em específico, não há como dissociar a existência de má-fé na conduta adotada pela instituição financeira que, mesmo ciente da necessidade de consentimento como elemento de validade, impôs, unilateralmente, sua vontade negocial, subtraindo compulsoriamente valores relacionados a serviços bancários onerosos não solicitados ou anuídos expressamente, em prejuízo do consumidor.
Ressalto ainda a inexistência de engano justificável, principalmente por não haver prova sobre a celebração do negócio jurídico impugnado, razão pela qual, a repetição do indébito deverá ser realizada em dobro, nos termos do julgado de origem.
No que toca ao dano moral, evoluindo o entendimento desta Relatoria sobre o tema em específico, seguindo orientação jurisprudencial do STJ, pontuo que, a responsabilidade civil apta a justificar eventual compensação indenizatória só se materializa com a existência de dano, capaz de repercutir violação a direito da personalidade. É dizer, a condenação pecuniária decorrente de lesão extrapatrimonial demanda a comprovação da repercussão do dano na esfera dos direitos da personalidade, isso porque o dano moral, nesses casos, não é in re ipsa (presumido).
A subtração patrimonial relacionada a imposição de encargo por serviço não consentido, por si só, não conduz a violação de direito personalíssimo.
Há que se avaliar as circunstâncias que orbitam o caso, muito embora se admita que a referida conduta acarrete dissabores ao consumidor.
Sobre o tema, é entendimento do STJ que: “(…) para a reparação por danos morais, faz-se necessária a demonstração da ofensa a algum dos atributos inerentes à personalidade, o que não ficou demonstrado nos autos.
Apesar do descontentamento gerado pela falha na prestação de serviços, inexiste prova de ofensa a atributo da personalidade da parte autora ou lesões a seu patrimônio moral, ou de que a situação tenha repercutido negativamente em sua imagem.
Em que pese a alegação de prejuízo, a parte autora não demonstrou sua efetiva ocorrência, pois tais cobranças, por si, não ensejaram sua inadimplência ou inscrição irregular de seu nome em cadastro de proteção de crédito”. (STJ - AREsp: 2544150, Relator: MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Publicação: 01/03/2024).
Ainda: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITOS CUMULADA COM DANOS MORAIS.
DESCONTO INDEVIDO.
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
DANO MORAL INEXISTENTE.
MERO ABORRECIMENTO.
SÚMULA 83 DO STJ.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1.
A caracterização do dano moral exige a repercussão na esfera dos direitos da personalidade. 2.
Nessa perspectiva, a fraude bancária, ensejadora da contratação de empréstimo consignado, por si só, não é suficiente para configurar o dano moral, havendo necessidade de estar aliada a circunstâncias agravantes. 3.
Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 2.157.547/SC, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 12/12/2022, DJe de 14/12/2022.) Assim, a caracterização do dano moral não dispensa a análise das particularidades de cada caso concreto, a fim de verificar se o fato extrapolou o mero aborrecimento, atingindo de forma significativa o espectro moral do correntista.
No caso concreto, embora antijurídica e reprovável a conduta do apelado, não restaram demonstrados os danos morais alegados pela parte autora.
A situação aqui retratada não expôs a parte a dor, vexame, sofrimento ou constrangimento aptos a ensejar respectiva compensação extrapatrimonial, tratando-se, o desconto objeto de irresignação, de mero dissabor cotidiano, incapaz de comprometer sua subsistência, tratando-se de descontos mensais, presumidamente (ausente demonstração em sentido contrário), ínfimos, entre 2,1% e 4,6% do valor do benefício previdenciário recebido, em que pese sua recorrência.
Sendo assim, o desconto indevido, por si só, sem demonstração de maiores consequências, restrição ou comprometimento de crédito, abuso na cobrança (suficiente a extrapolar o grau de tolerância suportável à situação), prejuízo de sua subsistência ou excessiva perda de tempo útil ou produtivo na tentativa de resolução administrativa da situação, é incapaz de gerar sofrimento psicológico a ponto de configurar o dano moral, cingindo-se a situação aos inconvenientes inerentes à vida em sociedade.
Ante o exposto, dou provimento, em parte, a Apelação interposta pelo Banco Bradesco S/A, reformando-se o comando decisório de primeiro grau para julgar improcedente o pedido de indenização por dano moral, mantendo-se o julgado nos demais termos.
Com fundamento no art. 85, §2º do CPC, mantido o percentual arbitrado pelo Juízo de origem, redistribuo o ônus de sucumbência pela seguinte proporção: 70% a ser arcado pelo Banco Bradesco S.A. e 30% pelo autor (suspensa sua exigibilidade nos termos do §3º do art. 98 do Código Processual). É como voto.
Natal, data do registro eletrônico.
Desembargador Cornélio Alves Relator 1 Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único.
Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. 2 “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.” 3 Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade. 4Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. 5 § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 6 https://banco.bradesco/assets/classic/pdf/nova-vigencia/tarifas/TARIFA-SERVICOS-ESSENCIAIS.pdf 7 Art. 422.
Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. 8 Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] Parágrafo único.
Os serviços prestados e os produtos remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis, inexistindo obrigação de pagamento.
Natal/RN, 7 de Abril de 2025. -
26/03/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Primeira Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0805573-34.2024.8.20.5103, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 07-04-2025 às 08:00, a ser realizada no Primeira Câmara Cível (NÃO VIDEOCONFERÊNCIA).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 25 de março de 2025. -
13/03/2025 13:40
Recebidos os autos
-
13/03/2025 13:39
Conclusos para despacho
-
13/03/2025 13:39
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
13/03/2025
Ultima Atualização
14/04/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Acórdão • Arquivo
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