TJRN - 0913144-50.2022.8.20.5001
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Amaury Moura Sobrinho
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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14/09/2025 18:36
Recebidos os autos
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14/09/2025 18:36
Conclusos para despacho
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14/09/2025 18:36
Distribuído por sorteio
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05/08/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 11ª Vara Cível da Comarca de Natal Rua Doutor Lauro Pinto, 315, Candelária, NATAL - RN - CEP: 59064-250 PROCESSO Nº 0913144-50.2022.8.20.5001 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: ISABEL CRISTINA BEZERRA GOMES RÉU: UP BRASIL ADMINISTRACAO E SERVICOS LTDA.
SENTENÇA Vistos etc.
Isabel Cristina Bezerra Gomes, já qualificada nos autos, via advogado, ingressou com “AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA E REVISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS” em desfavor da Up Brasil Administração e Serviços Ltda, também qualificada, alegando, em síntese, que: a) por volta do mês de novembro de 2009, celebrou com a ré, por contato telefônico, contrato de empréstimo consignado, ocasião em que lhe foi informado o valor do crédito disponível, a quantidade de prestações a serem adimplidas e o valor das parcelas, sendo omitidas pela demandada informações relativas às taxas de juros mensal e anual aplicadas; b) após um período de descontos, renovou junto à requerida a operação de crédito contratada, renegociando o saldo devedor do pacto anterior, o que foi realizado também em conversa telefônica, porém novamente não foi informada sobre os juros aplicados ao contrato; c) autorizou de boa-fé o desconto das parcelas em sua folha de pagamento, já tendo pago 118 (cento e dezoito) prestações que, somadas, totalizam o montante de R$ 10.597,17 (dez mil, quinhentos e noventa e sete reais e dezessete centavos); d) em momento nenhum foi expressamente informada sobre as taxas de juros mensal e anual praticadas pela ré nos contratos celebrados, de modo que eventual capitalização de juros aplicada nas operações é manifestamente indevida; e) não há cláusula expressa e não é possível saber se o duodécuplo da taxa mensal é inferior ao valor da taxa anual, uma vez que não foram informadas; f) no caso, os juros remuneratórios devem ser fixados de acordo com o percentual da taxa média de mercado, limitados à taxa contratada, se mais vantajosa ao consumidor, dado que não houve pactuação expressa; g) não há falar em aplicação ao caso da Tabela Price e do Sistema de Amortização Constante (SAC); h) sendo determinado o recálculo do contrato, haverá uma minoração do saldo devedor da época da renovação de cada contrato, que irá gerar uma "diferença no troco", a qual deverá ser devolvida à autora; e, i) a devolução dos valores pagos a maior deve ocorrer de forma dobrada.
Ao final, requereu: a) a concessão dos benefícios da justiça gratuita; b) a declaração de nulidade da aplicação de capitalização mensal de juros compostos em todas as operações financeiras contratadas entre as partes, em razão da inexistência de contrato e/ou cláusula expressa de pactuação, devendo ser realizado o recálculo com aplicação de juros simples; c) a revisão dos juros remuneratórios incidentes sobre as operações contratadas, de modo a aplicar a taxa média de mercado, limitados à taxa contratada, se mais vantajosa ao consumidor, uma vez que não houve pactuação expressa; d) o recálculo integral das prestações acordadas a juros simples, com a aplicação do Método Gauss ou, alternativamente, do Sistema de Amortização Linear (SAL), com a consequente condenação da parte ré à devolução, em dobro, dos valores pagos a maior em decorrência do contrato; e) a condenação da parte demandada à restituição dos valores relativos à "diferença no troco" das operações contratadas entre as partes; f) fosse a parte demandada compelida a promover a readequação do valor das parcelas vincendas das operações contratadas aos termos do título judicial, com a determinação de que fossem pagas no mesmo prazo inicialmente contratado, sem compensação com as parcelas que ainda se encontrassem em aberto; e, g) a condenação da requerida à devolução, em dobro, do valor pago por eventuais serviços não contratados.
Anexou à inicial os documentos de ID nos 92051291, 92051294, 92051299, 92051301, 92051302 e 92051303.
Através do despacho de ID nº 92202486, este Juízo deferiu o pedido de justiça gratuita formulado pela autora.
Citada, a parte demandada ofereceu contestação (ID nº94456513), na qual impugnou a gratuidade judiciária pleiteada, arguiu preliminares de inépcia da petição inicial e falta de interesse de agir, bem como questões prejudiciais de mérito consistentes na decadência e na prescrição da pretensão autoral.
No mérito propriamente dito, aduziu, em suma, que: a) mostra-se necessário o sobrestamento do feito até o julgamento do Tema 929 do STJ; b) mesmo tendo a primeira contratação de empréstimo ocorrido há mais de 13 (treze) anos, a autora jamais questionou qualquer ilegalidade/abusividade ou reclamou dos juros impostos, pelo contrário; b) a cobrança de juros superiores a 12% por ano, por si só, não indica abusividade; c) a autora foi devidamente informada sobre todas as condições das operações de empréstimo contratadas, incluindo as taxas aplicáveis, o valor e quantidade das parcelas a serem descontadas diretamente na folha de pagamento, e isso está comprovado por meio dos áudios anexados à presente demanda; d) no áudio referente à contratação nº 957953, a preposta da ré, entre os minutos 4:45 e 5:20, informou à autora os valores e condições do parcelamento do empréstimo, incluindo o custo efetivo total mensal e anual, bem como a informação de que o valor objeto do empréstimo seria captado pela ré junto à uma instituição financeira parceira, por meio de cláusula mandato; e) além disso, a autora foi orientada a conferir os termos da contratação, enviados por SMS, de forma a certificar a sua anuência; f) inexiste ato ilícito ou má-fé da sua parte a ensejar a repetição, seja ela simples ou em dobro, requerida pela autora; g) é indevida a devolução da "diferença no troco"; e, h) o Método Gauss é inaplicável no cálculo dos valores objeto do contrato em debate.
Ao final, pleiteou o acolhimento do pedido de revogação da gratuidade judiciária, das preliminares arguidas e das prejudiciais de mérito suscitadas e, acaso superadas, pugnou pela total improcedência da pretensão autoral.
Aportou os documentos de IDs nos 94456515, 94456516, 94456518, 94456519, 94456521, 94456522, 94456523, 94456524 e 94456525.
A autora apresentou réplica à contestação, oportunidade na qual rebateu as argumentações trazidas pela ré e reiterou os termos e pedidos da inicial (ID nº 95884748).
Intimadas a informar acerca do interesse na produção de outras provas, a parte autora requereu a juntada dos áudios referentes às contratações firmadas (ID n.º 100064813), enquanto a parte ré pugnou pela realização de audiência de instrução (ID nº 97021153).
No despacho de ID nº 104876379, este Juízo determinou a intimação da parte autora para cumprir o requisito previsto no art. 330, §2º, do CPC, que exige a quantificação do valor incontroverso do débito em ações revisionais, sob pena de extinção do feito sem resolução do mérito.
Petição da parte autora na qual acostou planilha de cálculos e requereu a correção do valor da causa (ID n.º 105052978).
Intimada para complementar os termos da sua contestação (ID nº 106261480), a ré deixou transcorrer in albis o referido prazo (ID nº 113241070). É o que importa relatar.
Fundamenta-se e decide-se.
De início, impende anotar que a lide em apreço comporta julgamento antecipado, por força do disposto no art. 355, I, do CPC, tendo em mira que as provas acostadas aos autos são suficientes para o deslinde da demanda.
Frise-se que não se mostra necessária a realização de audiência de instrução e julgamento pugnada pela parte ré, dado que as cláusulas contratuais devem ser comprovadas por meio próprio, seja instrumento impresso, eletrônico ou áudios de gravações com as informações dos contratos.
Ora, se a parte demandada não impugnou a alegação de que o contrato foi firmado pelo telefone, a forma de comprovar a ciência da parte demandada seria via gravação, ônus que lhe incumbia, por serem elementos voltados a provar fato extintivo, modificativo e/ou impeditivo do direito da autora (art. 373, II do CPC).
Ademais, destaque-se que se tem como desnecessária a intimação da parte ré para apresentação dos áudios referentes às operações mencionadas pela parte autora, diligência requerida pelo demandante, haja vista que, a referida juntada era ônus que incumbia à ré, por serem elementos voltados a provar fato extintivo, modificativo e/ou impeditivo do direito da autora (art. 373, II do CPC).
I - Do pedido de sobrestamento do feito (Tema 929 do STJ) Em sede de contestação, a ré requereu o sobrestamento do feito sob a alegação de que "a discussão quanto às hipóteses de aplicação da repetição em dobro prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, é objeto de julgamento no Superior Tribunal de Justiça (STJ), submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema 929/STJ)".
Entretanto, não merece acolhimento o pleito da ré, haja vista que o ministro relator Paulo de Tarso Sanseverino, nos autos do processo ProAfR no RECURSO ESPECIAL Nº 1823218 - AC (2019/0187097-6) restringiu a ordem de suspensão.
Veja-se: "Restringe-se a ordem suspensão de processos determinada na primeira afetação com base no art. 1.037, inciso II, do CPC/2015, para que a suspensão incida somente após a interposição de recurso especial ou agravo em recurso especial, permanecendo-se os autos nos respectivos Tribunais, para posterior juízo de retratação/conformidade, após o julgamento do Tema 929/STJ." (STJ - ProAfR no REsp: 1823218 AC 2019/0187097-6, Relator.: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 22/04/2021, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 14/05/2021).
Logo, tendo em mira a restrição da ordem de suspensão para "somente após a interposição de recurso especial ou agravo em recurso especial", não há falar em sobrestamento do feito.
II - Da impugnação à gratuidade judiciária É cediço que o art. 99, §3º, do CPC consagra a presunção relativa de pobreza para a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural, ou seja, para fazer jus à concessão da gratuidade judiciária, basta a alegação de que é pobre na forma da lei, não se fazendo necessárias maiores dilações a respeito.
Nessa esteira, após o deferimento do benefício da justiça gratuita à pessoa natural, incumbe à parte adversa desconstituir a presunção juris tantum estabelecida pela legislação de regência, apresentando elementos probatórios que evidenciem que a parte impugnada possui condições financeiras de arcar com as despesas processuais, o que não ocorreu na hipótese.
Com efeito, ao impugnar o pedido de justiça gratuita, a parte requerida escorou-se na alegação de que a parte requerente obteve rendimento de R$ 2918,74 (dois mil novecentos e dezoito reais e setenta e quatro centavos), o que seria suficiente para arcar com as custas processuais.
Entretanto, a verificação de compatibilidade entre os vencimentos da demandante, juntados no ID nº 92051301, e a concessão da gratuidade judiciária já foi realizada por este Juízo no despacho de ID nº 92202486, não tendo a parte requerida logrado êxito em trazer novos elementos aptos a demonstrar a capacidade da parte demandante de arcar com as despesas do processo.
Portanto, não merece guarida a impugnação à justiça gratuita apresentada pela parte ré.
III – Da inépcia da exordial em razão do descumprimento das dispões do art. 330, §2º, do CPC Da deambulação dos autos, colhe-se que, uma vez intimada, a parte autora regularizou o pleito ao apresentar os valores incontroversos acompanhados das respectivas planilhas através do petitório e documentos de IDs nos 105052978 e 105054580.
Dessa forma, uma vez sanado o vício apontado, tem-se por prejudicada a preliminar em comento.
IV - Da preliminar de falta de interesse de agir A alegação de ausência de interesse processual sustentada pela parte demandada ao argumento de que a parte autora não havia anexado lastro probatório apto a comprovar suas alegações é matéria relativa ao mérito, razão pela qual será analisada nas linhas seguintes.
Sendo assim, afasta-se a preliminar em epígrafe.
V – Da questão prejudicial de mérito referente à prescrição e da decadência Sabe-se que o instituto da prescrição é necessário para que haja tranquilidade na ordem jurídica.
A prescrição é a perda do direito de ação quando este não é exercido no prazo fixado pela lei.
Da deambulação dos autos, observa-se que a alegação da parte ré acerca da prescrição da pretensão autoral amparou-se no prazo trienal previsto no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil.
Da leitura da peça inaugural, tem-se que a presente ação tem como objeto a revisão do contrato firmado entre as partes, com a declaração de inexistência de cláusulas tidas como abusivas.
Consoante entendimento pacificado no STJ, o prazo prescricional nas ações revisionais de contrato bancário é de 10 (dez) anos, nos termos do art. 205 do Código Civil, e tem início a partir da data da celebração do pacto.
Nesse sentido, importante colacionar os seguintes julgados do STJ: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO.
PRAZO PRESCRICIONAL.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ.
AGRAVO INTERNO PROVIDO.
RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1.
O prazo prescricional nas ações revisionais de contrato bancário em que se discute a legalidade das cláusulas pactuadas, a orientação desta Corte Superior é clara ao entender que “As ações revisionais de contrato bancário são fundadas em direito pessoal, motivo pelo qual o prazo prescricional, sob a égide do Código Civil de 1.916 era vintenário, e passou a ser decenal, a partir do Código Civil de 2.002” (REsp 1.326.445/PR, Rel.
Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 04/02/2014, Dje de 17/02/2014). 2.
No caso concreto, o período da avença iniciou-se em setembro de 1996, data a partir da qual se iniciou o prazo prescricional, que se encerrou em 11 de janeiro de 2013 (dez anos, a contar da vigência do novo código).
Os autores ajuizaram a ação em maio de 2010, portanto sua pretensão não está alcançada pela prescrição. 3.
Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada e, na extensão, dar provimento ao recurso especial, no sentido de determinar o retorno dos autos à eg.
Corte de origem a fim de que, afastada a prescrição, profira nova decisão, dando ao caso a solução que entender cabível (STJ.
Quarta Turma.
AgInt no REsp 1653189 / PR.
Relator: Ministro Lázaro Guimarães.
Julgado em 21/08/2018.
Dje 20/09/2018) (grifo proposital).
RECURSO ESPECIAL.
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.
AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO.
MÚTUO.
PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA.
PROPOSITURA DA DEMANDA SOB A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916.
ILEGITIMIDADE ATIVA DO FIADOR.
ACESSORIEDADE DO CONTRATO DE FIANÇA.
RELAÇÃO DE DIREITO MATERIAL DE NATUREZA DISTINTA DA QUE SE ESTABELECE NO CONTRATO PRINCIPAL. (…) 5.
A pretensão revisional de contrato bancário, diante da ausência de previsão legal específica de prazo distinto, prescreve em 10 (dez) anos (sob a égide do Código Civil vigente) ou 20 (vinte) anos (na vigência do revogado Código Civil de 1916), pois fundada em direito pessoal, sendo completamente descabido falar, em casos tais, na aplicação do prazo quinquenal a que se referia o art. 178, §10, do Código Civil revogado. 6.
Recurso especial parcialmente provido para, afastando a prescrição indevidamente reconhecida na origem, determinar o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau para que dê regular processamento ao pleito revisional/repetitório apenas no tocante ao contrato de fls. 210/218 (e-STJ) (STJ.
Terceira Turma.
REsp 926792 / SC.
Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
Julgado em: 14/04/2015.
Dje: 17/04/2015) (destacou-se).
No caso em mesa, em relação ao contrato originário (2009) descrito pela autora na exordial, é patente a incidência da prescrição decenal prevista no art. 205 do Código Civil, pois embora não se tenha apensado aos autos o instrumento contratual pactuado, da leitura da ficha financeira acostada ao caderno processual pela demandante (ID nº 92051301), é possível atestar a realização de descontos, sob a referida rubrica, ainda em dezembro de 2009, no valor de R$ 80,80 (oitenta reais e oitenta centavos), denotando que o mês de formalização foi, inequivocamente, novembro de 2009, exercício anterior àquele cujos descontos foram efetuados, conforme sustentado pela demandada em sua peça contestatória e pela própria parte autora em sua exordial.
Dessa forma, considerando que a celebração descrita pela autora ocorreu em novembro de 2009 e que a presente ação foi intentada apenas em novembro de 2022, conclui-se que transcorreram mais de 10 (dez) anos entre as datas, mostrando-se evidente, portanto, a ocorrência do fenômeno da prescrição.
De outra banda, tem-se que as operações efetuadas em junho de 2011 (operação nº 97806) e setembro de 2012 (operação nº 92677) também se mostram fulminadas pela prescrição, haja vista que entre as referidas datas e o ajuizamento do feito decorreu prazo superior a 10 anos.
Frise-se que, de acordo com a supracitada ficha financeira (ID n.º 92051301) anexada pela parte autora, tem-se como comprovadas a formalização dessas operações nas datas mencionadas.
Sobre a prescrição dos contratos originários, mesmo no caso de repactuação de dívidas, válido aportar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: DIREITO CIVIL.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE MÚTUO.
PRESCRIÇÃO.
TERMO INICIAL.
AGRAVO NÃO PROVIDO.
I.
Caso em exame 1.
Agravo interno interposto contra decisão que deu provimento ao recurso especial para determinar o retorno dos autos ao Tribunal de origem, a fim de que reaprecie a tese de prescrição conforme entendimento do STJ. 2.
A parte agravante sustenta que a decisão agravada divergiu da jurisprudência do STJ, alegando que, em casos de sucessão negocial com repactuação das dívidas, a prescrição deve ser contada a partir da assinatura do último contrato renovado.
II.
Questão em discussão 3.
A questão em discussão consiste em determinar o termo inicial do prazo prescricional nas ações de revisão de contrato de mútuo, especificamente se deve ser a data da assinatura do contrato original ou do último contrato renovado.
III.
Razões de decidir 4.
O entendimento consolidado do STJ é que o termo inicial do prazo prescricional, nas ações de revisão de contrato bancário, é a data da assinatura do contrato original. 5.
A renegociação ou confissão de dívida não altera o termo inicial da prescrição, conforme a Súmula n. 286 do STJ. 6.
A revisão dos contratos novados é viável, desde que não atingidos pela prescrição.
IV.
Dispositivo e tese 7.
Agravo interno não provido.
Tese de julgamento: "O termo inicial do prazo prescricional nas ações de revisão de contrato bancário é a data da assinatura do contrato original, não sendo alterado por renegociação ou confissão de dívida." Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.954.493/RS, Rel.
Min.
Marco Buzzi, DJe 17.06.2022; STJ, AgInt nos EDcl no REsp 2.018.743/RS, Rel.
Min.
Raul Araújo, DJe 14.09.2023. (AgInt no REsp n. 2.107.445/RS, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 4/11/2024, DJe de 7/11/2024.).
Quanto aos demais contratos e respectivas renovações, descritos pela demandada em sua peça contestatória (ID nº 94456513, pg. 3), percebe-se que não foram alcançados pelo fenômeno da prescrição, haja vista que não decorreu o prazo de 10 (dez) anos entre as suas respectivas datas de celebração e a data de ajuizamento do presente feito.
Sendo assim, acolhe-se a prejudicial de mérito suscitada pela parte ré apenas em relação às operações celebradas em novembro de 2009, junho de 2011 e setembro de 2012 (datas anteriores a novembro de 2012).
Por fim, não há falar em decadência, com fulcro no art. 179 do Código Civil, uma vez que não se trata de ação de anulação de negócio jurídico, mas sim de revisão de cláusulas de contrato bancário.
Sendo assim, passa-se à análise do mérito propriamente dito.
VI - Do Mérito VI.1 - Da relação de consumo Está caracterizada a relação de consumo quando, de um lado, tem-se o consumidor, que em consonância com o disposto no Código de Defesa do Consumidor - CDC, "é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final", e do outro o fornecedor, conceituado como "toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional e estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços".
Do garimpo dos autos, e albergando-se nos conceitos mencionados, nota-se que a lide em tela tem como esteio uma relação de consumo, na qual figura como consumidora a parte autora, e como fornecedora a parte ré.
Logo, é plenamente aplicável o Código Consumerista ao caso sub judice.
VI.2 - Da possibilidade de revisão contratual Sob o escudo do princípio do pacta sunt servanda, alegou a parte ré na peça defensiva, que a autora não pode buscar o Judiciário para alterar as cláusulas pactuadas.
Cumpre argumentar, todavia, que o entendimento ventilado há muito foi alijado do palco das decisões judiciais.
O mundo hodierno exige do Poder Judiciário um papel fiscalizador no que diz respeito ao combate a excessiva onerosidade imposta a uma das partes contratantes, buscando-se o desejado equilíbrio contratual.
As razões que justificavam o pacta sunt servanda estavam atreladas a uma outra realidade histórica.
Atualmente, a realidade difere daquela, por isso outros são os princípios que norteiam o direito contratual.
Desse modo, cabe ao Judiciário moderno intervir na relação contratual sempre que, pela desigualdade das partes, uma delas obtenha sobre a outra vantagem excessiva.
Na atualidade. a autonomia privada, a intangibilidade do conteúdo dos contratos e a relatividade de seus efeitos, princípios fundamentais do sistema anterior (CC/1916), devem amoldar-se a uma série de novos princípios, quais sejam, o da boa-fé objetiva, do equilíbrio econômico entre as prestações e da função social do contrato.
VI.3 - Da capitalização mensal e da taxa de juros A priori, é importante destacar que a ré exerce a atividade de instituição de pagamento, dado que é emissora de instrumento de pagamento pós-pago (Circular BACEN nº 3.885/2018, art. 4º), equivalente a uma administradora de cartão de crédito, conforme, aliás, depreende-se das atividades elencadas em seu CNPJ, atuando em conjunto com a AGN, sociedade de economia mista, na disponibilização aos servidores públicos estaduais do cartão Policard/AGN.
Nesse sentido, a Súmula nº 283 do Superior Tribunal de Justiça - STJ consolida o entendimento segundo o qual as administradoras de cartões de crédito não se submetem ao limite de juros definido pelo Decreto nº 22.626/1933 (Lei de Usura): "as empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras e, por isso, os juros remuneratórios por elas cobrados não sofrem as limitações da Lei de Usura" (Súmula nº 283, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/04/2004, DJ 13/05/2004, p. 201).
O contrato cerne da presente lide foi celebrado após a vigência da Medida Provisória nº 1.963-17/2000 (reeditada sob o nº 2.170-36/2001), razão pela qual inaplicável a restrição à capitalização mensal de juros.
Destaque-se que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 592.377/RS, com Repercussão Geral reconhecida, ocorrido em 04 de fevereiro de 2015, consolidou o entendimento de que o art. 5º da Medida Provisória nº 2.170-36/2001 é formalmente constitucional, uma vez que não desrespeitou os requisitos previstos no art. 62 da Carta Maior para a sua edição.
Para espancar qualquer dúvida, colaciona-se o entendimento já sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ, do qual se destaca a permissão à capitalização desde que expressamente pactuada: Súmula 539: É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.
Nesse passo, tramitou no Supremo Tribunal Federal – STF a ADI nº 2316 MC/DF, relatada pelo Min.
Nunes Marques, cujo entendimento foi o de "declarar a constitucionalidade do art. 5º da Medida Provisória n. 2.170-36/2001, ficando prejudicado o exame da medida cautelar.".
Veja-se: CONSTITUCIONAL.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
JULGAMENTO DEFINITIVO.
PREJUÍZO DO EXAME DA MEDIDA CAUTELAR.
CELERIDADE E ECONOMIA PROCESSUAIS.
MEDIDA PROVISÓRIA N. 2.170-36/2001, ART. 5º.
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO, JUROS SOBRE JUROS OU ANATOCISMO.
INCOMPETÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO PARA SINDICAR OS PRESSUPOSTOS DE RELEVÂNCIA E URGÊNCIA NA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA.
DESVIO DE FINALIDADE OU ABUSO DO PODER POLÍTICO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.
INEXISTÊNCIA.
PREVISÃO DE LEI COMPLEMENTAR LIMITADA À ESTRUTURA DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, E NÃO A NEGÓCIOS JURÍDICOS CELEBRADOS ENTRE AS INSTITUIÇÕES INTEGRANTES E SEUS CLIENTES (CF, ART. 192).
LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL NÃO REVESTIDA DE PARAMETRICIDADE EM SEDE DE CONTROLE ABSTRATO (LINDB, ART. 2º).
MATÉRIA ESTRANHA AO OBJETO DO DIPLOMA LEGISLATIVO.
ATECNIA.
AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO TEXTO CONSTITUCIONAL.
INOCORRÊNCIA DE NULIDADE DA NORMA, POR FORÇA DO ART. 18 DA LEI COMPLEMENTAR N. 95/1998. 1.
Transcorridos 23 anos desde o ajuizamento da ação e aparelhado o processo para análise definitiva da controvérsia – presentes as informações, a manifestação da Advocacia-Geral da União e o parecer da Procuradoria-Geral da República –, não subsiste utilidade em ultimar o exame da medida cautelar iniciado.
Em observância dos imperativos constitucionais da celeridade e economia processuais, cumpre providenciar-se a apreciação do mérito.
Precedentes. 2.
O Poder Judiciário deve abster-se de emitir juízo sobre a presença dos pressupostos de relevância e urgência na edição de medida provisória (CF, art. 62, caput), limitando-se a fazê-lo nas hipóteses marcadas por desvio de finalidade ou por abuso do poder político do Chefe do Executivo, o que não ocorre na espécie. 3.
A regulação por meio de lei complementar prevista no art. 192 da Constituição Federal se refere à estrutura do Sistema Financeiro Nacional (SFN), e não aos negócios jurídicos celebrados nesse ambiente.
Aludida exigência formal não se aplica, portanto, à periodicidade de capitalização dos juros contratados nos empréstimos concedidos pelas instituições integrantes do SFN. 4.
A norma do art. 4º da Decreto n. 22.626/1933, por ter estatura infraconstitucional, expõe-se sem maior dificuldade a supervenientes modificações ou revogações (LINDB, art. 2º).
As leis posteriores que assim fizeram não são, apenas por isso, incompatíveis com a Constituição Federal. 5.
Eventual discrepância entre certa norma e o objeto do diploma legislativo que a abriga revela atecnia insuficiente para provocar nulidade, nos termos do art. 18 da Lei Complementar n. 95/1998, não havendo falar em violação à Carta da República. 6.
Para que a declaração de constitucionalidade de uma norma alcance eficácia erga omnes e efeitos vinculantes, inclusive em face dos órgãos da Administração Pública, é necessário que o pronunciamento ocorra em sede de controle abstrato. 7.
Pedido julgado improcedente, para declarar a constitucionalidade do art. 5º da Medida Provisória n. 2.170-36/2001, ficando prejudicado o exame da medida cautelar. (ADI 2316, Relator(a): NUNES MARQUES, Tribunal Pleno, julgado em 01-07-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 21-08-2024 PUBLIC 22-08-2024) Outrossim, a jurisprudência pacífica do STJ admite como cláusula contratual expressa de capitalização a mera divergência numérica entre as taxas de juros remuneratórios mensais e anuais constantes do contrato.
Sobre o tema, destaca-se a Súmula nº 541, que consolida o entendimento da Corte Superior de Justiça acerca da matéria: Súmula nº 541 - A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.
Na mesma vertente orienta a jurisprudência do TJRN, notadamente após o julgamento, em 25/02/2015, dos Embargos Infringentes nº 2014.026005-6, oportunidade em que, com fundamento no art. 243, inciso II, §1º, do RITJRN, a egrégia Corte afastou a aplicação da decisão exarada na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível nº 2008.004025-9/0002.00 para aplicar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
Posteriormente, em 27/03/2019, o Tribunal de Justiça do RN editou as Súmulas nos 27 e 28 sobre o assunto: Súmula 27: Desde que expressamente pactuada, será válida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31 de março de 2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP n. 2.170-36/2001).
Súmula 28: A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.
Como reforço, esclareça-se que a jurisprudência pátria consolidou entendimento no sentido de que a divergência numérica necessária para a constatação da existência de cláusula expressa de capitalização também pode ser expressada por meio da diferença entre o Custo Efetivo Total - CET mensal e anual previstos, uma vez que a referida informação indica a taxa efetiva aplicada na operação, incluindo os juros remuneratórios e demais encargos e despesas do contrato.
Outrossim, a análise de eventual abusividade das taxas de juros contratadas em mútuo para pagamento através de parcelas iguais e prefixadas deve ser realizada a partir do cotejo com a taxa média praticada pelo mercado ao tempo da contratação, uma vez que é esse o momento no qual o mutuante faz um juízo perspectivo sobre a inflação então vigente e as taxas básicas de juros, que indexam a captação de moeda junto ao Banco Central pelas instituições financeiras.
Nessa direção, o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte firmou entendimento no sentido de que a taxa mostra-se desarrazoada quando exorbita em cinquenta por cento a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central e praticada na data da contratação, consoante precedente abaixo transcrito: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO.
SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE A DEMANDA.
APELAÇÃO CÍVEL.
APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AOS CONTRATOS BANCÁRIOS.
CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS.
POSSIBILIDADE.
ARTIGO 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA N.º 2.170-36/2001.
CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
MUDANÇA DO POSICIONAMENTO ANTERIORMENTE ADOTADO POR ESTA CORTE.
CONTRATO ENTRE AS PARTES FIRMADO APÓS A EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA N.º 2.170-36/2001.
DOCUMENTOS NOS AUTOS QUE DEMONSTRAM A PACTUAÇÃO EXPRESSA DA COBRANÇA DE JUROS CAPITALIZADOS.
SENTENÇA MANTIDA NESSE PONTO.
LIMITAÇÃO DE JUROS REMUNERATÓRIOS.
CABIMENTO, DESDE QUE CONSTATADA ABUSIVIDADE.
TAXA MÉDIA PRATICADA NO MERCADO.
PARÂMETRO QUE DEVE CONDUZIR O EXAME DO CASO CONCRETO.
OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.
JUROS PREVISTOS NO CONTRATO QUE NÃO PODEM ULTRAPASSAR A TAXA MÉDIA DE MERCADO ACRESCIDA DE CINQUENTA POR CENTO.
COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.
IMPOSSIBILIDADE DA COBRANÇA CUMULADA COM OUTROS ENCARGOS.
PRECEDENTES DO STJ.
RESTITUIÇÃO DE VALORES INDEVIDOS.
CABIMENTO NA FORMA SIMPLES.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE (TJRN, Apelação Cível nº 2017.002424-6, 2ª Câmara Cível, Relator Desembargadora Judite Nunes, julgamento em 03/07/2018, DJe. 09/07/2018) (grifo proposital).
Por conveniente, reproduz-se elucidativo trecho do voto da Desembargadora Relatora, ipsis litteris: "Com efeito, o percentual de juros remuneratórios deve ser razoável a ponto de preservar o equilíbrio econômico financeiro entre os contratantes, garantindo a justa compensação do credor pelo valor disponibilizado e impedindo,
por outro lado, a onerosidade excessiva para o devedor.
Nos casos em que demonstrada a abusividade na taxa de juros remuneratórios – e só nessas hipóteses – deve ela ser revista, utilizando como parâmetro o princípio da razoabilidade.
Ora, não pode ser considerada razoável a cobrança de taxa de juros que ultrapasse em cinquenta por cento a taxa média de mercado praticada na data da assinatura do contrato, conforme divulgado pelo Banco Central para esse tipo de operação de crédito, tendo como limite a taxa fixada no contrato. É cediço que razoabilidade não significa igualdade.
Se há uma taxa média praticada no mercado é porque existem uma taxa maior e uma menor.
Assim, não é possível afirmar que a taxa média é a única razoável ou que qualquer valor a maior deve ser considerado abusivo.
A razoabilidade deve variar entre a taxa média e máxima.
Daí porque considero não abusiva, por não destoar do princípio da razoabilidade, a taxa que não exceder em cinquenta por cento a média de mercado, conforme divulgado pelo Banco Central, e não ultrapasse a taxa máxima praticada nem a prevista no contrato.
Portanto, qualquer valor acima desses parâmetros, tenho, desde logo, como abusivo, na linha de precedentes desta Corte de Justiça (...)" (grifo original).
Logo, convém analisar os contratos firmados de forma pormenorizada, quais sejam os de nos 174590 (firmado em abril de 2014), 189394 (firmado em junho de 2015), 498172 (firmado em dezembro de 2016) e 957953 (firmado em outubro de 2020).
VI.3.1 - Dos contratos nos 174590, 189394 e 498172.
No caso concreto, seja a teor das disposições do CDC (art. 6º, VIII) ou do CPC (art. 373, II), incumbiria à demandada desconstituir as alegações da parte demandante, o que não ocorreu no caso concreto em relação aos contratos de nºs 174590 (firmado em abril de 2014), 189394 (firmado em junho de 2015) e 498172 (firmado em dezembro de 2016), tendo em mira que a instituição demandada sequer acostou qualquer documento ou áudio no qual conste a informação dos juros mensais e anual pactuados.
Nessa linha de raciocínio, levando em consideração o fato alegado pela autora de que não foi informada das taxas de juros incidentes sobre a operação financeira, e deixando a ré de demonstrar o contrário, na medida em que não colacionou o áudio da ligação ou documento semelhante, tem-se por verossímeis as alegações da parte requerente no tocante exclusivamente aos contratos mencionados no parágrafo anterior.
Destaque-se que caberia à requerida demonstrar que observou objetivamente todos os procedimentos regulamentares na contratação em exame, notadamente no que pertine ao direito à informação assegurado pelo art. 6º, inciso III, do CDC, o que não ocorreu na presente hipótese.
Diante da omissão quanto à taxa de juros efetivamente contratada, impõe-se o acolhimento, em parte, da pretensão revisional, para afastar a capitalização dos juros e para que incida sobre a operação financeira a média de juros do mercado, conforme apurado mensalmente pelo Banco Central do Brasil nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o autor, nos termos definidos pela Súmula nº 530 do Superior Tribunal de Justiça, a seguir transcrita: "Nos contratos bancários, na impossibilidade de comprovar a taxa de juros efetivamente contratada - por ausência de pactuação ou pela falta de juntada do instrumento aos autos -, aplica-se a taxa média de mercado, divulgada pelo Bacen, praticada nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o devedor." (Súmula 530, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/05/2015, DJe 18/05/2015).
Assim, conclui-se que o autor não foi informado em momento algum sobre a capitalização composta dos juros, nem tomou conhecimento da taxa mensal e anual contratadas quanto aos contratos de nºs 174590 (firmado em abril de 2014), 189394 (firmado em junho de 2015) e 498172 (firmado em dezembro de 2016), razão pela qual deverão incidir juros simples e a taxa média do mercado divulgada pelo BCB praticada nas operações da mesma espécie à época da contratação (Súmula nº 530 do STJ), salvo se superior à taxa contratada.
VI.3.2 - Do contrato nº 957953.
Por outro lado, quanto ao contrato nº 957953 (firmado em outubro de 2020), constam no termo de aceite (ID nº 94456522) as informações acerca da taxa de juros mensal (4,46%), do custo efetivo anual (75,40%), valor líquido liberado (R$ 1.736,55) e o valor a ser descontado dos vencimentos da autora (48 parcelas de R$ 93,08), o que, associado ao fato de que o custo efetivo total anual (75,40% a.a.) corresponde a mais de 12 vezes do mensal (4,46% a.m.), torna válida a capitalização, nos termos da jurisprudência pátria consolidada.
Noutro pórtico, a taxa de juros aplicada no contrato de 4,46% a.m., ultrapassa a taxa média do mercado divulgada pelo Banco Central à época aplicável à espécie (Pessoas físicas - Crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor público), qual seja 1,29%, acrescida de 50%, que resulta em 1,93% a.m.
Neste passo, evidencia-se que, no referido contrato, embora válida a capitalização, a taxa contratual avençada ultrapassou a taxa média de mercado para a respectiva operação, acrescida de 50%, motivo pelo qual restou caracterizada a abusividade passível de correção quanto ao encargo remuneratório firmado no instrumento contratual em vergasta.
VI.4 - Do método Gauss ou Sistema de Amortização Linear O método de cálculo dos juros simples deverá ser o Sistema de Amortização Constante - SAC, não sendo de se acolher a pretensão autoral neste particular, quando pugna pela adoção do Método Gauss ou do Sistema de Amortização Linear.
A respeito do tema, destaque-se a doutrina de Luiz Donizete Teles: “O Método de Gauss é um modelo de cálculo perfeito nas aplicações para as quais ele foi criado, mas não serve como alternativa de juros simples em operações financeiras.
Se levarmos em consideração que nas operações de empréstimo não pode haver a capitalização composta de juros, devemos supor que isto não pode ocorrer a favor de quem está fornecendo os recursos e nem a favor de quem os está recebendo.
O Método de Gauss toma como referência o retorno do investimento que um determinado valor poderá propiciar.
Ocorre que, no caso de operações de empréstimos, as prestações são compostas de capital e juros, juros estes que, em razão dos cálculos que são feitos para apurar o retorno do investimento, sofrem a incidência de novos juros.
Isto causa uma distorção a favor do devedor, na medida em que, justamente por causa da capitalização composta que ocorre no cálculo do retorno, para se alcançar o retorno esperado, a prestação calculada pelo Método de Gauss é menor” (TELES, Luiz Donizete.
Método de Gauss não serve como alternativa de juros simples.
Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3274, 18 jun. 2012.
Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22021.
Acesso em: 26 out. 2019).
No mesmo passo, tem-se acórdão do TJSP: Agravo de instrumento.
Revisão de contrato de financiamento imobiliário.
Liquidação de sentença.
Título executivo que determinou o recálculo das prestações "adotado o sistema linear de juros".
Decisão recorrida que homologou os cálculos periciais efetuados pelo Método de Gauss.
Inconformismo da instituição financeira.
O Método de Gauss, à míngua de determinação expressa no título executivo, mostra-se inadequado para recomposição das parcelas do financiamento imobiliário, uma vez que consiste em fórmula matemática para fins estatísticos e acaba por alterar o equilíbrio contratual inicialmente ajustado.
Substituição, conforme requerido, pelo Sistema de Amortização Constante - SAC, que, respeitadas as posições em sentido diverso, não induz capitalização composta de juros e melhor se adequa à hipótese.
Precedentes desta Câmara.
Recurso provido (TJSP; Agravo de Instrumento 2028046-04.2019.8.26.0000; Relator (a): Jonize Sacchi de Oliveira; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro de Campinas - 10ª.
Vara Cível; Data do Julgamento: 02/09/2019; Data de Registro: 02/09/2019) (destacou-se).
Portanto, não há falar em aplicação do método Gauss ou Sistema de Amortização Linear.
VI.5 - Da diferença no troco Em relação ao pedido de devolução do "valor referente à 'diferença no troco'", entende-se que o referido valor já consta no cálculo do valor total pactuado, não sendo viável buscá-lo em separado, tal como pretendido.
Ou seja, ao revisar o contrato, por consequência, já fica recalculado o referido "troco".
Assim, a condenação da parte ré ao pagamento de “diferença de troco” à parte autora, implicaria bis in idem, pois esse crédito já estará incluso no montante devido pela parte ré à autora em razão de eventual pagamento a maior.
Nesse sentido: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.
PROCEDÊNCIA PARCIAL DA PRETENSÃO.
APELAÇÃO DA PARTE RÉ: PLEITO DE REVISÃO DE CONTRATO.
NÃO APLICAÇÃO.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
AUSÊNCIA DE CONTRATO FORMAL.
CONTRATAÇÃO POR TELEFONE.
CARÊNCIA DE INFORMAÇÕES AO CONSUMIDOR.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS.
AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO.
VANTAGEM ABUSIVA.
APLICAÇÃO DA MÉDIA DE MERCADO.
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS AFASTADA.
CARÊNCIA DE PREVISÃO.
ILEGALIDADE.
DESPROVIMENTO.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA: REPETIÇÃO DO INDÉBITO.
AUSÊNCIA DE ENGANO JUSTIFICÁVEL.
FORMA DOBRADA.
PLEITO DE APLICAÇÃO DO MÉTODO GAUSS.
MATEMÁTICA FINANCEIRA.
QUESTÃO DE FATO A SER DEFINIDA POR MEIO DE PROVA TÉCNICA EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.
VALORES A TÍTULO DE DIFERENÇA DE “TROCO”.
VALOR JÁ RECALCULADO.
SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DA PARTE AUTORA.
OBRIGAÇÃO DA RÉ ARCAR INTEGRALMENTE COM AS CUSTAS PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
ARTIGO 86, PARÁGRAFO ÚNICO DO CPC.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0884761-62.2022.8.20.5001, Des.
Ibanez Monteiro, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 14/12/2023, PUBLICADO em 15/12/2023) Portanto, rejeita-se o pleito autoral.
VI.6 - Da restituição em dobro No atinente à restituição dos encargos tidos por abusivos, deve-se ressaltar que eventuais valores pagos a maior pela parte requerente deverão ser compensados com eventuais débitos pendentes ou, quitada a dívida, deverão ser restituídos, de forma simples, já que não é o caso de quebra da boa-fé objetiva (ver EAREsp nº 676.608).
VI.7 - Dos serviços não contratados No que tange aos pleitos de declaração de nulidade e condenação da parte requerida à restituição, em dobro, das quantias adimplidas a título de eventuais serviços não contratados, a exemplo de seguros, cabe esclarecer que os pedidos foram formulados pelo requerente de forma absolutamente genérica, sem qualquer indicativo ou especificação dos serviços discutidos e reputados indevidos.
Registre-se, por oportuno, que para possibilitar a revisão do negócio jurídico de modo a declarar a nulidade de disposições contratuais que ensejem a contratação de serviços indevidos e/ou indesejados, é imprescindível a indicação pormenorizada das supostas abusividades praticadas, notadamente porque é assente na jurisprudência do STJ (Súmula nº 381) que "nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas", em razão da natureza eminentemente patrimonial e, portanto, disponível do direito neles consubstanciado.
Dessa forma, tem-se por incabível o acolhimento dos pedidos mencionados.
Ante o exposto: a) rejeito as preliminares, bem como a prejudicial de decadência; b) ACOLHO PARCIALMENTE a questão prejudicial de mérito arguida pela parte demandada na peça de defesa e, em decorrência, RECONHEÇO A PRESCRIÇÃO da pretensão autoral em relação aos contratos celebrados em novembro de 2009, junho de 2011 e setembro de 2012 (datas anteriores a novembro de 2012)., com fundamento no art. 205 do Código Civil brasileiro; e, c) JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão autoral, e, em decorrência: c.1) determino a incidência, nos contratos de n.ºs 174590 (firmado em abril de 2014), 189394 (firmado em junho de 2015), 498172 (firmado em dezembro de 2016) e 957953 (firmado em outubro de 2020), firmados entre as partes, da taxa média de juros do mercado divulgada pelo BCB praticada nas operações da mesma espécie (Súmula nº 530 do STJ); e, c.2) declaro abusiva a capitalização composta de juros nos contratos nºs 174590 (firmado em abril de 2014), 189394 (firmado em junho de 2015) e 498172 (firmado em dezembro de 2016), diante da ausência de pactuação das taxas de juros mensal e anual (Súmulas nos 539 e 541 – STJ), motivo pelo qual determino o recálculo das parcelas com a incidência de juros simples.
Em decorrência, condeno a parte ré à repetição na forma simples dos valores pagos a maior, ou que seja realizada a sua compensação com eventuais débitos do demandante.
Advirta-se que sobre o valor a ser repetido ao demandante também deverá incidir correção monetária (IPCA a incidir a partir da data do efetivo pagamento declarado como indevido) e juros de mora (SELIC deduzida a taxa relativa ao IPCA), nos termos da Lei 14.905/2024, a contar de citação, por se tratar de responsabilidade contratual.
Diante da sucumbência recíproca, condeno a ré ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, e a parte autora ao pagamento de 10% sobre o valor do proveito econômico obtido pela parte ré (art. 85, §2º, c/c art. 86, caput, ambos do CPC) - pedido não acolhido.
Condeno, ainda, a parte demandada ao pagamento de 70% (setenta por cento) das custas processuais e a parte demandante ao pagamento dos 30% (trinta por cento) restantes.
Todavia, com arrimo no art. 98, §3º, do CPC, suspendo a cobrança/execução das verbas a serem suportadas pela parte demandante.
De consequência, julgo extinto o processo, com resolução do mérito, na forma do art. 487, incisos I e II do CPC.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Transitada em julgado, arquivem-se os autos com baixa na distribuição.
NATAL/RN, 04 de agosto de 2025.
KARYNE CHAGAS DE MENDONÇA BRANDÃO Juíza de Direito (documento assinado digitalmente na forma da Lei nº 11.419/06)
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
14/09/2025
Ultima Atualização
04/08/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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