TRF1 - 1011999-60.2023.4.01.4300
1ª instância - 1ª Palmas
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Polo Ativo
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Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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31/08/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Tocantins 1ª Vara Federal Cível da SJTO PROCESSO: 1011999-60.2023.4.01.4300 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) POLO ATIVO: MARIO FELIPE BASTOS NOLETO POLO PASSIVO: COMISSÃO PERMANENTE DE HETEROIDENTIFICAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS - UFT e outros DECISÃO Cuida-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado por MARIO FELIPE BASTOS NOLETO (CPF *83.***.*66-14) em face do REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS - UFT, objetivando a anulação do ato administrativo que indeferiu a sua matrícula pela cota para pessoa autodeclarada parda, bem como a manutenção definitiva do seu vínculo com a universidade.
Alega que foi aprovado no processo seletivo 2022/1 e ingressou no curso de Engenharia Elétrica da UFT, através do sistema de cotas, grupo L6, destinado a candidatos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas que, independentemente da renda, tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.
Prossegue narrando que já estava matriculada no terceiro período do curso, quando a Universidade convocou os alunos para realização do procedimento de heteroidentificação.
Informa que teve acesso apenas ao edital do resultado de indeferimento da sua autodeclaração, tendo manejado recurso administrativo sem acesso às razões do indeferimento, e que seu recurso também foi indeferido, conforme Edital n.º 021/2023, de 19/06/2023.
Sustenta que as bancas inicial e recursal não fundamentaram devidamente suas decisões, limitando-se a registrar que nenhuma característica fenotípica estaria presente, sem fornecer cópia dos formulários.
Requereu a concessão da medida liminar e dos benefícios da justiça gratuita. É o relatório.
DECIDO.
Como se sabe, a concessão de medida liminar em sede de mandado de segurança exige a demonstração de fundamento relevante (probabilidade do direito) e de risco de ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida (art. 7º, §3º, da Lei nº 12.016/2009).
A decisão administrativa aqui combatida (indeferimento da matrícula pela reserva de vagas a pessoa autodeclarada "parda") importa interrupção imediata do vínculo do autor com a instituição de ensino, de modo que é facilmente previsível a ocorrência de danos.
O requerente ingressou no curso de Engenharia Elétrica no primeiro semestre de 2022[1] (Id. 1779750566), ou seja, já cursou pelo menos 3 (três) períodos do curso.
Além dos possíveis prejuízos educacionais e de aprendizagem decorrentes da interrupção abrupta dos estudos, a autora também poderá experimentar prejuízos financeiros com o atraso do acesso ao mercado de trabalho especializado.
Ademais, não vislumbro qualquer risco inverso decorrente da implementação da medida liminar pretendida.
A manutenção do aluno no curso, ainda que mediante determinação judicial precária, não trará, em princípio, qualquer ônus adicional à instituição de ensino, seja quanto à gestão do serviço público, seja quanto à questão orçamentária, uma vez que as aulas continuarão a ser ofertadas normalmente à turma integrada pela autora.
Quanto à probabilidade do direito invocado pelo impetrante, observo que ao menos parte das teses trazidas na inicial preenchem tal requisito.
Com efeito, observo que a UFT levou mais de um ano para realizar o procedimento de heteroidentificação do acadêmico impetrante, permitindo a ocorrência de indesejável situação de insegurança jurídica, e de frustração de legítima expectativa de direitos.
Não se olvida que o instituto da reserva de vagas para alunos negros, de baixa renda e egressos da rede pública de ensino médio, prevista na Lei nº 12.711/2012, representa um importante mecanismo de política de inclusão social, cujos objetivos devem ser permanentemente fiscalizados pelas instituições de ensino, devendo ser coibida a utilização indevida dos benefícios ali estipulados.
Por outro lado, também é de se registrar que o legislador criou uma situação de difícil controle para o Gestor Público, ao estabelecer a reserva de vagas para pessoas autodeclaradas pardas, indicando apenas a necessidade de observância de proporção entre a quantidade de vagas a serem reservadas e a respectiva representatividade dessa população, de acordo com o último censo do IBGE.
Como se sabe, o Supremo Tribunal Federal já havia chancelado a possibilidade dessa política pública (reserva de vagas para população negra) existente em várias Universidades, antes mesmo da promulgação da Lei nº 12.711/2012, através da ADPF nº 186, bem como a validade dos procedimentos de heteroidentificação.
Mais recentemente, o Supremo voltou a apreciar essa questão no âmbito dos concursos públicos, na ADC nº 41, cujas razões, no meu entender, são perfeitamente aplicáveis aos processos seletivos para ingresso nas Universidades.
Naquela oportunidade, fixou-se a tese vinculante de que “é legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa”.
Do voto do Relator naquela Ação Direta, seguido pela unanimidade dos Ministros da Suprema Corte, destaco o seguinte trecho: Por fim, deve-se ter bastante cautela nos casos que se enquadrem em zonas cinzentas.
Nas zonas de certeza positiva e nas zonas de certeza negativa sobre a cor (branca ou negra) do candidato, não haverá maiores problemas.
Porém, quando houver dúvida razoável sobre o seu fenótipo, deve prevalecer o critério da autodeclaração da identidade racial.
No caso dos presentes autos, contudo, há ainda uma circunstância peculiar – a demora na realização do procedimento de heteroidentificação.
Embora em outros casos envolvendo o mesmo Edital, a Universidade tenha apresentado como justificativa as dificuldades advindas da pandemia de Covid19 – tenho que não há plausibilidade nessa alegação.
Convém ressaltar que UFT já havia determinado o retorno das aulas presenciais, desde o primeiro semestre de 2022[2].
Ademais, o Ministério da Saúde declarou o fim da situação de emergência em saúde pública por meio da Portaria GM/MS Nº 913, de 22 de abril de 2022.
Esse o cenário, no momento do ato de matrícula da impetrante, em março/2022, restava pouco tempo para que a UFT pudesse submeter os candidatos, logo no início, ao procedimento de heteroidentificação.
A realização da avaliação do procedimento de heteroidentificação poderia ter sido realizada há mais de ano.
Contudo, por opção da instituição de ensino, e sem fundamento relevante bastante, foi postergada.
Esse cenário permitiu o avanço do acadêmico nos semestres letivos e aprofundamento nos estudos, de modo que a retirada do estudante da universidade, depois de já ter avançado tanto nos estudos acadêmicos, atenta contra os princípios da confiança e boa-fé, ferindo o direito à educação, notadamente diante do padrão de avaliação que vem sendo realizado pela Instituição de Ensino, conforme inúmeros casos já examinados, sem a apresentação de fundamentos especificados que justifiquem a exclusão do candidato.
Por fim, ainda que seja inviável a fixação de parâmetros estritamente objetivos, observo que a quase totalidade dos atos praticados pelas bancas de heteroidentificação carecem de fundamentação, uma vez que não há, nem mesmo de maneira superficial, exposição das razões, o que só poderá ser aferido em momento posterior, após a UFT ser intimada a trazer aos autos cópias dos formulários de avaliação inicial e recursal do impetrante.
Também já se verificou de forma reiterada que o procedimento não viabilizou aos acadêmicos nenhuma dialética própria do contraditório, de modo que já restou demonstrado em inúmeros outros casos relacionados ao mesmo edital que não fora ofertada ao menos a possibilidade de argumentação pelos candidatos das características fenotípicas que eles entenderiam possuir, e muito menos o enfrentamento desse debate.
Diante do exposto, DEFIRO A MEDIDA LIMINAR PLEITEADA e DETERMINO a suspensão dos efeitos do ato administrativo de indeferimento da autodeclaração de pardo do candidato impetrante, e DETERMINO a manutenção da sua matrícula no curso de Engenharia Elétrica, até a decisão final deste processo.
Outrossim, DEFIRO os benefícios da justiça gratuita, requeridos por pessoa natural que apresentou declaração de hipossuficiência.
Ordeno a intimação das partes para que se manifestem quanto ao interesse em aderir ao Juízo 100% digital.
Em caso positivo, as partes e seus advogados devem fornecer e-mail e telefone celular.
PROVIDÊNCIAS DE IMPULSO PROCESSUAL A Secretaria da Primeira Vara Federal deverá: i) intimar o impetrante, especialmente para cumprir o item 28, verificando a regularidade do cadastro do(a) advogado(a) junto ao PJe, de modo a possibilitar sua intimação diretamente via sistema; ii) notificar, com urgência, a autoridade coatora para cumprir a medida liminar, bem como para, no prazo de 10 (dez) dias, prestar informações, devendo trazer aos autos cópias dos formulários de avaliação do impetrante nas bancas inicial e recursal de heteroidentificação; iii) dar ciência do feito ao órgão de representação judicial da UFT, para que, querendo, ingresse no feito; iv) intimar o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL para dizer se pretende intervir, no prazo de 05 (cinco) dias.
Em caso afirmativo, será formalizada a intimação no momento oportuno; v) apresentadas as informações, caso o MPF não pretenda intervir, concluir o processo para julgamento.
Palmas (TO), data abaixo. (assinado digitalmente) CAROLYNNE SOUZA DE MACEDO OLIVEIRA Juíza Federal Titular da 1ª Vara SJTO [1] https://docs.uft.edu.br/share/proxy/alfresco-noauth/api/internal/shared/node/vENxxLyASnSCeffn2AfpKw/content/Edital%20Prograd%20n%C2%BA%20396_2022%20Convocat%C3%B3ria%20para%20Matr%C3%ADcula%20Chamada%20Regular%20SISU%202022_1.pdf [2] Notícia disponível em < https://ww2.uft.edu.br/index.php/marcadores/retomadaensinopresencial#:~:text=As%20aulas%20ser%C3%A3o%20retomadas%20na,2022%2C%20para%20calouros%20e%20veteranos.> -
25/08/2023 18:22
Recebido pelo Distribuidor
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25/08/2023 18:22
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
25/08/2023
Ultima Atualização
15/01/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença Tipo A • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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