TRF1 - 1001488-75.2019.4.01.3901
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. 31 - Desembargadora Federal Solange Salgado da Silva
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Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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27/10/2023 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 1001488-75.2019.4.01.3901 PROCESSO REFERÊNCIA: 1001488-75.2019.4.01.3901 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:SOLANGE BARROS DE AGUIAR e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: ULISSES VIANA DA SILVA DE MATOS MAIA - PA20351-A, HEIDE PATRICIA NUNES DE CASTRO - PA25961-A, HELTON FRANCISCO DE SOUSA CARVALHO - AM9356-A, SANDRA REGINA DOS SANTOS - AM3455-A, HUDSON DAVID SOUZA DA SILVA - PA30744-A e ANA PAULA FONSECA LOURINHO - PA32052-A RELATOR(A):MARLLON SOUSA PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gabinete 31 Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1001488-75.2019.4.01.3901 R E L A T Ó R I O O EXMO.
SR.
JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (RELATOR CONVOCADO): Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público Federal em face de sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Federal Cível e Criminal da Subseção Judiciária de Marabá/PA que, nos autos da ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta contra Solange Barros Aguiar, José Ribamar Oliveira da Cruz, Jonatas Dias Morais Sousa e Keila Abreu Sepuvida Gomes, julgou improcedente o pedido nos termos do art. 487, inciso I, do CPC.
Consta da petição inicial que os recorridos, na qualidade de Secretários de Finanças e de Saúde do município de São Geraldo do Araguaia/PA, no exercício do ano de 2013, teriam adquirido medicamentos, pagos com recursos do Fundo Nacional de Saúde (FNS), sem comprovação da efetiva entrada dos produtos no almoxarifado Secretária de Saúde Municipal, argumentando que os produtos foram pagos, mas não teriam sido recebidos (ID 319854150).
Assevera que, com base no Relatório n. 14104 – DENASUS, relativo à auditoria realizada na Secretaria de Saúde de São Geraldo do Araguaia/PA, teriam sido constatadas diversas irregularidades na prestação dos serviços de atendimento à população, no controle interno para aquisição de materiais, também como no funcionamento dos órgãos de representação popular (Conselho Municipal de Saúde).
Após regular instrução processual, sobreveio sentença de absolvição sob os fundamentos de ausência de dolo e de prática de meras irregularidades administrativas.
Em razões recursais, o MPF sustenta, em síntese: i) inaplicabilidade do regime jurídico do direito penal ao direito administrativo sancionador; ii) inconstitucionalidade material das novas regras de prescrição intercorrente e da irretroatividade das alterações promovidas pela Lei 14.230/2021; iii) que a conduta dos recorridos gerou danos ao erário (ID 319854277).
Contrarrazões defensivas (IDs 319854285 e 319854287).
Em parecer, a Procuradoria Regional da República da 1ª Regional manifesta-se pelo provimento do recurso de apelação (ID 321537639). É o relatório.
Juiz Federal MARLLON SOUSA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gabinete 31 Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1001488-75.2019.4.01.3901 VOTO O EXMO.
SR.
JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA (RELATOR CONVOCADO): Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.
Durante a tramitação do processo foi publicada a Lei n. 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei n° 8.429/92, havendo decisão do STF (Tema 1.199) dirimindo conflitos relacionados à aplicabilidade dessas modificações aos processos em curso, cuja tese fixada transcrevo abaixo: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.” Grifos.
As mudanças na Lei nº 8.429/92, promovidas pela Lei nº 14.230/2021, aplicam-se ao caso concreto, eis que atingem as ações em curso, considerando que o artigo 1º, §4º, determina a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, que comporta aplicação retroativa por beneficiar o réu.
Caracteriza improbidade administrativa toda ação ou omissão dolosa praticada por agente público ou por quem concorra para tal prática, ou ainda dela se beneficie, qualificada pela deslealdade, desonestidade ou má-fé, que acarrete enriquecimento ilícito (art. 9º), lesão ao erário (art. 10) ou afronte os princípios da Administração Pública (art. 11).
Como relatado, o caso em comento versa sobre a prática de irregularidades referentes à aplicação dos recursos financeiros e sobre o funcionamento do Conselho de Saúde no município de São Geraldo do Araguaia/PA, no exercício de 2013, a partir do Relatório da Auditoria nº 14104 – DENASUS, em que o Departamento Nacional de Auditoria dos SUS identificou a ocorrência de dano ao erário em razão da realização de despesas com aquisição de medicamentos, pagos com recursos do Fundo Nacional de Saúde (FNS), sem comprovação da efetiva entrada dos produtos no almoxarifado da Secretaria Municipal.
Consta dos autos que a recorrida Solange Barros Aguiar ocupou o cargo de Secretária de Finanças de São Geraldo do Araguaia, de 1/1/2013 a 19/5/2014, e José Ribamar Oliveira da Cruz, Jonatas Dias Morais Sousa e Keila Abreu Sepuvida Gomes exerceram, sucessivamente, a função de Secretário de Saúde.
As condutas imputadas estão previstas art. 10, inciso XI, da LIA, abaixo transcrito: “Art. 10.
Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;” Pelo princípio da presunção de constitucionalidade das leis e atos do Poder Público, que é corolário do princípio da separação de poderes, todo ato normativo presume-se constitucional até prova em contrário.
Promulgada e sancionada uma lei, passa ela a desfrutar de presunção relativa (ou iuris tantum) de constitucionalidade.
Os argumentos apontados pelo órgão ministerial não são suficientes para infirmar a presunção de constitucionalidade da Lei n° 14.230/21. É legítima a opção legislativa de revogar condutas constantes da Lei n° 8.4929/92, para que sejam tratadas por outros ramos do Direito, que não o direito administrativo sancionador.
Observa-se que, à luz do disposto no art. 1°, § 1º, da Lei 8.429/92 com a redação dada pela Lei 14.230/21, para a configuração do ato de improbidade é imperioso a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para todos os tipos previstos na Lei de Improbidade Administrativa, de sorte que a improbidade administrativa não se caracteriza por meio de responsabilização objetiva dos agentes públicos.
Em que pese a constatação de irregularidades administrativas, não restou demonstrado a presença de dolo nas condutas imputadas, não sendo suficiente a condenação na modalidade culposa por imperícia dos gestores municipais.
Não há demonstração de que os apelados tenham agido animados pela vontade livre e consciente de causar danos materiais ao erário, de tal modo que não se pode punir o administrador público despreparado, inábil, mas apenas o desonesto, que tenha a intenção de causar dano efetivo ao erário, obter vantagem indevida ou ofender os princípios da Administração Pública.
A ausência de atesto de recebimento dos materiais não constitui, por si só, prova de danos ao erário.
Ao que parece, os fatos apresentados apontam para uma falha ou ilegalidade evidente em seus sistemas de recebimento e controle de remédios.
Para caracterizar a ocorrência de atos de improbidade ou prejuízos ao erário, seria necessário indicar a possível existência de conluio entre os apelados e outros funcionários encarregados de receber as aquisições, bem como os fornecedores de medicamentos.
Não é razoável presumir atos de má conduta ou danos ao erário com base exclusivamente nos relatórios de auditoria.
No ponto, destaco trecho da sentença que, pela clareza e precisão, adoto como razões de decidir (ID 319854275 - pág. 6): “Mais que isso, não se pode presumir a atuação ímproba ou lesão aos cofres públicos em decorrência das irregularidades constadas pelo DENASUS em seus relatórios.
A lógica da responsabilização administrativa dos agentes públicos, em especial nos processos de Tomada de Contas Especiais é diferente, e muito, do que a aplicável na esfera sancionatória cível através da Lei de Improbidade.
Veja, em especial, que a ausência de recebimento ou de atesto nas compras de medicamentos poderia ensejar a responsabilização pela hipótese do art. 10, XII, da LIA: Art. 10.
Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021) (...) XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; (...) – LIA Mas para tanto, quanto aos réus ex-secretários municipais de saúde, deveria se aventa sua atuação na execução dos contratos em questão, não por mera vinculação das receitas, intuitivamente, à pasta da Secretaria de Saúde.
A priori, a responsabilização por esses recebimentos não é delegada aos Secretários Municipais de Saúde ou de Finanças Públicas, mas a servidores específicos da Administração pública Municipal, conforme se nota na Lei n. 8.666/1993: Art. 15.
As compras, sempre que possível, deverão: (...) § 8º O recebimento de material de valor superior ao limite estabelecido no art.23 desta Lei, para a modalidade de convite, deverá ser confiado a uma comissão de, no mínimo, 3 (três) membros. (...) Art. 73.
Executado o contrato, o seu objeto será recebido: II - em se tratando de compras ou de locação de equipamentos: a) provisoriamente, para efeito de posterior verificação da conformidade do material com a especificação; b) definitivamente, após a verificação da qualidade e quantidade do material e consequente aceitação. § 1º Nos casos de aquisição de equipamentos de grande vulto, o recebimento far-se-á mediante termo circunstanciado e, nos demais, mediante recibo. § 2º O recebimento provisório ou definitivo não exclui a responsabilidade civil pela solidez e segurança da obra ou do serviço, nem ético-profissional pela perfeita execução do contrato, dentro dos limites estabelecidos pela lei ou pelo contrato. § 3º O prazo a que se refere a alínea "b" do inciso I deste artigo não poderá ser superior a 90 (noventa) dias, salvo em casos excepcionais, devidamente justificados e previstos no edital. § 4º Na hipótese de o termo circunstanciado ou a verificação a que se refere este artigo não serem, respectivamente, lavrado ou procedida dentro dos prazos fixados, reputar-se-ão como realizados, desde que comunicados à Administração nos 15 (quinze) dias anteriores à exaustão dos mesmos.” Ausente a demonstração do elemento subjetivo doloso, não há mais que se falar em condenação por improbidade administrativa.
Nesse sentido, é a jurisprudência desta Corte Regional: “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
LEI N. 8.429/92.
ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI N. 14.230/2021.
APLICAÇÃO AOS PROCESSOS EM CURSO.
AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS.
ART. 10 DA LEI 8.429/92.
DOLO ESPECÍFICO E PREJUÍZO AO ERÁRIO NÃO DEMONSTRADOS.
ART. 11, VI, DA LEI 8.429/92.
DOLO E MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADOS.
CONDUTA(S) ÍMPROBA(S) MANIFESTAMENTE INEXISTENTE(S).
ART. 17, §11, DA LEI 8.429/92.
DESPROVIMENTO DOS RECURSOS.
SENTENÇA MANTIDA. 1.
Trata-se recursos de apelação interpostos pelo MPF e pelo FNDE contra sentença que, em sede de ação civil de improbidade administrativa, julgou improcedentes os pedidos para condenação da ré como incursa nas condutas do art. 10, caput, e art. 11, VI, da Lei n° 8.429/92 (art. 487, I, do Código de Processo Civil).
O MPF defende a materialidade e autoria do(s) ato(s) ímprobo(s) imputado(s), bem como a irretroatividade da Lei n° 14.230/2021, requerendo o provimento do apelo a fim de que a sentença de primeiro grau seja reformada, com subsequente condenação da ré nas penas previstas nos incisos II e III do art. 12 do mesmo diploma legal.
O FNDE ratificou o Apelo do MPF. 2.
A Lei n° 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa - LIA) sofreu significativas modificações de natureza material e processual a partir das inovações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021.
O referido diploma, que entrou em vigor a partir de 26/10/2021, ao passo em que estabeleceu novas diretrizes no campo da persecução dos atos de improbidade praticados contra a Administração Pública, fixou critérios mais rígidos em matéria probatória, ampliando as garantias asseguradas ao agente, e estabelecendo, de forma expressa, que ao sistema de responsabilização por atos ímprobos aplicam-se os princípios constitucionais do Direito Administrativo Sancionador (art. 1°, §4° da LIA). 3.
A nova legislação incide no caso concreto, seja em razão da índole processual de algumas de suas regras, seja por estabelecer um novo regime jurídico persecutório (norma de ordem pública), no qual é possível aplicar os princípios do direito administrativo sancionador (art. 1°, §4° da LIA), sub-ramo do Direito Administrativo, que expressa o poder punitivo do Estado perante o administrado. 4.
As questões de natureza material introduzidas na LIA pela Lei n° 14.230/2021, particularmente nas hipóteses benéficas ao réu, têm aplicação imediata aos processos em curso, em relação aos quais ainda não houve trânsito em julgado.
Na prática, o julgamento de uma ação de improbidade administrativa que esteja em trâmite, necessariamente, levará em conta a superveniência da Lei n° 14.230/2021, permitindo a retroatividade da norma material benigna em favor do agente.
Ou seja, se as inovações legais recaírem sobre elementos constitutivos do tipo, seja para excluir a ilicitude de certas condutas, seja para abrandar a punição ou, ainda, para recrudescer as condições para o juízo condenatório, a partir de exigências adicionais para a configuração do ato ímprobo, todas essas nuances deverão ser consideradas para o escorreito julgamento da causa. 5.
A responsabilização por ato de improbidade administrativa, em quaisquer das suas modalidades/categorias, não prescinde da comprovação do elemento subjetivo doloso (art. 1°, §§ 1° e 2°, art. 9°, 10 e 11 da LIA, com nova redação). 6.
A partir das modificações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021, a nova redação do caput art. 10 da Lei n° 8.429/92 passou a adotar a perda patrimonial efetiva como aspecto nuclear das condutas ímprobas que causam lesão ao erário, havendo óbice, por exemplo, à configuração do ato ímprobo com base na culpa grave e no dano presumido” (dano in re ipsa – cf. art. 21, I, da LIA).
Para além de não ter sido comprovado o agir doloso, não houve comprovação de efetivo prejuízo ao erário. 7.
Também os incisos do art. 11 da LIA deixaram de lado o caráter exemplificativo e passaram a ostentar caráter taxativo (numerus clausus).
Desse modo, apenas a prática das condutas expressamente tipificadas no rol do mencionado dispositivo será configurada como ato ímprobo por violação aos princípios da administração pública, sendo certo, ademais, que os incisos I, II, IX e X do art.11 da LIA foram expressamente revogados.
Já o enquadramento da conduta relativa a não prestação de contas (inciso VI - imputação dirigida à Apelada) impõe: (i) a demonstração de que o agente dispunha de condições para realizar o procedimento; bem como (ii) a comprovação de que ele (o agente) tinha por escopo “ocultar irregularidades” e obter proveito ou benefício indevido para si ou para terceiros (inciso VI e §1 do art. 11 da LIA), circunstâncias não verificadas no caso dos autos. 8.
O legislador ordinário, validamente (cf. permissivo do art. 37, §4° da CF/88), passou a exigir o animus doloso e o efetivo prejuízo ao erário para tipificação da(s) conduta(s) prevista(s) no art. 10 da LIA; aboliu alguns tipos sancionadores anteriormente previstos no art. 11 da LIA, bem como tornou mais rígido o tipo previsto no inciso VI do art. 11, exigindo efetiva demonstração do dolo específico. 9.
Em recente apreciação do Tema 1199 (Recurso Extraordinário com Agravo nº 843989/PR), o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei. 10. À luz dos balizamentos fixados pela Suprema Corte, afigura-se plenamente possível concluir que as novas disposições da LIA no que concerne à tipificação do ato de improbidade (normas de direito material mais benéficas) devem ser aplicadas às ações em curso, ou seja, nas quais ainda não se operou o trânsito em julgado.
Na hipótese dos autos, considerando as modificações introduzidas pela Lei n° 14.230/2021 e os princípios do direito administrativo sancionador, há manifesta inexistência do(s) ato(s) de improbidade descritos na petição inicial (cf.art.17, §11, da Lei n° 8.429/92 - atual redação), não merecendo reparos a sentença que julgou improcedentes os pedidos, extinguindo a ação com apoio no art. 487, I, do CPC. 11.
Descabimento do duplo grau obrigatório, uma vez que o legislador ordinário, nos termos do art. 17, § 19, inciso IV, c/c o art. 17-C, §3°, ambos da Lei nº. 8.429/1992, com redação conferida pela Lei n° 14.230/2021, fez clara opção pelo afastamento do instituto nas ações de improbidade administrativa. 12.
Desprovimento dos recursos de apelação. (AC 1001654-04.2019.4.01.4000, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - TERCEIRA TURMA, PJe 15/06/2023 PAG)” Além disso, observo que o recurso de apelação não faz qualquer menção ao elemento subjetivo doloso por parte dos apelados, limitando-se a apontar a existência de prejuízo ao erário e a contestar a aplicação retroativa da Lei 14.230/21.
Com efeito – sem qualquer enfrentamento acerca do acerto ou desacerto das alterações promovidas – certo é que a mens legis foi no sentido de que situações tais devem ser punidas em sede administrativa, em razão do princípio da fragmentariedade ou da intervenção mínima (a indicar a subsidiariedade da demanda de improbidade).
Portanto, diante das alterações sofridas pela Lei nº 8.429/92, tendo sido revogado a conduta culposa na forma do art. 10, caput c/c art. 1°, § 1°, da Lei 8.429/92 não há conduta ímproba a ser imputada aos apelados, em razão da não demonstração do elemento subjetivo doloso.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação. É o voto.
Juiz Federal MARLLON SOUSA Relator convocado PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 1ª Região Gabinete 31 Processo Judicial Eletrônico PROCESSO: 1001488-75.2019.4.01.3901 PROCESSO REFERÊNCIA: 1001488-75.2019.4.01.3901 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO:SOLANGE BARROS DE AGUIAR e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ULISSES VIANA DA SILVA DE MATOS MAIA - PA20351-A, HEIDE PATRICIA NUNES DE CASTRO - PA25961-A, HELTON FRANCISCO DE SOUSA CARVALHO - AM9356-A, SANDRA REGINA DOS SANTOS - AM3455-A, HUDSON DAVID SOUZA DA SILVA - PA30744-A e ANA PAULA FONSECA LOURINHO - PA32052-A E M E N T A ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
LEI 8.429/92 ALTERADA PELA LEI 14.230/21.
APLICABILIDADE.
CONSTITUCIONALIDADE.
ART. 10, INCISO XI.
LIBERAÇÃO DE VERBA SEM OBSERVÂNCIA DAS NORMAS PERTINENTES.
DOLO NÃO COMPROVADO.
ABSOLVIÇÃO.
PRECEDENTES.
APELO NÃO PROVIDO. 1.
Durante a tramitação do processo foi publicada a Lei n. 14.230/2021, que introduziu consideráveis alterações na Lei n° 8.429/92, havendo decisão do STF (Tema 1.199) dirimindo conflitos relacionados à aplicabilidade dessas modificações aos processos em curso. 2.
As mudanças na Lei nº 8.429/92, promovidas pela Lei nº 14.230/2021, aplicam-se ao caso concreto, eis que atingem as ações em curso, considerando que o artigo 1º, §4º, determina expressamente a aplicação imediata de seus dispositivos em razão dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, que comporta aplicação retroativa por beneficiar o réu, conforme determinado pelo Supremo Tribunal Federal na tese do Tema 1199, ao finalizar o julgamento do Recurso Extraordinário no Agravo nº 843989. 3. É legítima a opção legislativa de revogar condutas constantes da Lei n° 8.4929/92, para que sejam tratadas por outros ramos do Direito, que não o direito administrativo sancionador.
Os argumentos apontados pelo apelante não são suficientes para infirmar a presunção de constitucionalidade da Lei n° 14.230/21. 4.
No caso, imputa-se aos recorridos a prática de adquirir medicamentos, pagos com recursos do Fundo Nacional de Saúde (FNS), sem a comprovação do efetivo recebimento dos produtos. 5.
De acordo com o disposto no art. 1°, § 1º, da Lei 8.429/92, com a redação dada pela Lei 14.230/21, para a configuração do ato de improbidade é imperioso a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para todos os tipos previstos na Lei de Improbidade Administrativa, de sorte que a improbidade administrativa não se caracteriza por meio de responsabilização objetiva dos agentes públicos. 6.
Em que pese a constatação de irregularidades administrativas, não restou demonstrada a presença de dolo nas condutas imputadas, não sendo suficiente a condenação na modalidade culposa por imperícia dos gestores municipais. 7.
Não se pode punir o administrador público despreparado, inábil, mas apenas o desonesto, que tenha a intenção de causar dano efetivo ao erário, obter vantagem indevida ou ofender os princípios da Administração Pública.
Manutenção da sentença. 8.
Apelo não provido.
A C Ó R D Ã O Decide a Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juiz Federal MARLLON SOUSA Relator Convocado -
26/06/2023 08:00
Recebidos os autos
-
26/06/2023 08:00
Recebido pelo Distribuidor
-
26/06/2023 08:00
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
26/06/2023
Ultima Atualização
27/10/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
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