TRF1 - 1004359-38.2024.4.01.3502
1ª instância - 2ª Anapolis
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Polo Ativo
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Polo Passivo
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Movimentações
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28/05/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Anápolis-GO 2ª Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Anápolis-GO SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1004359-38.2024.4.01.3502 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: NAZARE ALVES DOS SANTOS REPRESENTANTES POLO ATIVO: RENATA ALVES DOS SANTOS - DF67062 POLO PASSIVO:FUNDO GARANTIDOR DA HABITACAO POPULAR REPRESENTANTES POLO PASSIVO: SERVIO TULIO DE BARCELOS - MG44698 SENTENÇA Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais ajuizada pelo espólio de Nazaré Alves dos Santos, representado pela inventariante Vera Lúcia Alves Barbosa, em face do Fundo Garantidor da Habitação Popular – FGHAB.
A parte autora objetiva a quitação integral do saldo devedor do financiamento habitacional, com fundamento no contrato e na legislação aplicável, bem como a condenação do FGHAB ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), sustentando que a negativa injustificada da cobertura, somada à omissão e à transferência indevida de responsabilidade, causaram intenso sofrimento aos herdeiros e à inventariante, atrasando a resolução do inventário e prejudicando a alienação do imóvel.
Por fim, pleiteia também o reconhecimento da aplicação do Código de Defesa do Consumidor, inclusive para fins de inversão do ônus da prova.
Narra que a falecida Nazaré Alves dos Santos firmou, em 11/04/2014, contrato de financiamento habitacional junto ao Banco do Brasil, no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV, contrato esse registrado sob o nº 359.803.699.
Alega que o contrato previa expressamente a cobertura securitária pelo FGHAB em caso de falecimento ou invalidez permanente, conforme cláusulas 18ª e 19ª.
Informa que a mutuária veio a óbito em 05/01/2020, e desde então os herdeiros e a inventariante realizaram diversas tentativas de acionamento da cobertura securitária, tanto por vias administrativas como judiciais, sem sucesso.
Afirma que houve omissão por parte do agente financeiro (Banco do Brasil) e também do FGHAB, que se negaram a cumprir com a obrigação contratual de quitação do saldo devedor, além de obstaculizar a habilitação do crédito securitário no inventário.
Citado, o FGHAB apresentou contestação (Id 2138839189) em que suscitou, em preliminar, a ilegitimidade passiva, sustentando que se trata de fundo despersonalizado, cuja gestão e representação cabem à Caixa Econômica Federal, que não figura no polo passivo.
No mérito, alegou que não se trata de contrato de seguro tradicional, mas sim de um fundo privado que opera por regras estatutárias próprias, voltadas ao suporte do agente financeiro, e não diretamente ao mutuário.
Afirmou que a responsabilidade pelo acionamento da cobertura securitária é do Banco do Brasil, e que o fundo não possui relação jurídica direta com o consumidor.
Contestou, ainda, a aplicação do CDC e refutou a existência de dano moral indenizável.
Réplica apresentada Id 2141031294. É o breve relato.
Decido.
De início, a preliminar de ilegitimidade passiva não merece prosperar.
Embora o FGHAB seja um fundo especial, é autorizado a atuar em juízo por meio de sua administradora, a Caixa Econômica Federal, conforme disposto no seu estatuto (Id 2138839246).
Registre-se, por oportuno, que o Fundo Garantidor de Habitação Popular (FGHAB), na qualidade de ente integrante da estrutura do Sistema Financeiro da Habitação e instrumento de política pública habitacional, é administrado e representado em juízo, ativa e passivamente, pela Caixa Econômica Federal, nos termos de sua regulamentação legal e contratual.
No âmbito dos financiamentos habitacionais do Sistema Financeiro da Habitação, regulados pelo artigo 79 da Lei nº 11.977/2009, é obrigatória a contratação de cobertura mínima para morte, invalidez permanente do mutuário e danos ao imóvel.
Assim, a negativa de cobertura, quando o evento danoso se enquadra nos riscos contratualmente previstos, representa violação ao dever legal e contratual de garantir a efetividade da proteção securitária, especialmente em contexto de relevante função social da moradia.
Ademais, em se tratando de contrato acessório e obrigatório à política habitacional federal, a recusa infundada por parte da seguradora também pode comprometer a estabilidade financeira e jurídica do mutuário hipossuficiente, gerando violação a direitos fundamentais, como o direito à moradia digna, previsto no art. 6º da Constituição Federal.
In casu, o contrato firmado entre a falecida e o Banco do Brasil no âmbito do PMCMV prevê, expressamente, a cobertura do saldo devedor em caso de falecimento do mutuário, obrigação esta atribuída ao FGHAB, conforme cláusulas contratuais 18ª e 19ª (Id 2132292596, p. 18/19).
In verbis: CLÁUSULA DECIMA OITAVA - FUNDO GARANTIDOR DA HABITAÇÃO POPULAR (FGHAB) - Durante a vigência deste CONTRATO é prevista a cobertura pelo Fundo Garantidor da Habitação Popular FGHAB, criado por força da Lei n° 11.977, de 07.07.2009, e tem corno finalidade: (...) II) assumir o saldo devedor do financiamento imobiliário, em caso de morte e invalidez permanente do(s) DEVEDOR(ES) FIDUCIANTE(S), e as despesas de recuperação relativas a danos físicos ao imóvel. (...) CLÁUSULA DECIMA NONA - COBERTURA DO SALDO DEVEDOR E RECUPERAÇÃO DA GARANTIA - O Fundo Garantidor da Habitação Popular - FGHAB prevê cobertura parcial ou total do saldo devedor da operação de financiamento nas seguintes condições: I - morte do(s) DEVEDOR(ES) FIDUCIANTE(S), qualquer que seja a causa; e II - invalidez permanente do(s) DEVEDOR(ES) FIDUCIANTE(S), ocorrida posteriormente à data da contratação da operação, causada por acidente ou doença.
A morte da mutuária está comprovada nos autos (Id 2132292515), bem como a tentativa frustrada de obtenção da cobertura securitária, diante da omissão da parte ré (Id 2132292509).
Não há qualquer elemento que indique que o contrato estava irregular ou que a cobertura tenha sido formalmente negada com base em critérios objetivos.
A recusa injustificada da seguradora ou da administradora do Fundo Garantidor em adimplir a cobertura securitária contratada, especialmente em situações de morte ou invalidez permanente do mutuário, ou de danos físicos ao imóvel, configura inadimplemento contratual com relevantes implicações jurídicas.
Nos termos do artigo 757 do Código Civil, o contrato de seguro obriga o segurador a garantir, mediante recebimento do prêmio, o interesse legítimo do segurado relativo a pessoa ou coisa contra riscos predeterminados.
A ocorrência do sinistro acarreta o dever de indenização por parte da seguradora, dentro dos limites da apólice e das cláusulas contratuais.
No tocante à aplicação do Código de Defesa do Consumidor, verifica-se que a relação entre a parte autora e o FGHAB (CEF) enquadra-se na definição legal de relação de consumo, sendo o fundo parte da cadeia de fornecimento dos serviços financeiros e habitacionais previstos no contrato.
Aplicam-se, portanto, as disposições protetivas do CDC, inclusive no que tange à inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII).
Há que se frisar que a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao contrato de financiamento avençado pelas partes afigura-se induvidosa, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça consolidou sua jurisprudência no sentido de que há incidência dos regramentos de tutela ao consumidor em tema de contratos de financiamento regidos pelo Sistema Financeiro Habitacional – SFH.
Nesse diapasão, confiram-se os seguintes julgados: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
SEGURO HABITACIONAL.
SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO.
INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA.
INCIDÊNCIA DO CDC.
POSSIBILIDADE.
AUSÊNCIA DE PROVAS DE VINCULAÇÃO AO FCVS.
SÚMULA 7 DO STJ.
AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1.
No que toca à adoção das normas do Código de Defesa do Consumidor, a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de serem aplicáveis aos contratos do SFH, desde que não vinculados ao FCVS e posteriores à entrada em vigor da Lei 8.078/90. [...] (AgInt no AgInt no AREsp n. 1.583.574/PE, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24/8/2020, DJe de 26/8/2020.) AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO REVISIONAL.
FINANCIAMENTO HABITACIONAL.
CONTEÚDO NORMATIVO DOS ARTIGOS 20 DO CPC, 23 DA LEI 8.906/94, 39, V, E 51, IV, DO CDC.
AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
APLICAÇÃO DO CDC.
NECESSÁRIA A IDENTIFICAÇÃO, NO CASO CONCRETO, DE ÍNDOLE ABUSIVA DO CONTRATO.
REAJUSTE DO SALDO DEVEDOR.
TAXA REFERENCIAL.
COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL.
REPETIÇÃO SIMPLES DO INDÉBITO.
AGRAVO NÃO PROVIDO. 1.
O conteúdo normativo contido nos artigos 20 do CPC, 23 da Lei 8.906/94, 39, V, e 51, IV, do CDC não foi objeto de debate no Tribunal de origem.
Ausente o prequestionamento, incidem as Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. 2.
No que toca à adoção das normas do Código de Defesa do Consumidor, a jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de serem aplicáveis aos contratos do SFH, desde que não vinculados ao FCVS e posteriores à entrada em vigor da Lei 8.078/90.
Todavia, na hipótese dos autos, tem-se que a análise da relação contratual sob a ótica do CDC não implica alteração das conclusões do acórdão impugnado, haja vista que se faz necessária a identificação, no caso concreto, de índole abusiva no contrato, o que, na espécie dos autos, não ocorre. [...] (AgRg no AREsp n. 573.065/RS, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 1/10/2015, DJe de 21/10/2015.) Desse modo, a documentação anexada aos autos comprova a ocorrência do sinistro e a ausência de resposta ou diligência eficaz por parte do fundo demandado.
Assim, resta configurado inadimplemento contratual por omissão da parte ré.
A omissão prolongada da parte ré, especialmente diante da dor e do estado de vulnerabilidade dos herdeiros e da inventariante, impediu a regular tramitação do inventário e a alienação do imóvel.
Tal circunstância gerou sofrimento que ultrapassa os limites do mero aborrecimento, caracterizando violação à dignidade e à estabilidade emocional da família.
Fica, portanto, reconhecida a ocorrência de dano moral indenizável.
Na quantificação desse danos, deve o julgador ter bem presentes as circunstâncias específicas do caso concreto e buscar arbitrar quantia que não se revele nem exagerada - para que não descambe para o enriquecimento sem causa -, nem irrisória - a ponto de não compensar os sofrimentos e o abalo psíquico sofridos pela vítima.
Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, pois, são os conselheiros fieis do magistrado nessa difícil apreciação.
Para além disso, ainda que de forma secundária, o efeito pedagógico da condenação (exemplary damages) merece ser levado em consideração, sob pena de a violação do direito ser tido como algo corriqueiro ou, em certos casos, até mesmo economicamente vantajoso. À luz das especificidades do caso concreto, considerando o longo tempo decorrido desde o óbito e ante as frustradas tentativas de solução na via administrativa, com todos os entraves que isso implicou ao trâmite do inventário e alienação do imóvel, fixo o valor da indenização dos danos morais suportados pela parte autora em R$ 10.000,00 (dez mil reais), por entender que menos do que isso não traria a compensação que é a função elementar desse tipo de condenação.
Esse o quadro, julgo procedente o pedido formulado na petição inicial, com fundamento no art. 487, I, do CPC, para: 1.
Declarar a obrigação do Fundo Garantidor da Habitação Popular (FGHAB) de promover a quitação integral do saldo devedor do contrato de financiamento habitacional nº 359.803.699, firmado em 11/04/2014, com base no falecimento da mutuária NAZARE ALVES DOS SANTOS, ocorrido em 05/01/2020; 2.
Condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária pelo IPCA, a partir da data desta sentença (Súm. 362 do STJ e art. 389, parágrafo único, do CC), e juros de mora equivalentes à taxa SELIC, deduzido o IPCA (art. 406, § 1º, do CC), desde a citação (por se tratar de inadimplemento contratual).
Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do CPC.
Defiro os benefícios da assistência judiciária gratuita à parte autora.
Publicada e registrada eletronicamente.
Intimem-se.
Anápolis/GO, data em que assinada digitalmente.
GABRIEL BRUM TEIXEIRA Juiz Federal -
13/06/2024 20:57
Recebido pelo Distribuidor
-
13/06/2024 20:57
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
-
13/06/2024 20:57
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
13/06/2024
Ultima Atualização
27/08/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Despacho • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Sentença Tipo A • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Despacho • Arquivo
Documento Comprobatório • Arquivo
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