TRF1 - 0002999-32.2013.4.01.3903
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. 11 - Des. Fed. Marcos Augusto de Sousa
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Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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30/05/2025 00:00
Intimação
JUSTIÇA FEDERAL Tribunal Regional Federal da 1ª Região PROCESSO: 0002999-32.2013.4.01.3903 PROCESSO REFERÊNCIA: 0002999-32.2013.4.01.3903 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) POLO ATIVO: IVO VALENTIM MULLER e outros REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: CLIVIA BARARUA SOLANO - PA21862-A, RAIMUNDO ROBSON FERREIRA - PA13478-A e FRANCISCO ANTONIO TEIXEIRA SANTOS - PA7789-A POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA e outros REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CLIVIA BARARUA SOLANO - PA21862-A, FRANCISCO ANTONIO TEIXEIRA SANTOS - PA7789-A, RAIMUNDO ROBSON FERREIRA - PA13478-A, JULIANA CASTRO BECHARA - PA14082-A, CAROLINA DE MENDONCA GUEIROS - PA014476, JOANAINA DE PAIVA RODRIGUES - PA17967-A, DIEGO CELSO CORREA LIMA - PA23753-A e JACOB KENNEDY MAUES GONCALVES - PA18476-A RELATOR(A):MARCOS AUGUSTO DE SOUSA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002999-32.2013.4.01.3903 RELATÓRIO O EXMO.
SR.
DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Relator: Trata-se de apelações interpostas por Ivo Valentim Muller e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária em face da sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Altamira/PA, que, nos autos da ação civil pública por improbidade administrativa, julgou parcialmente procedente o pedido para condenar o réu ao ressarcimento do dano ao erário no valor de R$ 740.659,56 (setecentos e quarenta mil, seiscentos e cinquenta e nove reais e cinquenta e seis centavos), corrigido monetariamente pelo INPC e acrescido de 1% (um por cento) ao mês de juros de mora, a partir da citação; ao pagamento de multa civil no valor de uma vez o valor do dano, atualizado a partir da citação, conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal, a ser revertida ao Fundo Especial de Defesa de Direitos Difusos (art. 13 da Lei 7.347/1985); à suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos; à "proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 (três) anos"; e ao pagamento de custas processuais, afastando,
por outro lado, a condenação em honorários advocatícios (ID. 82048686, fls. 112/123).
Sustenta o apelante Ivo Valentim Muller o cumprimento total do Convênio 764.124/2011, tendo oficiado o INCRA reiteradamente para a realização de vistoria após a conclusão das obras, em 2012, o que não foi atendido, pois temia que as fortes chuvas do período estragassem todo o serviço realizado.
Alega que o INCRA realizou a vistoria das obras apenas em fevereiro de 2013, quando as chuvas torrenciais e o uso contínuo da estrada já haviam operado o estrago nas obras concluídas.
Argumenta a inexistência de ato de improbidade, ante a ausência de dolo, má-fé ou violação aos princípios constitucionais, afirmando que todo e qualquer recurso foi repassado ao ente municipal à época da gestão anterior, o que denota a necessidade de reforma da sentença, com a consequente revogação da determinação de indisponibilidade de seus bens (ID. 82048686, fls. 170/186).
O INCRA, por sua vez, sustenta em suas razões de apelação que o valor arbitrado em desfavor do réu a título de multa civil deve ser revertido à autarquia apelante, nos termos do art. 18 da Lei 8.429/1992, e não ao Fundo de Direitos Difusos, como determinado pelo Juízo na sentença (ID. 82048686, fls. 201/203).
Com contrarrazões do INCRA (ID. 82048686, fls. 196/200) e sem contrarrazões do réu (ID. 82048686, fl. 209).
O Ministério Público Federal (PRR1) opina pela manutenção da sentença (ID. 111985055). É o relatório.
Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002999-32.2013.4.01.3903 VOTO O EXMO.
SR.
DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA, Relator: Consta da petição inicial, em síntese, que o apelante Ivo Valentim Muller, na qualidade de Prefeito do Município de Medicilândia/PA, deixou de prestar contas dos recursos recebidos do Ministério do Desenvolvimento Agrário, por intermédio do INCRA, relativos ao Convênio 764.124/2011, no valor de R$ 918.165,43 (novecentos e dezoito mil, cento e sessenta e cinco reais e quarenta e três centavos), destinados à complementação/recuperação de 150,70 km de estradas vicinais de acesso e no interior dos PA Surubim, localizado no referido município, tendo sido apuradas, ainda, diversas irregularidades na execução das obras, com emprego apenas de 19,33% (dezenove vírgula trinta trinta e três por cento) dos recursos orçamentários recebidos (R$ 177.505,57).
A sentença que julgou procedente a ação de improbidade está assim fundamentada: (...) Na presente hipótese, o ex-prefeito do Município de Medicilândia/PA celebrou o Convênio n° 764124/2011, que resultou no Termo de Compromisso n° 003/2012/INCRA/UA/ALTAMIRA, assinado em 26/01/2012 (fls. 87/99), onde recebeu o repasse no valor de R$ 918.165,43 (novecentos e dezoito mil cento e sessenta e cinco reais e quarenta e três centavos), por intermédio do INCRA e em contrapartida, a Prefeitura Municipal de Medicilândia com o valor de R$ 18.738,07 (dezoito mil setecentos e trinta e oito reais e sete centavos), para implantação e recuperação de infraestrutura básica em projetos de assentamentos no município de Medicilândia.
Com relação aos repasses realizados, restou evidenciado que o município não prestou corretamente as contas, consoante demonstrado pelas provas juntadas aos autos, em especial, o relatório de Tomada de Contas Especial (279/287), instaurado através do INCRA, o que se conclui também que o objeto do convênio não foi executado na forma proposta, apontando diversas irregularidades na prestação de contas e na execução do convênio, consoante termo de aceite (fl. 20) e relatório de vistoria (fls. 21/24).
Nessa toada, o item 1H do relatório de tomada de contas afirma que: "5.
O motivo para a instauração da presente Tomada de Contas Especial foi em decorrência de que o Município omitiu-se do dever de prestar contas e não concluiu o objeto pactuado e desta forma infringiu/violou o Termo de Compromisso firmado entre as partes, decorrente da execução parcial do objeto, fato que se encontra demonstrado na documentação constante do processo, conforme verificado no relatório de fiscalização in loco n° s/n (fls. 49-55) e nas peças técnicas às fls. 56 e 57-60." Além da não prestação de contas, o parecer da área técnica nas fases de fiscalização da execução do objeto, citado no relatório da TCE (fls. 280-v), realizado em 05/02/2013, aponta que foram realizados apenas 19,33% do objeto pactuado, recomendando o ressarcimento na ordem de R$ 740.659,56 (setecentos e quarenta mil seiscentos e cinquenta e nove reais e cinquenta e seis centavos), valor da parte não executada, de todo o recurso repassado para a Prefeitura de Medicilândia.
Nessa linha, depreende-se dos autos que o requerido alega que prestou as contas e que o objeto do convênio fora devidamente concluído, porém como revelado no relatório a prestação foi irregular, uma vez que os documentos apresentados posteriormente foram aprovados em parte, justificando apenas o valor gasto de R$ 177.505,87 (fl. 282-v), considerando que somente fora executado o percentual de 19,33% do objeto pactuado.
Além disso, mesmo após a constatação das irregularidades, não fora providenciada, pelo requerido, a continuidade das obras.
Embora declarado revel no processo, o requerido, em defesa preliminar, alegou que o termo de compromisso havia sido totalmente executado e que logo em seguida ao término das obras requereu a presença da vistoria para realizar o aceite da obra (fl. 221 e 223 - novembro/2012), entretanto, a equipe de vistoria do INCRA somente realizou o relatório/medição final no mês de março/2013, defende que devido as chuvas regionais, houve um deterioramento da obra executada, afirmando que foram chuvas fortes, havendo, inclusive, o decreto de estado de emergência pelo prefeito à época (fl. 239/240).
De fato, verifica-se que as chuvas se deram de forma mais intensificada após a realização das obras, entretanto, o relatório de vistoria (fls. 21/24) aponta que um pouco mais de 80% da obra não havia sido sequer realizada, logo, as chuvas ocorridas na ocasião não possuem influência sobre parte da obra não concluída.
Quanto aos 19,33% realizados pela Prefeitura à época, verifica-se que foram aceitas e o valor proporcionalmente gasto foi aprovado, conforme se verifica da análise do relatório da TCE.
Registre-se que a documentação juntada pelo requerido em defesa preliminar, já foi alvo da análise da TCE e somente justificou o valor de R$ 177.505,87 (fl. 2825-v).
Além disso, maior parte da documentação juntada, se refere a pagamentos de combustível, o que não se coaduna com o convênio realizado junto ao INCRA.
Não obstante, quanto a alegação de que fez pedido de realização da vistoria nas obras, não ilide sua responsabilidade em prestar contas, até mesmo porque a vistoria foi realizada em janeiro e fevereiro/2013 (fls. 20 e 21/24).
Diferentemente do que alega o réu, não há qualquer comprovação do envio de toda a documentação para apresentação de contas por parte do prefeito sucessor, o que consta nos autos é tão somente ofício encaminhando apenas o Termo de Compromisso n° 003/2012, o que é insuficiente para prestar contas, não deixando de se eximir de sua responsabilidade como gestor à época.
Outrossim, a documentação encaminhada ao INCRA não se equivale à prestação de contas (fl. 223), visto que se referia a documentos para realização de vistoria in loco, ademais, a prestação de contas somente ocorre após o término da vigência do Termo de Compromisso, pelo prazo de 60 (sessenta) dias, conforme cláusula décima segunda do termo (fl. 95).
Nada obstante, o ato praticado pelo requerido, qual seja, omissão no dever de prestar contas e não execução total da avença, correspondente a 80, 67% do Termo de Compromisso n° 003/2012, importa em improbidade administrativa, consoante previsão contida no art. 10, da Lei n.° 8.429/92, e o ato praticado pelo requerido importa encontra ressonância com o caput do disposto, do aludido artigo, visto que houve prejuízo ao erário com consequente perda patrimonial e pela ausência de prestação de contas, sendo passível das sanções do art. 12, li, da Lei 8.429/92, porquanto, apesar do regular repasse dos recursos públicos pelo órgão concedente, o requerido não se desincumbiu do mister de prestar contas da aplicação de tais verbas e executar a totalidade do convênio, corroborado pela instauração de tomada de conta especial informada.
Portanto, tendo em vista as provas carreadas aos autos, deve ressarcir o montante da parte não executada, no valor de R$ 740.659,56 (setecentos e quarenta mil seiscentos e cinquenta e nove reais e cinquenta e seis centavos) (valor efetivamente recebido R$ 918.165,43 - valor executado R$ 177.505,87).
Registre-se que, por força do art. 10, § 6° do Dec. 6170/2007, "o convenente ficará obrigado a prestar contas dos recursos recebidos, na forma da legislação aplicável e das diretrizes e normas previstas no art. 18".
Por sua vez, o art. 72 da Portaria 507/2011, que regulamentou o citado artigo 18, prevê o prazo de até 60 (sessenta) dias após o encerramento da vigência ou a conclusão da execução do objeto, o que ocorrer primeiro, para a prestação de contas, cuja ausência implica em abertura de tomada de contas especial, como de fato ocorreu no presente caso.
O ato omissivo na prestação de contas e as irregularidades constadas na execução do convênio são condutas ímprobas, violadora que é dos princípios da legalidade, da moralidade e da publicidade, consoante previsão contida nos arts. 10 e 11, inciso VI, da Lei n.2 8.429/92.
Ademais, tal omissão atenta contra os princípios basilares da Administração Pública previstos no art. 37 da Constituição Federal, sobretudo porque retira da Administração Pública em sentido amplo e dos cidadãos a possibilidade de aferir a destinação dada aos recursos públicos, bem como se estes atingiram a sua finalidade.
O dolo do agente, consubstanciado em não prestar contas e não executar na sua totalidade o termo de compromisso, decorre não só da ausência de justificativa para não ter executado a obra objeto do convênio, e apresentado a aludida prestação de contas na forma legal, como também de sua reiterada inércia quando expressamente convocado a fazê-lo.
Nesse passo, além de mera irregularidade formal, os fatos geraram restrições cadastrais ao município, dificultando seu acesso a linhas de crédito, convênios e outras repasses e obrigando-o a adotar diversas medidas buscando sua regularização.
Desta forma, conclui-se que não se está diante de simples negligência na prestação de contas e falta de execução do convênio, mas na vontade livre e consciente de não executar a obra e prestar as contas da forma devida.
Por tal motivo, constatada ato de improbidade administrativa, caracterizado o enquadramento na figura descrita no art. 10 e 11, inciso VI, da Lei n.° 8.429/92.
A alegada ausência de ato de improbidade por parte do requerido, sob o argumento de que o convênio teve termo final e data limite para prestação de contas no mandato de seu sucessor e que por não haver a prestação de contas era de responsabilidade do atual prefeito fazê-lo, embasando-se na Súmula 230 do TCU, não se sustenta.
A Súmula 230 do TCU afirma que: "Compete ao prefeito sucessor apresentar as contas referentes aos recursos federais recebidos por seu antecessor, quando este não o tiver feito ou, na impossibilidade de fazê-lo, adotar as medidas legais visando ao resguardo do patrimônio público com a instauração da competente Tomada de Contas Especial, sob pena de co-responsabilidade." Ao prefeito sucessor cabe apresentar quando este (prefeito antecessor) não o tiver feito, entretanto, somente poderá fazê-lo com a existência de documentos suficientes para prestação de contas.
Não pode o requerido querer esquivar-se de sua responsabilidade de prestar contas por um convênio firmado no ano de seu mandato, onde a totalidade dos recursos foram repassadas ainda em 2012 e que não teve continuidade alguma no mandato de seu sucessor na prefeitura de Anapu, tanto é, que após o relatório de vistoria não há nenhuma informação de que as obras foram concluídas ou que houve algum tipo de progressão.
Seguindo, verifico que o requerido enviou ao seu sucessor tão somente cópia do Termo de Compromisso firmado junto ao INCRA (f1.242), não sendo tão documentação suficiente para a prestação de contas.
Portanto, é de se constatar que o prefeito sucessor adotou as medidas legais visando o resguardo do patrimônio público, na impossibilidade de prestar contas de recursos federais recebidos por seu antecessor, conforme registrado na Tomada de Contas Especial (fl. 282).
No mais, como restou provado a conduta do requerido não só violou o art. 11, VI da LIA, mas também o art. 10, caput, visto que ao não executar o projeto na forma do convênio causou lesão ao erário, consubstanciado na execução parcial do objeto do termo de compromisso firmado.
Corrobora ainda o dolo na lesão ao erário, o fato de o próprio requerido afirmar, em defesa preliminar, que do convênio celebrado restou o valor de R$ 15.000,00, entretanto, não houve qualquer comprovação da devolução dos valores não gastos.
Analisando a questão, verifico que a presente ação foi proposta ainda sob a redação original da Lei 8.429/1992, antes das alterações introduzidas pela Lei 14.230/2021, podendo esta ser aplicada às hipóteses anteriores à sua vigência, em circunstâncias específicas, respeitadas as balizas estabelecidas pelo STF no julgamento do ARE 843.989/PR, com repercussão geral (Tema 1.199).
O STF, no mencionado julgamento, fixou, dentre outras, as seguintes teses após exame da Lei 14.230/2021: 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; (...).
Do que se extrai, pois, do entendimento fixado pelo STF, pode-se concluir, primeiramente, que a nova lei exige que o elemento subjetivo “dolo” seja demonstrado nos tipos legais descritos nos arts. 9º, 10 e 11.
Segundo, que a lei nova revogou a ação de improbidade na modalidade culposa trazida no antigo artigo 10 (dano ao erário - único que até então admitia a condenação também por culpa), em caráter irretroativo.
No entanto, essa revogação não alcançará ações, iniciadas sob a égide da Lei 8.429/1992, que tiverem transitado em julgado.
Cabe destacar, por oportuno, que o STF nada dispôs sobre a questão alusiva à revogação de alguns tipos da anterior Lei 8.429/1992, nem quanto às alterações introduzidas pela nova lei em certos tipos legais, até porque não era objeto do RE 843.989/PR.
Não obstante, pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações ainda em curso, a exemplo do quanto admitido para aquelas originadas por atos de improbidade culposos.
O STJ, por sua vez, entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso.
Precedente: REsp 2.107.601/MG, 1ª Turma, Rel.
Min.
Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024.
Destaque-se, ainda, que o artigo 1º, § 4º, da nova lei expressamente estabelece a aplicação ao sistema da improbidade dos princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, os quais incidem retroativamente em benefício da parte ré.
O apelante Ivo Valentim Muller foi condenado pela prática de atos capitulados nos arts. 10, caput, e 11, VI, da Lei 8.429/1992, antes das alterações levadas a efeito pela Lei 14.230/2021, que se encontrava expresso nos seguintes termos: Art. 10.
Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (...) Art. 11.
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: (...) VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo; (...) Com a redação dada pela nova lei, os dispositivos ficaram assim redigidos: Art. 10.
Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (...) Art. 11.
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (...) VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo, desde que disponha das condições para isso, com vistas a ocultar irregularidades; (...) No tocante à ausência de prestação de contas, consigo que apenas restará configurado o ato de improbidade se o responsável detinha todas as condições necessárias para efetivá-las, mas não o fez conscientemente, buscando a ocultação de possíveis irregularidades.
Assim, foi conferido tratamento mais rigoroso ao afastar o dolo genérico antes admitido pela Lei 8.492/1992, exigindo o dolo específico para a configuração do ato ímprobo Analisando detidamente os autos, verifico que o prazo final para a prestação das contas dos recursos recebidos deu-se em 25/03/2013, após o término do mandato do apelante, sendo de responsabilidade do seu sucessor prestá-las, nos termos da Súmula 230 do TCU.
Ainda que a responsabilidade do sucessor não exima o ex-prefeito de sua responsabilidade, para configurar ato ímprobo é necessária a inequívoca demonstração de que ele tenha impossibilitado a prestação das contas, não bastando a mera alegação neste sentido.
Neste sentido são os precedentes desta Corte.
Cito: ADMINISTRATIVO.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
ART. 11, VI, DA LEI 8.429/92 NA REDAÇÃO ANTERIOR À LEI 14.230/2021.
EX-PREFEITO.
MUNICÍPIO DE TABATINGA/AM.
RECURSOS FEDERAIS.
MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL.
AÇÃO EMERGENCIAL ATENDIMENTO FAMÍLIAS ATINGIDAS POR ENCHENTES.
ANO 2012.
OMISSÃO NA PRESTAÇÃO DE CONTAS.
DOLO ESPECÍFICO DE OCULTAR IRREGULARIDADES NÃO EVIDENCIADO.
PRAZO ENCERRADO NO MANDATO DO PREFEITO SUCESSOR.
SÚMULA 230 DO TCU.
ATO DE IMPROBIDADE NÃO CONFIGURADO.
REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA E APELAÇÃO DO MPF DESPROVIDA. (...) 4 .
Para a configuração do ato de improbidade previsto no art. 11, VI, da Lei 8.429, com a redação dada pela Lei 14.230/2021, não basta a conduta de deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo (como constava no inciso VI da Lei 8.429/92, na redação anterior à Lei 14.230/2021), exigindo o novo dispositivo de Lei que aquele que esteja obrigado à prestação de contas, além de dispor das condições de prestá-la, não a preste com vistas a ocultar irregularidades, ou seja, o dolo exigido para a configuração do ato de improbidade administrativa, previsto no art. 11, VI, da LIA, passou a ser o dolo específico, o que afasta a aplicação apenas do dolo genérico como vinha entendendo a jurisprudência pátria. 5.
Ainda que se cogite ser da responsabilidade do ex-Prefeito a prestação das contas relacionadas ao Termo de Compromisso em voga, a omissão apontada evidencia uma irregularidade formal e não ato de improbidade, pois, pelo Inquérito Civil carreado aos autos, infactível ultimar que a conduta do réu tenha sido com o fim de ocultar alguma irregularidade, uma vez que a verba foi empregada na finalidade pública, ou seja, se destinou à assistência das famílias atingidas pelas enchentes. 6.
A improbidade administrativa é uma espécie de moralidade qualificada pelo elemento desonestidade, que pressupõe a conduta intencional, dolosa, a má-fé do agente ímprobo.
A má-fé, caracterizada pelo dolo, é que deve ser apenada.
Não se podem confundir meras faltas administrativas com as graves faltas funcionais de improbidade, sujeitas às sanções da Lei n. 8.429/92.
Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ilícito ou irregularidade constitui-se em ato de improbidade. 7.
A Súmula 230 do TCU, embora não tenha o condão de eximir o prefeito antecessor do dever de prestação de contas, visando à proteção do interesse público, atribui ao prefeito sucessor essa responsabilidade quando o antecessor não a tiver feito e o prazo para adimplemento da obrigação vencer ou tiver vencido no período de gestão do próprio mandatário sucessor, não a impondo, no entanto, sem critérios, pois na impossibilidade de realizá-la, para exonerá-lo dessa responsabilidade, deve adotar as medidas legais visando ao resguardo do patrimônio público. 8.
No caso, considerando que o prazo da prestação de contas encerrou-se no dia 15/08/2013, no curso do mandato do sucessor da ré na gestão do município, cabia ao sucessor a responsabilidade pela sua apresentação, haja vista que assumiu a gestão do município em 01/01/2013.
Isto porque, conforme bem destacou a sentença, a alegação genérica de que o réu não teria deixado documentação hábil para que o prefeito subsequente efetivasse a devida prestação de contas, na exata medida em que carece de substrato probatório, é insuficiente ao afastamento da responsabilidade do sucessor do mandato. 9.
Não evidenciado o elemento condicionante da conduta tipificada pela norma descrita no art. 11, inciso VI, da Lei n. 8.429/92 (alterado pela Lei n. 14.230/2021), consubstanciado no dolo específico de ocultar irregularidades, não há espaço, no caso, para condenação. 10.
Remessa necessária não conhecida (item 1) e apelação do MPF desprovida. (AC 0000764-25.2017.4.01.3201, Quarta Turma, Rel.
Des.
Fed.
Cesar Jatahy, DJe 23/11/2023.) ADMINISTRATIVO.
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
ART. 11, VI, DA LIA.
OMISSÃO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS.
PRAZO ENCERRADO DURANTE O MANDATO DO PREFEITO SUCESSOR.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 230 DO TCU.
INOVAÇÕES DA LEI Nº 14.230/2021.
RETROATIVIDADE BENÉFICA.
DOLO ESPECÍFICO NÃO EVIDENCIADO.
AUSÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DA EXISTÊNCIA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO NÃO PROVIDO. 1.
Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa que imputa aos Requeridos a prática de ato que viola princípios administrativos, tipificado no art. 11, inciso VI, da Lei nº 8.429/92. 2.
Considerando a ausência de comprovação do especial fim de agir na conduta imputada ao Requerido, conforme exige a nova redação do inciso VI do art. 11 da LIA, a sentença julgou improcedente a ação, porque reconheceu que não há conduta passível de enquadramento na nova redação do art. 11, VI da LIA. 3.
A Lei nº 8.429/92, após a reforma promovida pela Lei nº 14.230/2021, que inseriu o § 1º ao art. 1º, exige a presença do elemento subjetivo dolo para a configuração dos atos de improbidade administrativa tipificados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei.
Ademais, § 2º do art. 1º e o § 1º do art. 11, ambos da Lei nº 8.429/92, exigem o especial fim de agir. 4.
Como resultado da incidência dos princípios do direito administrativo sancionador no sistema de improbidade administrativa disciplinado pela Lei nº 8.429/92, para situações que ainda não foram definitivamente julgadas, as novas disposições que tenham alterado os tipos legais que definem condutas ímprobas devem ser aplicadas de imediato, caso beneficiem o réu. 5.
No caso, competia à Prefeita sucessora apresentar a prestação de contas referente aos recursos federais recebidos por seu antecessor, ou, na impossibilidade de fazê-lo, adotar as medidas legais visando ao resguardo do patrimônio público, conforme Súmula nº 230 do TCU.
Precedentes desta Corte. 6.
Não há que se falar em ato de improbidade administrativa imputado ao Requerido, porque cabia precipuamente à Prefeita sucessora apresentar a prestação de contas dos recursos objeto da lide. 7.
Sentença mantida.
Recurso não provido. (AC 0001731-88.2014.4.01.3908, Décima Turma, Rel.
Des.
Fed.
Marcus Vinicius Reis Bastos, DJe 10/09/2024.) Na espécie, as provas apontadas nos autos não são suficientes para indicar que o réu impossibilitou a prestação das contas, não deixando a documentação necessária para que seu sucessor pudesse cumprir com o encargo, com vistas a ocultar irregularidade, o que revelariam o “dolo específico” exigido na conduta do agente, de modo a fundamentar uma sentença condenatória pelo cometimento de ato de improbidade.
Nesse sentido é o entendimento desta Corte: AC 0005653-10.2013.4.01.3703, Terceira Turma, Rel.
Des.
Fed.
Wilson Alves de Souza, PJe 24/07/2024; e AC 1002217-95.2019.4.01.4000, Décima Turma, Rel.
Des.
Fed.
Marcus Vinicius Reis Bastos, PJe 24/07/2024.
De igual modo, não restou comprovada a atuação dolosa do réu na prática dos delitos capitulados no caput do art. 10 da Lei .8429/1992.
Isso porque o réu logrou carrear aos autos diversos documentos que apontam para a correta destinação dos recursos recebidos do convênio em debate, tais como notas fiscais, recibos, notas de empenhos, etc (ID. 82048685, fls. 113/212), com a comprovação, inclusive, de saldo positivo da conta do município ao término de seu mandato, no montante de R$ 14.590,90 (quatorze mil, quinhentos e noventa reais e noventa centavos).
Ademais, não se pode afastar a hipótese de efetivo dano às obras realizadas em razão das fortes chuvas que assolaram a região no período de conclusão das estradas, o que levou, inclusive, à decretação de situação de emergência no Município de Medicilândia (ID. 82048686, fl. 39). À vista disso, concluo que, embora não tenha sido executado o convênio de acordo com o plano de trabalho aprovado, sobretudo em razão da conclusão parcial das obras, não resta indene de dúvidas o intuito de lesar o erário.
Do que se extraí das provas e da sentença do Juízo a quo, o fato decorreu da conduta culposa do gestor.
Conforme mencionado, a nova redação da Lei de Improbidade exige a atuação do agente com dolo específico de causar dano ao erário, o que não restou comprovado no caso.
Ademais, é de conhecimento geral que o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa visa proteger a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de garantir a integridade do patrimônio público e social, nos termos da lei.
A jurisprudência também é firme no sentido de que a improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé.
A propósito: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
DISPENSA DE LICITAÇÃO.
PROGRAMA DE ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA.
SUPERFATURAMENTO NÃO EVIDENCIADO.
PROGRAMA PAB FIXO.
APLICAÇÃO DE RECURSOS EM PROCEDIMENTOS DE MÉDIA E ALTA COMPLEXIDADE.
IRREGULARIDADE.
NÃO COMPROVAÇÃO DE DANO AO ERÁRIO.
DOLO NÃO DEMONSTRADO.
PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO AFASTADA.
PROVIMENTO DAS APELAÇÕES.
SENTENÇA REFORMADA.
IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. 1.
A ação foi proposta pelo Ministério Público Federal em face dos apelantes (ex-prefeito de Araguaiana/MT e particular), em razão de suposta dispensa indevida de licitação para a aquisição de medicamentos (Programa de Assistência Farmacêutica), com indicativo de superfaturamento de preços; e em face apenas do ex-prefeito, por desvio de finalidade na aplicação dos recursos da Atenção Básica (Programa PAB Fixo), utilizados em procedimentos de média e alta complexidades. 2.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando ambos os apelantes nas seguintes sanções (art. 12, II, da lei n. 8.429/92): (i) ressarcimento ao erário, no valor de R$ 20.857,57, relativo ao Programa de Assistência Farmacêutica, a ser corrigido; (ii) suspensão dos direitos políticos, pelo prazo de 5 (cinco) anos; e (iii) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos.
Aplicou, ainda, ao ex-prefeito as sanções de ressarcimento do valor de R$ 71.127,59, relativo ao Programa PAB Fixo, a ser corrigido; e pagamento de multa civil no valor de 3 (três) remunerações do cargo de prefeito, relativo à época dos fatos. (…) 5.
O art. 10, caput, da Lei n. 8.429/92, com a redação dada pela Lei n. 14.230/21, estabelece que "Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei: [...]", referindo-se em seu inciso VIII à conduta de "frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva". 6.
A despeito da impropriedade apontada pela CGU - dispensa de licitação para aquisição de medicamentos em único estabelecimento farmacêutico no município -, o fato é que a frustração à licitação, presente no inciso VIII do art. 10 da Lei n. 8.429/92, está atrelada à existência de conduta dolosa, apta a ensejar perda patrimonial efetiva, não se configurando com ilações ou eventuais inconformidades formais no procedimento licitatório. 7.
Não há nos autos demonstração de inexecução do objeto do Programa, ou de danos efetivos aos cofres públicos.
Os fatos expressam meras desconformidades formais licitatórias, sem propósitos malsãos, o que configura uma atipicidade administrativa que não teve, nas circunstâncias do caso, o condão de assumir o qualificativo de ato de improbidade administrativa, que pressupõe má-fé e desonestidade do agente no trato da coisa pública, o que não ficou comprovado. 8.
O fato de terem sido apurados, pela CGU, em relação a alguns itens confrontados, valores menores do que os praticados pela farmácia contratada, não comprova ipso facto a existência de superfaturamento: não há evidências de fraude na coleta de preços, mediante combinação e/ou ajuste entre os demandados, com o dolo de causar enriquecimento ilícito, desvio de verbas ou perda patrimonial efetiva. 9.
Ao autor competia, em prova pericial, demonstrar que os preços oficiais, nos quais se baseou a Controladoria, deveriam ser amplamente utilizados e, ainda, que os valores orçados pelo estabelecimento farmacêutico teriam sido inadequados ou incompatíveis com os preços praticados no mercado (levando-se em conta o fato de o município estar localizado fora da região metropolitana). 10.
No que diz com a imputação de conduta ímproba ao ex-prefeito em razão da aplicação das verbas do Programa de Atendimento Básico - PAB em despesas não elegíveis (serviços de média e alta complexidade), embora o fato seja indicativo de irregularidade formal, não comprova a existência de improbidade, à míngua de demonstração de dano.
Não obstante a impropriedade vê-se que restou mantida a destinação pública de tais recursos, uma vez que aplicados em benefício da população. 11.
A ausência de registro do nome dos pacientes e dos exames efetuados nas notas fiscais expedidas e nos respectivos empenhos afeiçoa-se à mera irregularidade, que não se eleva à categoria de atos de improbidade administrativa, mormente porque não evidenciada a prática de conduta dolosa. 12.
Não se pode confundir meras faltas administrativas com as graves faltas sujeitas às severas sanções da Lei n. 8.429/92, aplicadas apenas quando a atuação do administrador destoe nitidamente dos princípios que regem a Administração Pública, em especial, a legalidade e a moralidade, transgredindo os deveres de retidão e lealdade ao interesse público.
Todo ato ímprobo é um ato ilícito, irregular, mas nem todo ato ilícito ou irregular constitui ato de improbidade. 13.
Os relatórios da CGU têm muita importância como início de prova, para dar base à propositura da ação, mas, documentos unilaterais elaborados sem os auspícios do contraditório, por si só, não são aptos (em princípio) a conduzir a uma condenação por atos de improbidade, devendo, mesmo como peças administrativas revestidas de presunção juris tantum de legitimidade, receber o apoio de outros meios de prova, que não foram produzidos. 14.
Tal como ocorre na ação penal, onde a insuficiência de provas leva à absolvição (art. 386, VII - CPP), o mesmo deve suceder na ação de improbidade administrativa, dado o estigma das pesadas sanções previstas na Lei n. 8.429/92, econômicas e políticas, e até mesmo pela dialética do ônus da prova. 15.
Preliminar de prescrição afastada.
Apelações providas.
Sentença reformada.
Improcedência (in totum) da ação. (AC 0027450-02.2009.4.01.3600, TRF1, Quarta Turma, Rel.
Des.
Fed.
Olindo Menezes, e-DJF1 20/04/2023.) Sendo assim, não comprovado o dolo específico do réu na prática da conduta, deve ser afastada sua condenação pela prática dos ato ímprobos a ele imputados.
Em consequência, resta prejudicada a análise da apelação do INCRA, interposta apenas para reverter o valor da multa civil em favor da autarquia apelante.
Ante o exposto, dou provimento à apelação do réu, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido, e julgo prejudicada a apelação do INCRA. É o voto.
Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO GAB. 11 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Processo Judicial Eletrônico APELAÇÃO CÍVEL (198) 0002999-32.2013.4.01.3903 APELANTE: IVO VALENTIM MULLER, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA Advogados do(a) APELANTE: CLIVIA BARARUA SOLANO - PA21862-A, FRANCISCO ANTONIO TEIXEIRA SANTOS - PA7789-A, RAIMUNDO ROBSON FERREIRA - PA13478-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA, IVO VALENTIM MULLER TERCEIRO INTERESSADO: MUNICIPIO DE MEDICILANDIA Advogados do(a) APELADO: CLIVIA BARARUA SOLANO - PA21862-A, FRANCISCO ANTONIO TEIXEIRA SANTOS - PA7789-A, RAIMUNDO ROBSON FERREIRA - PA13478-A Advogados do(a) TERCEIRO INTERESSADO: CAROLINA DE MENDONCA GUEIROS - PA014476, DIEGO CELSO CORREA LIMA - PA23753-A, JOANAINA DE PAIVA RODRIGUES - PA17967-A, JULIANA CASTRO BECHARA - PA14082-A EMENTA ADMINISTRATIVO.
PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
ALTERAÇÕES NA LEI 8.429/1992 PELA LEI 14.230/2021.
RETROATIVIDADE.
POSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO.
STF, ARE 843.989/PR.
TEMA 1.199.
ART. 11, VI, DA LIA.
AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS.
DOLO ESPECÍFICO NÃO COMPROVADO.
ART. 10, CAPUT, DA LIA.
AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO.
CONCLUSÃO PARCIAL DAS OBRAS.
INABILIDADE DO AGENTE PÚBLICO.
SENTENÇA REFORMADA.
APELAÇÃO DO RÉU PROVIDA.
APELAÇÃO DO INCRA PREJUDICADA. 1.
O STF, no julgamento do RE 843.989/PR (Tema 1.199), por unanimidade, fixou tese no sentido de que: “1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10, 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente (...)”. 2.
Pode-se inferir, numa interpretação lógico-sistemática, ser possível a aplicação do princípio da retroatividade da lei mais benéfica ao réu, previsto no art. 5º, XL, da CF, aos casos em que houve revogação ou modificação de tipos legais, para as ações de improbidade administrativa ainda em curso. 3.
Ademais, o STJ entendeu recentemente ser possível a aplicação da Lei 14.230/2021, com relação à exigência do dolo específico para a configuração do ato ímprobo, aos processos em curso.
Precedente: REsp 2.107.601/MG, Primeira Turma, Rel.
Min.
Gurgel de Faria, DJe 02/05/2024. 4.
De acordo com a nova redação do art. 11, VI, da LIA, apenas restará configurado o ato de improbidade por ausência de prestação de contas se o responsável detinha todas as condições necessárias para efetivá-las, mas não o fez conscientemente, buscando a ocultação de possíveis irregularidades.
Assim, não basta mais apenas o dolo genérico antes admitido pela Lei 8.492/1992, exigindo-se o dolo específico para a configuração do ato ímprobo. 5.
No caso concreto, o prazo final para a prestação das contas dos recursos recebidos deu-se após o término do mandato do apelante, sendo de responsabilidade do seu sucessor prestá-las, nos termos da Súmula 230 do TCU.
Ademais, ainda que a responsabilidade do sucessor não exima o ex-prefeito de sua responsabilidade, para configurar ato ímprobo é necessária a inequívoca demonstração de que ele tenha impossibilitado a prestação das contas, não bastando a mera alegação neste sentido, o que não ocorreu na espécie.
Precedentes. 6.
No tocante à conduta descrita no caput do art. 10 da LIA, não restou comprovada a atuação dolosa do réu, haja vista a existência nos autos de diversos documentos que apontam para a correta destinação dos recursos recebidos do convênio em debate, tais como notas fiscais, recibos, notas de empenhos, etc, com a comprovação, inclusive, de saldo positivo na conta corrente do município ao término de seu mandato, não restando indene de dúvidas o intuito de lesar o erário, embora o referido convênio não tenha sido executado de acordo com o plano de trabalho aprovado, sobretudo em razão da conclusão parcial das obras. 7.
A jurisprudência é firme no sentido de que a improbidade administrativa não se confunde com a mera ilegalidade do ato ou a inabilidade do agente público que o pratica, porquanto o ato ímprobo, além de ilegal, é pautado pela desonestidade, deslealdade funcional e má-fé.
Precedente. 8.
Em consequência, resta prejudicada a análise da apelação do INCRA, interposta apenas para reverter o valor da multa civil em favor da autarquia apelante. 9.
Apelação do réu provida.
Apelação do INCRA prejudicada.
ACÓRDÃO Decide a Turma, por unanimidade, dar provimento à apelação do réu e julgar prejudicada a apelação do INCRA. 4ª Turma do TRF da 1ª Região - 20/05/2025 (data do julgamento).
Desembargador Federal MARCOS AUGUSTO DE SOUSA Relator -
01/09/2021 15:34
Juntada de petição intercorrente
-
23/04/2021 16:53
Conclusos para decisão
-
20/04/2021 18:32
Juntada de petição intercorrente
-
12/04/2021 16:49
Expedição de Outros documentos.
-
12/04/2021 15:46
Proferido despacho de mero expediente
-
09/02/2021 15:56
Conclusos para decisão
-
09/02/2021 00:13
Decorrido prazo de INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA em 08/02/2021 23:59.
-
14/01/2021 18:47
Expedição de Comunicação via sistema.
-
14/01/2021 18:01
Proferido despacho de mero expediente
-
08/01/2021 18:28
Conclusos para decisão
-
08/01/2021 10:16
Remetidos os Autos da Distribuição a 4ª Turma
-
08/01/2021 10:16
Juntada de Informação de Prevenção
-
28/10/2020 12:26
Recebidos os autos
-
28/10/2020 12:26
Recebido pelo Distribuidor
-
28/10/2020 12:26
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
28/10/2020
Ultima Atualização
29/05/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
ACÓRDÃO • Arquivo
ACÓRDÃO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
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