TJRN - 0912030-76.2022.8.20.5001
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Virgilio Macedo Junior
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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08/09/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0912030-76.2022.8.20.5001 Polo ativo ZULEIDE FERREIRA DE MELO e outros Advogado(s): THIAGO MARQUES CALAZANS DUARTE, JOAO CARLOS RIBEIRO AREOSA Polo passivo UP BRASIL ADMINISTRACAO E SERVICOS LTDA. e outros Advogado(s): JOAO CARLOS RIBEIRO AREOSA, THIAGO MARQUES CALAZANS DUARTE EMENTA: CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
AUSÊNCIA DE CLAREZA E INFORMAÇÃO ADEQUADA AO CONSUMIDOR.
CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS SEM PACTUAÇÃO EXPRESSA.
TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO.
PEDIDO DE RESSARCIMENTO DE VALORES REFERENTES À “DIFERENÇA DE TROCO” INDEFERIDO POR INTEGRAR O MONTANTE DAS PARCELAS JÁ REVISADAS.
REVISÃO CONTRATUAL.
REPETIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS A MAIOR.
IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO DE PARCELAS VINCENDAS.
CONHECIMENTO DE AMBOS OS APELOS.
RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DESPROVIDO.
RECURSO DA CONSUMIDORA PARCIALMENTE PROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelações cíveis interpostas por ZULEIDE FERREIRA DE MELO e pela UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA. contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação revisional de contrato de empréstimo consignado, com pedidos de revisão de cláusulas contratuais, devolução de valores pagos a maior, compensação de créditos e restituição de valores cobrados sob a rubrica de “diferença de troco”.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há cinco questões em discussão: (i) definir se é válida a capitalização mensal de juros na ausência de pactuação expressa; (ii) estabelecer se a ausência de transparência na fixação da taxa de juros impõe a aplicação da taxa média de mercado; (iii) determinar se é cabível a restituição em dobro dos valores pagos a maior; (iv) verificar se a compensação de valores pode abranger parcelas vincendas.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A capitalização de juros depende de previsão contratual expressa; na ausência de instrumento escrito ou gravação que comprove a pactuação, deve ser considerada inválida (Súmulas 539 e 541 do STJ; Súmula 27 do TJRN). 4.
A falta de clareza quanto à taxa de juros impõe a substituição pela taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central, conforme a Súmula 530 do STJ. 5.
O método de amortização pretendido envolve matéria técnica e deve ser apurado em sede de liquidação de sentença, com perícia contábil. 6.
A restituição em dobro dos valores pagos a maior é cabível diante da ausência de engano justificável e da conduta contrária à boa-fé objetiva, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC e da jurisprudência do STJ. 7.
A compensação de valores só é viável quanto a créditos líquidos e vencidos, conforme art. 369 do Código Civil. 8.
A devolução específica da “diferença de troco” é indevida, pois tais valores já integram o montante global a ser recalculado nas prestações, tornando a restituição autônoma descabida.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 11.
Apelos conhecidos.
Recurso da UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA. desprovido.
Recurso de ZULEIDE FERREIRA DE MELO parcialmente provido.
Tese de julgamento: 1.
A capitalização de juros somente é válida quando expressamente pactuada em contrato escrito ou meio equivalente. 2.
A ausência de clareza quanto à taxa de juros contratada justifica a aplicação da taxa média de mercado. 3.
A repetição em dobro de valores pagos indevidamente é admissível diante da má-fé presumida do fornecedor. 4.
A compensação de valores somente é possível entre parcelas vencidas e líquidas. 5.
A “diferença de troco” integra o valor das parcelas já revistas e não comporta devolução autônoma.
Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 85, §2º e §11; 86, parágrafo único; 330, §2º.
CDC, arts. 6º, III; 42, parágrafo único.
CC, art. 369.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmulas 539, 541, 530, 43 e 54.
TJRN, APELAÇÃO CÍVEL, 0811779-16.2023.8.20.5001, Desª.
Lourdes de Azevedo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 07/02/2025, PUBLICADO em 08/02/2025; APELAÇÃO CÍVEL nº 0855826-80.2020.8.20.5001, Gab.
Des.
Ibanez Monteiro na Câmara Cível, ASSINADO em 27/05/2021; APELAÇÃO CÍVEL, 0884740-86.2022.8.20.5001, Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 23/02/2024, PUBLICADO em 26/02/2024; APELAÇÃO CÍVEL, 0842091-72.2023.8.20.5001, Desª.
Lourdes de Azevedo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 27/09/2024, PUBLICADO em 30/09/2024; APELAÇÃO CÍVEL, 0858665-73.2023.8.20.5001, Des.
João Rebouças, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 17/09/2024, PUBLICADO em 18/09/2024; APELAÇÃO CÍVEL, 0823258-06.2023.8.20.5001, Des.
MARIA DE LOURDES MEDEIROS DE AZEVEDO, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 16/05/2025, PUBLICADO em 19/05/2025; APELAÇÃO CÍVEL, 0915491-56.2022.8.20.5001, Des.
BERENICE CAPUXU DE ARAUJO ROQUE, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 10/10/2024, PUBLICADO em 12/10/2024.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima nominadas, ACORDAM os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, por unanimidade de votos, conhecer dos recursos, negar provimento ao apelo interposto pela UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA. e dar provimento parcial ao recurso de apelação interposta por ZULEIDE FERREIRA DE MELO, nos termos do voto do relator, parte integrante deste acórdão.
RELATÓRIO Trata-se de apelações cíveis interpostas por ZULEIDE FERREIRA DE MELO e pela UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA. contra a sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara Cível da Comarca de Natal que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial da ação ajuizada pela primeira recorrente em desfavor da referida empresa, para revisar o contrato e declarar a nulidade da capitalização de juros, os quais deveriam incidir de forma simples e limitados a 12% ao ano, utilizando-se na amortização pelo Sistema de Amortização Constante (SAC), fixando critérios específicos para apuração de eventual valor a ser restituído, e condenando a UP BRASIL em custas processuais e em honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor do proveito econômico, a ser apurado em liquidação de sentença.
Na sentença (ID 134595329), o Juízo a quo registrou, inicialmente, que o caso comportava julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, por entender que a prova documental acostada aos autos era suficiente para a solução da lide, tratando-se apenas de matéria de direito.
Destacou a incidência do Código de Defesa do Consumidor na relação jurídica em exame, por envolver típica relação de consumo entre a parte autora, na qualidade de consumidora, e a demandada, como fornecedora de serviços financeiros, reconhecendo a vulnerabilidade técnica e informacional da demandante.
Enfatizou que o artigo 6º, incisos IV e V, do Código de Defesa do Consumidor, assegura ao consumidor o direito à modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais e a proteção contra práticas e cláusulas abusivas.
Invocou, ainda, o artigo 51 do mesmo diploma legal, que considera nulas de pleno direito as cláusulas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou sejam incompatíveis com a boa-fé objetiva.
O Juízo analisou o contrato e entendeu que restou configurada a cobrança de capitalização mensal de juros (anatocismo), prática vedada quando não houver previsão legal expressa, e que, no caso concreto, violava o disposto no Código de Defesa do Consumidor.
Assim, determinou que os juros passassem a incidir de forma simples, sem capitalização, e limitados ao percentual máximo de 12% (doze por cento) ao ano, conforme entendimento jurisprudencial aplicado a casos análogos.
Determinou, para fins de amortização do débito, a adoção do Sistema de Amortização Constante (SAC), ressaltando, contudo, que deveriam ser desprezados quaisquer outros encargos contratuais não previstos expressamente na sentença.
Estabeleceu que, em eventual inadimplência, incidiria multa de 2% (dois por cento) sobre o valor da parcela, juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária pelo INPC, cada qual calculado separadamente.
No tocante à restituição de valores, consignou que eventual quantia paga a maior deveria ser obtida mediante a subtração entre o valor pago e o valor devido recalculado, acrescida de correção monetária pela Tabela I da Justiça Federal a partir do ajuizamento da ação e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês desde a citação válida, condicionada à comprovação de inexistência de saldo devedor em aberto.
Registre-se que foram interpostos embargos de declaração por ZULEIDE FERREIRA DE MELO, que foram conhecidos e rejeitados, conforme decisão constante do ID 32118376.
Em suas razões (ID 32118372), a empresa apelante afirmou que a sentença deveria ser anulada por ausência de observância ao art. 330, § 2º, do Código de Processo Civil, e, subsidiariamente, reformada para reconhecer a legalidade da capitalização de juros, amparada em julgados do Superior Tribunal de Justiça e nas Súmulas 27 e 28 desta Corte Estadual, ressaltando que as taxas aplicadas foram devidamente informadas no momento da contratação.
Requereu, ao final, que seja conhecido e provido o presente recurso de apelação para que seja reformada a sentença recorrida, julgando-se improcedentes os pedidos formulados na inicial.
Em suas contrarrazões (ID 32118375), a apelada ZULEIDE FERREIRA DE MELO afirmou que a sentença deveria ser mantida integralmente, defendendo a ilegalidade da capitalização mensal de juros e a aplicação dos juros simples limitados a 12% ao ano, e requereu o desprovimento do recurso.
Por sua vez, ZULEIDE FERREIRA DE MELO, nas razões do recurso de apelação que interpôs (ID 32118379), aduziu que, embora tenha sido determinada a exclusão da capitalização, o método de recálculo adotado (Sistema de Amortização Constante - SAC) ainda implica, de forma implícita, a aplicação de juros compostos, pleiteando que seja realizado o recálculo efetivo com juros simples lineares.
Alegou, ainda, a existência de diferença no “troco” decorrente das renovações contratuais, requerendo a condenação da apelada ao pagamento do valor correspondente, devidamente corrigido e acrescido de juros.
Requereu, ao final, que seja conhecido e provido o presente recurso, para determinar o recálculo das parcelas, a condenação ao pagamento da diferença no troco, à repetição do indébito em sua forma dobrada, bem como para que seja determinado “que eventual saldo devedor da operação, obtido após recálculos dos contratos a juros simples, seja adimplido mediante adequação do valor das parcelas vincendas, sem compensação com o crédito obtido após recálculo, respeitando o prazo final do negócio entabulado entre os contendores”.
Em suas contrarrazões (ID 32118388), a apelada UP BRASIL pugnou pelo desprovimento do recurso interposto pela parte autora.
Registre-se que estes autos não foram remetidos à Procuradoria de Justiça uma vez que o presente feito versa, exclusivamente, sobre direito individual disponível. É o relatório.
VOTO Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço das apelações.
Com efeito, evidencia-se o cabimento dos recursos, a legitimação para recorrer, o interesse recursal, a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, bem como a tempestividade, a regularidade formal.
Em que pesem os fundamentos expostos na sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara Cível da Comarca de Natal, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação ajuizada por ZULEIDE FERREIRA DE MELO em desfavor da empresa UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA., há de ser dado provimento parcial ao apelo interposto pela parte autora.
Conforme relatado, pugna a parte recorrente ZULEIDE FERREIRA DE MELO pela revisão contratual dos empréstimos celebrados com a empresa UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA., com o reconhecimento da ilegalidade da capitalização mensal dos juros remuneratórios e consequente devolução de valores pagos a maior, inclusive a denominada 'diferença no troco', em razão da prática de refinanciamentos sucessivos não transparentes.
O magistrado de origem entendeu que a UP BRASIL, na qualidade de instituição de pagamento, atua de forma análoga às administradoras de cartão de crédito, afastando, assim, a aplicação do Decreto 22.626/33 (Lei de Usura) quanto aos limites de juros, nos termos do enunciado da Súmula 283 do Superior Tribunal de Justiça.
Ainda assim, reconheceu que a ausência de transparência na pactuação da capitalização mensal de juros viola o princípio da informação e a boa-fé objetiva, o que enseja a declaração de nulidade da capitalização composta e impõe o recálculo dos valores com base em juros simples.
A empresa UP BRASIL, em seu apelo, sustentou a nulidade da sentença sob o argumento de que deveria ter sido aplicada a extinção do feito com base no art. 330, §2º, do Código de Processo Civil, diante de suposta litigância predatória.
Alegou ainda a regularidade da capitalização dos juros, com base na MP 2.170-36/2001, e que não haveria ilegalidade nas taxas aplicadas, por estarem dentro do limite previsto no Decreto Estadual nº 21.860/2010.
Ab initio, há de ser refutada a alegação de inobservância ao disposto no § 2º do art. 330 do Código de Processo Civil, uma vez que a presente discussão engloba os juros de todas as parcelas contratadas, cujo valor total, em caso de manutenção das condenações, será objeto de liquidação de sentença, apurável por cálculos matemáticos.
Quanto à capitalização de juros, a Súmula 539 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que tal medida é permitida em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000, desde que haja pactuação expressa.
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em alinhamento com a Corte Superior, consolidou entendimento semelhante na Súmula 27, ao condicionar a validade da capitalização de juros à pactuação expressa.
Pelo exame dos autos, verifica-se que embora a UP Brasil tenha alegado que a capitalização de juros constou expressamente das cláusulas contratuais, a não apresentação, em Juízo, do instrumento contratual e/ou das gravações inerentes a contatos telefônicos com o consumidor impede a análise de sua legalidade.
A Resolução nº 4.881/2020 do Banco Central determina que o CET reflita o conjunto dos custos envolvidos na operação, mas não substitui a necessidade de detalhamento específico da taxa de juros, que é essencial para que o consumidor tenha ciência plena dos encargos financeiros.
Dessa forma, na ausência de pactuação clara e expressa sobre a capitalização dos juros, não há como se validar essa prática no contrato.
A ausência de uma cláusula expressa e detalhada desatende ao dever de informação imposto pelo art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor e viola o direito do consumidor à transparência.
Dessa forma, à luz das Súmulas 539 do STJ e 27 do TJRN, conclui-se pela invalidade da capitalização de juros no presente contrato, por ausência de pactuação expressa e clara.
Considerando a insuficiência de informações prestadas ao consumidor, é cabível a aplicação da taxa média de mercado em substituição à taxa pactuada, conforme prevê a Súmula 530 do STJ.
A referida súmula orienta que, na ausência de pactuação clara, aplica-se a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, para assegurar que o consumidor não seja onerado por condições abusivas ou arbitrárias.
Embora a Up Brasil afirme que a taxa foi informada e aceita pelo consumidor, não logrou êxito em demonstrar que tal informação foi de fato prestada, já que deixou de anexar aos autos os contratos referidos na inicial, conforme já mencionado neste voto.
Portanto, a aplicação da taxa média de mercado é adequada para restabelecer o equilíbrio contratual.
Quanto ao método de amortização, importa esclarecer que, na linha de diversos julgados proferidos por esta Segunda Câmara Cível, entendo que deverá ser feita perícia contábil quando da liquidação de sentença, oportunidade em que será definida a melhor e mais acertada forma de calcular os juros e as respectivas amortizações.
Nesse sentido, merece destaque os seguintes julgados: EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA E REVISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS.
SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE A DEMANDA.
PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL SUSCITADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
REJEIÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE DE DISCRIMINAÇÃO DO VALOR INCONTROVERSO NA PEÇA DE INGRESSO (ART. 330, §2º, DO CPC).
EXIGÊNCIA DESCABIDA NO CASO CONCRETO ANTE OS PEDIDOS DE EXIBIÇÃO DO CONTRATO E DE INVERSÃO DO ÔNUS PROVA, ALÉM DE HAVER INDICAÇÃO DAS ABUSIVIDADES CONTRATUAIS QUE A PARTE AUTORA ENTENDE INCIDIR NO PACTO.
PRECEDENTES.
MÉRITO: APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO REALIZADO POR MEIO DE CONTATO TELEFÔNICO.
TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS.
ABUSIVIDADE CONFIGURADA, DIANTE DA INEXISTÊNCIA DE INFORMAÇÃO AO CONSUMIDOR.
APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO PARA A MESMA ESPÉCIE DE OPERAÇÃO.
RAZOABILIDADE.
SÚMULA Nº 530 DO STJ.
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS.
ILEGALIDADE DECORRENTE DA AUSÊNCIA DE INSTRUMENTO CONTRATUAL ESCRITO OU DE DOCUMENTO CAPAZ DE PERMITIR A AFERIÇÃO DE UM DOS REQUISITOS DE SUA REGULARIDADE: PREVISÃO EXPRESSA.
ENTENDIMENTO CONSOLIDADO ATRAVÉS DAS SÚMULAS 539 E 541 DO STJ E SÚMULA 27 DESTA CORTE.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO.
CABIMENTO.
OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO MÉTODO GAUSS, PARA RECALCULAR AS OPERAÇÕES DISCUTIDAS NA LIDE.
QUESTÃO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA QUE EXTRAPOLA O CAMPO JURÍDICO.
AUSÊNCIA DE EXAME APROFUNDADO NA FASE DE CONHECIMENTO.
NECESSIDADE DE SER DEFINIDA EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.
VALORES A TÍTULO DE DIFERENÇA DE “TROCO”.
VALOR JÁ RECALCULADO.
COMPENSAÇÃO DE VALORES.
POSSIBILIDADE. ÔNUS SUCUMBENCIAL.
PROVEITO ECONÔMICO EXISTENTE.
INCIDÊNCIA DO ART. 85, § 2º, DO CPC.
SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DA PARTE AUTORA.
APLICAÇÃO DO ARTIGO 86, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC.
HONORÁRIOS A SEREM SUPORTADOS INTEGRALMENTE PELA PARTE RÉ.
APELO DA UP BRASIL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
APELO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelações interpostas por ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos de revisão contratual e condenação à restituição de valores pagos a maior, no âmbito de contrato de empréstimo consignado realizado por meio de contato telefônico.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
A controvérsia abrange: (i) a legalidade da capitalização de juros; (ii) a ausência de informações claras sobre a taxa de juros contratada; (iii) a aplicação do método Gauss para recálculo das parcelas; (iv) a repetição em dobro do indébito; e (v) a fixação dos honorários sucumbenciais com base no proveito econômico obtido.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
Rejeitada a preliminar de inépcia da inicial por entender que, no caso de ausência de contrato formal, a indicação de abusividades e o pedido de exibição de documentos são suficientes para seu recebimento, afastando-se a exigência do art. 330, §2º, do CPC. 4.
Constatada ausência de prova da pactuação expressa da capitalização de juros, o que invalida sua aplicação, conforme precedentes do STJ (Súmulas 539 e 541). 5.
Diante da ausência de informações claras sobre a taxa de juros, fixação das taxas pela média de mercado divulgada pelo Banco Central, em consonância com a Súmula 530 do STJ. 6.
Inviabilidade de aplicação do método Gauss para recálculo das parcelas, devendo a questão ser resolvida em liquidação de sentença com apoio técnico. 7.
Cabimento da repetição em dobro do indébito por violação à boa-fé objetiva, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 8.
Reforma parcial da sentença para determinar que os honorários sucumbenciais sejam fixados sobre o valor do proveito econômico obtido, mantendo o percentual de 10%, apurado em liquidação de sentença.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 9.
Apelações conhecidas e parcialmente providas.
Tese de julgamento: 1.
A capitalização de juros somente é válida quando expressamente pactuada em contratos celebrados após a edição da MP 2.170-36/2001. 2.
A ausência de informações claras sobre taxas de juros impõe a aplicação da média de mercado, salvo se a taxa contratada for mais favorável ao consumidor. 3.
A repetição em dobro do indébito é cabível quando há conduta contrária à boa-fé objetiva. 4.
A discussão sobre o método de recálculo de parcelas deve ser remetida à liquidação de sentença com suporte técnico. 5.
Honorários sucumbenciais devem ser fixados com base no proveito econômico obtido.
Dispositivos relevantes citados: Código de Processo Civil, arts. 85, §2º e §11, 86, parágrafo único, e 330, §2º.
Código de Defesa do Consumidor, arts. 6º, III e V, 39, IV, e 42, parágrafo único.
Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmulas 539, 541, e 530.
TJRN, Apelação Cível 0850236-54.2022.8.20.5001, rel.
Desª Maria de Lourdes Azevêdo, julgada em 08/03/2024.
TJRN, Apelação Cível 0819986-72.2021.8.20.5001, rel.
Des.
Cornélio Alves, julgada em 21/12/2022. (APELAÇÃO CÍVEL, 0811779-16.2023.8.20.5001, Desª.
Lourdes de Azevedo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 07/02/2025, PUBLICADO em 08/02/2025) “EMENTA: DIREITOS CIVIL, DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
AUSÊNCIA DE CONTRATO FORMAL.
CONTRATAÇÃO POR TELEFONE.
CARÊNCIA DE INFORMAÇÕES AO CONSUMIDOR NO MOMENTO DA CONTRATAÇÃO.
DEVER DE INFORMAÇÃO (ART. 6º, III DO CDC).
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
HIPOSSUFICIÊNCIA DO CONSUMIDOR.
AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO SOBRE A TAXA DE JUROS.
VANTAGEM ABUSIVA.
TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS.
APLICAÇÃO DA MÉDIA DE MERCADO NO MOMENTO DA CONTRATAÇÃO. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.
PARTE AUTORA VENCIDA EM PARTE MÍNIMA.
RECURSO DESPROVIDO.
APELAÇÃO DO CONSUMIDOR.
APLICAÇÃO DA TABELA SAC EM SENTENÇA.
PLEITO DE APLICAÇÃO DO MÉTODO GAUSS.
MATEMÁTICA FINANCEIRA.
QUESTÃO DE FATO A SER DEFINIDA POR MEIO DE PROVA TÉCNICA EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.
PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO”. (APELAÇÃO CÍVEL nº 0855826-80.2020.8.20.5001, Gab.
Des.
Ibanez Monteiro na Câmara Cível, ASSINADO em 27/05/2021).
Quanto ao pedido formulado nas razões da apelação interposta por ZULEIDE FERREIRA DE MELO de condenação da empresa UP BRASIL para que devolva o valor inerente à “diferença de troco”, também seguindo os entendimentos desta Corte de Justiça, entende-se que há de ser desprovido, uma vez que, ao recalcular as parcelas do contrato, bem como o próprio instrumento contratual, ter-se-á a modificação dos seus respectivos valores, não comportando mais se falar em tal verba. É da jurisprudência deste Tribunal de Justiça: EMENTA: CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
IRRESIGNAÇÃO MÚTUA.
I – APELO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
A) PRELIMINAR DE INÉPCIA DA EXORDIAL.
INOCORRÊNCIA.
APLICAÇÃO DO ART. 330, §2º E §3º DO CPC.
B) MÉRITO.
B.1) CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS.
NECESSIDADE DE ACORDO EXPRESSO.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA PACTUAÇÃO.
ANATOCISMO QUE SE MOSTRA ILÍCITO NA HIPÓTESE DOS AUTOS.
PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (RESP'S DE NºS 973.827/RS E 1.251.331/RS, JULGADOS SOB A SISTEMÁTICA DOS RECURSOS REPETITIVOS).
B.2) RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO.
INCIDÊNCIA.
B.3) AFASTAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL.
CONDENAÇÃO INEXISTENTE.
I – APELO DA AUTORA.
A) MÉTODO LINEAR PONDERADO (GAUSS).
NÃO APLICAÇÃO.
B) HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA.
FIXAÇÃO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO.
ADEQUAÇÃO.
INTELIGÊNCIA DO ART. 85, §2º DO CPC.
C) CORREÇÃO MONETÁRIA.
APLICAÇÃO NO INPC.
POSSIBILIDADE.
D) DIFERENÇA DE “TROCO”.
VALOR JÁ RECALCULADO.
APELO DA RÉ PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
RECURSO DA AUTORA CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE (APELAÇÃO CÍVEL, 0884740-86.2022.8.20.5001, Des.
Cornélio Alves, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 23/02/2024, PUBLICADO em 26/02/2024) EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS EM AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA E REVISÃO CONTRATUAL.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
EXAME EM CONJUNTO DAS INSURGÊNCIAS.
PRELIMINAR SUSCITADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA: INÉPCIA DA INICIAL.
REJEIÇÃO.
JUNTADA DE DOCUMENTOS ESSENCIAIS À PROPOSITURA DA AÇÃO.
MÉRITO: APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, E SUCESSIVOS REFINANCIAMENTOS, REALIZADOS POR MEIO DE CONTATO TELEFÔNICO.
ANÁLISE INDIVIDUAL DE CADA NEGÓCIO.
POSSIBILIDADE.
APLICAÇÃO DA SÚMULA 286 DO STJ.
TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS.
ABUSIVIDADE CONFIGURADA.
APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO PARA A MESMA ESPÉCIE DE OPERAÇÃO.
RAZOABILIDADE.
SÚMULA Nº 530 DO STJ.
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS DEVIDA NOS CONTRATOS QUE ESTÃO ATRELADOS ÀS CÉDULAS DE CRÉDITO BANCÁRIO (CCB), TERMOS DE ACEITE (CONTRATOS DIGITAIS) E RESPECTIVOS ÁUDIOS NOS QUAIS SE IDENTIFICAM, COM OBJETIVIDADE, AS TAXAS APLICADAS (CUSTO EFETIVO TOTAL MENSAL/ANUAL E/OU TAXA DE JUROS MENSAL/ANUAL).
PROVA HÁBIL A IDENTIFICAR A CAPITALIZAÇÃO MENSAL E OS JUROS PACTUADOS.
VALIDADE DO ANATOCISMO APENAS NAS CONTRATAÇÕES NºS 1109953, 1075006, 1109245, 1109246, 1109750 e 1014217.
PRESUNÇÃO DA FALTA DE PACTUAÇÃO EXPRESSA NAS DEMAIS NEGOCIAÇÕES.
VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO (ART. 6º, III, CDC).
EXCLUSÃO DA CAPITALIZAÇÃO DE JUROS QUANTO AOS DEMAIS CONTRATOS.
ILEGALIDADE DECORRENTE DA AUSÊNCIA DE INSTRUMENTO CONTRATUAL ESCRITO OU DE DOCUMENTO CAPAZ DE PERMITIR A AFERIÇÃO DE UM DOS REQUISITOS DE SUA REGULARIDADE: PREVISÃO EXPRESSA.
ENTENDIMENTO CONSOLIDADO ATRAVÉS DAS SÚMULAS 539 E 541 DO STJ E SÚMULAS 27 E 28 DESTA CORTE.
ABUSIVIDADE CONFIGURADA.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO.
CABIMENTO.
OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.
PRETENSÃO DE AFASTAMENTO DO MÉTODO GAUSS, PARA RECALCULAR AS OPERAÇÕES DISCUTIDAS NA LIDE.
QUESTÃO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA QUE EXTRAPOLA O CAMPO JURÍDICO.
AUSÊNCIA DE EXAME APROFUNDADO NA FASE DE CONHECIMENTO.
NECESSIDADE DE SER DEFINIDA EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.
VALORES A TÍTULO DE DIFERENÇA DE “TROCO”.
VALOR JÁ RECALCULADO.
COMPENSAÇÃO DE VALORES.
POSSIBILIDADE.
PRECEDENTE DO STJ.
MANUTENÇÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL.
SUCUMBÊNCIA MÍNIMA CONFIGURADA.
ART. 86, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC.
RECURSO DA UP BRASIL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
APELO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0842091-72.2023.8.20.5001, Desª.
Lourdes de Azevedo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 27/09/2024, PUBLICADO em 30/09/2024) No que diz respeito à repetição do indébito, tem-se que tal pedido há de ser apreciado com base no art. 42 do Código de Defesa do Consumidor.
Assim é que, quanto à modalidade da restituição do valor pago, impõe-se que, efetivamente, diante da ausência da apresentação do instrumento contratual e de supostas gravações telefônicas, seja feita em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista que não restou provada hipótese de engano justificável da UP BRASIL, que sequer apresentou os contratos referidos na inicial.
Há de se observar que conforme já decidiu o STJ, a restituição em dobro do indébito independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva (STJ.
Corte Especial.
EAREsp. 76608/RS, Relator Ministro Og Fernandes, julgado em 21/10/2020).
Quanto ao valor a ser restituído, tem-se que deve ser apurado o quantum total quando de um possível pedido de cumprimento/liquidação de sentença, mediante a comprovação de todos os descontos efetivados, sobre os quais deverá incidir correção monetária pelo IPCA, a partir das datas dos efetivos prejuízos (Súmula 43 do STJ), e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde os eventos danosos (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ), devendo ser aplicada tão somente a Selic a partir de 1º de julho de 2024, data de vigência da Lei nº 14.905/2024.
No que diz respeito à compensação de valores, também objeto do apelo interposto pela parte autora, tem-se por pacificado o entendimento de ser cabível a referida compensação tão somente em relação às parcelas vencidas, diversamente do pedido autoral. É o que se extrai do artigo 369 do Código Civil, a seguir: Art. 369.
A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis.
Sobre esse ponto, é da jurisprudência deste Tribunal de Justiça: “Da compensação Quanto a possibilidade de compensação de créditos em relação aos contratos em questão, vislumbra-se que é possível em relação a créditos em favor da parte Autora, decorrente do recálculo das prestações da avença, com eventual saldo devedor de parcelas vencidas, se existirem.
Mas, tal compensação se mostra inviável em face das prestações vincendas, porque não há a configuração de hipótese de vencimento antecipado da avença, para fins de sua liquidação.” (APELAÇÃO CÍVEL, 0858665-73.2023.8.20.5001, Des.
João Rebouças, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 17/09/2024, PUBLICADO em 18/09/2024).
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXPRESSA E REVISÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS.
SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE A DEMANDA.
PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL SUSCITADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
REJEIÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE DE DISCRIMINAÇÃO DO VALOR INCONTROVERSO NA PEÇA DE INGRESSO (ART. 330, §2º, DO CPC).
EXIGÊNCIA DESCABIDA NO CASO CONCRETO ANTE OS PEDIDOS DE EXIBIÇÃO DO CONTRATO E DE INVERSÃO DO ÔNUS PROVA, ALÉM DE HAVER INDICAÇÃO DAS ABUSIVIDADES CONTRATUAIS QUE A PARTE AUTORA ENTENDE INCIDIR NO PACTO.
PRECEDENTES.
MÉRITO: APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO REALIZADO POR MEIO DE CONTATO TELEFÔNICO.
TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS.
ABUSIVIDADE CONFIGURADA, DIANTE DA INEXISTÊNCIA DE INFORMAÇÃO AO CONSUMIDOR.
APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO PARA A MESMA ESPÉCIE DE OPERAÇÃO.
RAZOABILIDADE.
SÚMULA Nº 530 DO STJ.
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS.
ILEGALIDADE DECORRENTE DA AUSÊNCIA DE INSTRUMENTO CONTRATUAL ESCRITO OU DE DOCUMENTO CAPAZ DE PERMITIR A AFERIÇÃO DE UM DOS REQUISITOS DE SUA REGULARIDADE: PREVISÃO EXPRESSA.
ENTENDIMENTO CONSOLIDADO ATRAVÉS DAS SÚMULAS 539 E 541 DO STJ E SÚMULA 27 DESTA CORTE.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO.
CABIMENTO.
OBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO MÉTODO GAUSS, PARA RECALCULAR AS OPERAÇÕES DISCUTIDAS NA LIDE.
QUESTÃO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA QUE EXTRAPOLA O CAMPO JURÍDICO.
AUSÊNCIA DE EXAME APROFUNDADO NA FASE DE CONHECIMENTO.
NECESSIDADE DE SER DEFINIDA EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.
VALORES A TÍTULO DE DIFERENÇA DE “TROCO”.
VALOR JÁ RECALCULADO.
COMPENSAÇÃO DE VALORES.
POSSIBILIDADE APENAS EM CASO DE EXISTÊNCIA DE PARCELAS VENCIDAS.
APELO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
APELO DA UP BRASIL CONHECIDO E DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelações interpostas por ambas as partes contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos de revisão contratual e condenação à restituição de valores pagos a maior, no âmbito de contrato de empréstimo consignado realizado por meio de contato telefônico.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
A controvérsia abrange: (i) a legalidade da capitalização de juros; (ii) a ausência de informações claras sobre a taxa de juros contratada; (iii) a aplicação do método Gauss para recálculo das parcelas; (iv) a repetição em dobro do indébito; (v) o recebimento de valores a título de “diferença de troco”; e (vi) a possibilidade de compensação de valores.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
Rejeitada a preliminar de inépcia da inicial por entender que, no caso de ausência de contrato formal, a indicação de abusividades e o pedido de exibição de documentos são suficientes para seu recebimento, afastando-se a exigência do art. 330, §2º, do CPC. 4.
Constatada ausência de prova da pactuação expressa da capitalização de juros, o que invalida sua aplicação, conforme precedentes do STJ (Súmulas 539 e 541). 5.
Diante da ausência de informações claras sobre a taxa de juros, fixação das taxas pela média de mercado divulgada pelo Banco Central, em consonância com a Súmula 530 do STJ. 6.
Inviabilidade de aplicação do método Gauss para recálculo das parcelas, devendo a questão ser resolvida em liquidação de sentença com apoio técnico. 7.
Cabimento da repetição em dobro do indébito evidenciada a má-fé, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 8.
Compensação de valores limitada a créditos líquidos e vencidos, conforme art. 369 do CC. 9.
A "diferença de troco" integra o valor financiado, não cabendo sua restituição separada do recálculo das prestações.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 10.
Recurso da parte autora conhecido e parcialmente provido.
Recurso da instituição financeira conhecido e desprovido.
Tese de julgamento: 1.
A capitalização de juros somente é válida quando expressamente pactuada em contratos celebrados após a edição da MP 2.170-36/2001. 2.
A ausência de informações claras sobre taxas de juros impõe a aplicação da média de mercado, salvo se a taxa contratada for mais favorável ao consumidor. 3.
A repetição em dobro do indébito é cabível quando há conduta que evidencia má-fé ou ofensa à boa-fé objetiva. 4.
A discussão sobre o método de recálculo de parcelas deve ser remetida à liquidação de sentença com suporte técnico.
Dispositivos relevantes citados: Código de Processo Civil, arts. 85, §2º e §11, 86, parágrafo único, e 330, §2º; Código de Defesa do Consumidor, arts. 6º, III e V, 39, IV, e 42, parágrafo único; STJ, Súmulas 539, 541, e 530.
Jurisprudência relevante citada: TJRN, Apelação Cível 0850236-54.2022.8.20.5001, rel.
Desª Maria de Lourdes Azevêdo, julgada em 08/03/2024.
TJRN, Apelação Cível 0819986-72.2021.8.20.5001, rel.
Des.
Cornélio Alves, julgada em 21/12/2022. (APELAÇÃO CÍVEL, 0823258-06.2023.8.20.5001, Des.
MARIA DE LOURDES MEDEIROS DE AZEVEDO, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 16/05/2025, PUBLICADO em 19/05/2025) EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
DESERÇÃO DO APELO DA AUTORA.
INÉPCIA DA INICIAL NÃO CONFIGURADA.
REVISÃO CONTRATUAL.
ABUSIVIDADE DE JUROS.
CAPITALIZAÇÃO NÃO PACTUADA.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
DESPROVIMENTO DO RECURSO DA RÉ.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelações cíveis interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente ação revisional de contrato bancário, reconhecendo a abusividade das taxas de juros e determinando a aplicação de juros simples, com repetição do indébito e compensação de créditos.
O apelo da autora foi declarado deserto por falta de preparo.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
A questão em discussão consiste em: (i) Saber se a petição inicial é inepta por ausência de discriminação das obrigações controvertidas e dos valores incontroversos, conforme exige o art. 330, §2º, do CPC; (ii) Verificar se houve abusividade na taxa de juros pactuada e na capitalização dos juros, justificando a revisão contratual; e(iii) apurar a correta compensação de créditos.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
Descumprido o dever de apresentar, no momento da interposição, comprovante bancário e guia, a parte que deixa de atender a ordem de recolhimento dobrado deve ter seu recurso declarado deserto na forma do artigo 1.007, §4º, CPC.4.
A alegação de inépcia da inicial não merece acolhimento, pois a parte autora fundamentou adequadamente seu pedido de revisão contratual, sendo possível a compreensão da controvérsia e o exercício do contraditório, não havendo prejuízo processual. 5.
Quanto à abusividade dos juros, restou demonstrado que a taxa aplicada não foi informada e que a capitalização não foi expressamente pactuada, o que justifica a revisão contratual para adequação dos encargos, conforme entendimento consolidado na Súmula 530 do STJ.6.
A compensação de créditos depende do vencimento da dívida na forma do artigo 369, CC, não havendo que se falar em abatimento do do valor financiado ou das parcelas sob pena de resultar em antecipação da dívida.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 7.
Apelo autoral deserto.
Recurso da ré conhecido e desprovido.
Tese de julgamento: "1.
A ausência de discriminação dos valores incontroversos na petição inicial em ação que se discute exatamente a falta de informação clara não configura inépcia, sendo possível a compreensão da controvérsia e o pleno exercício do contraditório.2. É abusiva a cobrança de juros acima da média de mercado sem prévia informação, bem como a capitalização de juros não expressamente pactuada.3.
A compensação de créditos de mesma natureza presume que ambas estejam vencidas, na forma do artigo 369, CC.” Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 1.007, §4º; art. 330, §2º; CDC, art. 42;Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 530.. (APELAÇÃO CÍVEL, 0915491-56.2022.8.20.5001, Des.
BERENICE CAPUXU DE ARAUJO ROQUE, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 10/10/2024, PUBLICADO em 12/10/2024) Diante do exposto, conheço das apelações, nego provimento ao apelo interposto pela UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA. e dou provimento parcial ao recurso interposto por ZULEIDE FERREIRA DE MELO para determinar que as parcelas inerentes à repetição do indébito sejam feitas em sua forma dobrada e tenham incidência de correção monetária pelo IPCA, a partir das datas dos efetivos prejuízos (Súmula 43 do STJ), e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde os eventos danosos (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ), devendo ser aplicada tão somente a Selic a partir de 1º de julho de 2024, data de vigência da Lei nº 14.905/2024, nos termos deste voto.
Em virtude do desprovimento do recurso interposto pela UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA., majoro os honorários advocatícios fixados no primeiro grau em 2% (dois por cento), nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil. É com voto.
Natal/RN, data de registro no Sistema.
JUIZ CONVOCADO ROBERTO GUEDES RELATOR 18 Natal/RN, 25 de Agosto de 2025. -
30/06/2025 15:40
Recebidos os autos
-
30/06/2025 15:40
Conclusos para despacho
-
30/06/2025 15:40
Distribuído por sorteio
-
28/05/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 7ª Vara Cível da Comarca de Natal Rua Doutor Lauro Pinto, 315, Fórum Seabra Fagundes, Lagoa Nova, NATAL - RN - CEP: 59064-972 Contato: (84) 36738765 - Email: [email protected] Processo: 0912030-76.2022.8.20.5001 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Parte Autora: ZULEIDE FERREIRA DE MELO Parte Ré: UP BRASIL ADMINISTRACAO E SERVICOS LTDA.
SENTENÇA Trata-se de embargos de declaração opostos por ZULEIDE FERREIRA DE MELO contra a sentença de mérito, apontando, em suma, a existência de omissões no julgado, consistentes: (i) na ausência de manifestação quanto ao afastamento de metodologias de amortização que operem com capitalização de juros, a exemplo da Tabela Price e do SAC, com pedido de aplicação do Método Gauss ou do Sistema de Amortização Linear; e (ii) na omissão relativa à devolução da chamada “diferença no troco”, decorrente de renegociações contratuais sucessivas em que o valor liberado ao consumidor, após quitação da operação anterior, teria sido quantificado de modo inadequado.
Ao final, pediu o acolhimento dos embargos, com efeitos infringentes, para suprir os vícios apontados.
A parte embargada foi intimada para apresentar contrarrazões.
A parte ré/embargada apresentou contrarrazões se manifestando pelo não cabimento dos embargos de declaração como meio apto a discutir a matéria. É o relatório.
Decido.
Os Embargos Declaratórios servem para afastar da decisão atacada: omissão, na ausência de pronunciamento judicial de ofício ou sobre questão suscitada pelas partes; obscuridade, quando o julgado for ambíguo ou de entendimento impossível; contradições, caso a decisão impugnada apresente proposições entre si inconciliáveis ou, ainda, para correção de erro material (art. 1.022 do CPC).
Na espécie, conquanto a embargante tenha sustentado a existência de vícios no julgado, não vislumbro a sua ocorrência.
Isso porque este Juízo se manifestou sobre todas as questões de fato e de direito capazes de influenciar no mérito. - Sobre o método de amortização fixado na sentença A alegada omissão quanto à metodologia de cálculo da dívida não procede.
A sentença foi clara ao afastar a capitalização composta de juros e, em complemento, determinou que o recálculo da dívida se dê por meio do Sistema de Amortização Constante (SAC).
Trata-se de método reconhecido pela jurisprudência como compatível com juros simples, o que atende integralmente à pretensão revisional acolhida.
A não menção expressa ao método Gauss ou ao Sistema de Amortização Linear (SAL) não gera qualquer vício, uma vez que o juiz não está vinculado à forma matemática sugerida pela parte, bastando que indique critério que preserve a legalidade e os fundamentos da decisão, o que, no caso concreto, diz respeito ao cálculo dos juros de forma simples.
Nesse ponto, não há qualquer ambiguidade ou lacuna, tampouco erro material. - Sobre a alegada omissão quanto à “diferença no troco” A sentença, ao determinar o recálculo do contrato e a repetição do indébito por valores pagos a maior, já abrange implicitamente eventuais diferenças decorrentes de "troco" em renegociações.
Isso porque as sucessivas contratações de crédito implicavam extinção da operação anterior e concessão de novo valor.
O “troco” corresponde ao montante remanescente após a quitação da dívida anterior, sendo parte do crédito total formalmente contratado.
Não há elementos nos autos que indiquem que a quantificação desse valor tenha sido realizada de modo unilateral ou abusivo pela instituição ré.
Dessa forma, eventual excesso ou ilegalidade estará abarcado na reanálise da integralidade dos contratos, não havendo necessidade de tratamento autônomo ou destaque analítico específico a esse título.
Quanto aos juros, a decisão fixou claramente o parâmetro em 12% ao ano por não se tratar de instituição financeira, taxa mais benéfica ao consumidor que a média de mercado, tornando desnecessária a aplicação da Súmula 530 do STJ.
A expressão "saldo devedor em aberto" utilizada na sentença é clara no contexto processual, referindo-se a débitos vencidos e não pagos, conforme interpretação sistemática do dispositivo.
Ademais, a decisão foi expressa ao determinar a adequação das parcelas vincenda mantendo-se o prazo inicial do contrato.
Não há, portanto, omissão, contradição, obscuridade ou erro material na decisão, sendo patente a irresignação da parte recorrente quanto ao que ficou decidido, cuja modificação não cabe pela via dos embargos de declaração.
Não se considera omissa a decisão que, a despeito de não apreciar exaustivamente sobre todos os fundamentos das partes, traz em seu bojo expressa fundamentação sobre as questões capazes de influenciar no mérito da causa, na linha do que já decidido pelo STJ: "PROCESSUAL CIVIL.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA ORIGINÁRIO.
INDEFERIMENTO DA INICIAL.
OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE, ERRO MATERIAL.
AUSÊNCIA. 1.
Os embargos de declaração, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado, o que não ocorre na hipótese em apreço. 2.
O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão.
A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida. (...)" (EDcl no MS 21.315/DF, Rel.
Ministra DIVA MALERBI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/06/2016, DJe 15/06/2016) Diante do exposto, CONHEÇO dos embargos de declaração, mas nego-lhes provimento, mantendo inalterada a sentença.
Considerando que a parte ré interpôs recurso de apelação, e que a parte autora/apelada apresentou contrarrazões, remetam-se os autos ao tribunal em grau de recurso.
Intime-se.
Natal/RN, na data registrada pelo sistema.
Amanda Grace Diógenes Freitas Costa Dias Juíza de Direito (Assinado Digitalmente nos termos da Lei nº 11.419/06) -
28/02/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 7ª Vara Cível da Comarca de Natal Rua Doutor Lauro Pinto, 315, Fórum Seabra Fagundes, Lagoa Nova, NATAL - RN - CEP: 59064-972 Contato: (84) 36738765 - Email: [email protected] Processo: 0912030-76.2022.8.20.5001 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Parte Autora: ZULEIDE FERREIRA DE MELO Parte Ré: UP BRASIL ADMINISTRACAO E SERVICOS LTDA.
SENTENÇA I – RELATÓRIO ZULEIDE FERREIRA DE MELO, qualificado(a) nos autos, ajuizou a presente demanda judicial em face de UP BRASIL ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS LTDA, igualmente qualificado(as), aduzindo, em síntese, que celebrou com a demandada contrato(s) de empréstimo(s) sendo informado apenas o valor do crédito e das parcelas, omitindo informações indispensáveis a exemplo da taxa de juros mensal e anual, bem como da capitalização dos juros ou sua periodicidade.
Consignou que não obstante tais vícios o demandante autorizou o desconto das prestações em sua folha de pagamento, já tendo efetuado o desembolso de várias parcelas sem que tenha conseguido quitar os contratos.
Ressaltou que a demandada não é instituição financeira e, portanto, a taxa de juros anual está limitada ao patamar de 12% ao ano.
Pediu a inversão do ônus da prova para que a demandada forneça a cópia do(s) contrato(s) e do(s) extrato(s), a concessão da gratuidade da justiça e, no mérito, a revisão do contrato determinando-se a limitação dos juros ao patamar de 12% ao ano, a nulidade da aplicação de capitalização mensal de juros compostos, recalculando o valor das prestações com juros calculados de forma simples, sem anatocismo, pedindo ainda a repetição do indébito sobre o que teria pagado a maior.
Requereu a gratuidade da justiça.
Com a inicial vieram diversos documentos.
Foi deferida a gratuidade da justiça e a inversão do ônus da prova e determinada a intimação da ré para que juntasse aos autos cópia do contrato (Num. 91905711) A parte demandada apresentou a resposta (Num. 98184368), acompanhada de vários documentos, em que arguiu, diversas preliminares.
No mérito, destacou que se constitui em instituidora de arranjo de pagamento, tendo como principal atividade a “emissão de vales-alimentação, vale-transporte e similares”, nos termos da Lei nº 12.865/2013, equivalendo-se a uma administradora de cartão de crédito.
Defendeu o poder discricionário da parte autora em contratar a operação de crédito, refutando a alegada omissão acerca da taxa de juros e da capitalização, uma vez que após a solicitação da simulação são informados que o valor disponibilizado é captado pela requerida através de cláusula mandato, com reembolso descontados na folha de pagamento, tendo a parte autora, após cientificado do valor das parcelas e da taxa de juros aplicada, expressamente concordado e autorizado a transação, conforme áudio anexo, asseverando a força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda).
Sustentou a inaplicabilidade da Lei de Usura ao caso concreto, uma vez que é uma administradora de cartão de crédito, não se sujeitando a limitação dos juros nos termos da Súmula nº 382 do STJ, asseverando, ainda, que a taxa pactuada está de acordo com o §1º do art. 16 do Decreto Estadual nº 21.860/2010, insurgindo-se, ainda, contra o pedido de repetição do indébito por ausência de má-fé, bem como em relação à inversão do ônus da prova.
Ao final, manifestou desinteresse pela audiência de conciliação, pugnou pelo indeferimento do pedido de gratuidade da justiça e de inversão do ônus da prova, bem como pela rejeição dos pedidos contidos na inicial ou, subsidiariamente, que apenas os valores abusivos sejam objeto de ressarcimento.
A parte autora apresentou réplica à contestação (Num. 98939410).
As partes foram intimadas para dizer sobre a necessidade de produção de outras provas (Num. 112399379).
A parte autora não requereu novas provas (Num. 112750139).
A parte ré se manifestou reiterou os termos da defesa, bem como pugnou pela expedição de ofício para OAB/RN para averiguarção de litigância predatória por parte do patrono subscritor da inicial (Num. 116343953).
Através da decisão de saneamento Num. 122399120, foram analisadas e rejeiradas as preliminares, bem como o pedido expedição de ofício para a OAB, formulado pela parte ré, além de ter sido determinada a intimação da ré para juntar aos autos todos os contratos celebrados com a mesma.
Em nova petição a ré noticia a impossibilidade de juntada dos áudios das contratções (Num. 130012721) É o relatório.
Decido.
II – FUNDAMENTAÇÃO - DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE De início, importa destacar que o caso em exame comporta julgamento antecipado tendo em vista que a documentação acostada aos autos é suficiente para elucidar as questões fáticas debatidas e para formar o convencimento deste Juízo quanto ao mérito da causa, sobejando unicamente as questões de direito, pelo que passo ao julgamento antecipado do pedido nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil. - DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO CONTRATO PELO JUDICIÁRIO No caso dos autos aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, como lei de ordem pública econômica e de caráter imperativo, a todas as relações contratuais, nas quais o consumidor, por se encontrar em situação de vulnerabilidade diante do fornecedor ou do prestador do serviço, carece de proteção jurídica especial, nos termos dos artigos 1º e 3º do referido diploma legal.
Constituem direitos básicos do consumidor, dentre outros, o de proteção contra cláusulas abusivas no fornecimento de produtos ou serviços e o da modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, previstos no artigo 6º, incisos IV e V, da Lei nº 8.078/90.
O artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, consagra as hipóteses de cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços, que considera nulas de pleno direito, constando entre elas, no inciso IV, as que "estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade".
Sobre o assunto, também é pertinente a lição de Nelson Nery Júnior: O direito básico do consumidor, reconhecido no art. 6º, no V, do Código, não é o de desonerar-se da prestação por meio da resolução do contrato, mas o de modificar a cláusula que estabeleça prestação desproporcional, mantendo-se íntegro o contrato que se encontra em execução, ou de obter a revisão do contrato se sobrevierem fatos que tornem as prestações excessivamente onerosas para o consumidor.
O juiz, reconhecendo que houve cláusula estabelecendo prestação desproporcional ao consumidor, ou que houve fatos supervenientes que tornaram as prestações excessivamente onerosas para o consumidor, deverá solicitar das partes a composição no sentido de modificar a cláusula ou rever efetivamente o contrato (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. 9 ed.
Rio de Janeiro: Forense Universitária. 2007. p. 547).
Revela-se patente a possibilidade de revisão pelo Poder Judiciário de cláusulas contratuais inseridas em contratos adesão, uma vez que tais operações se encontram sujeitas aos princípios que regem as relações de consumo (Código de Defesa do Consumidor), com vista a preservar o equilíbrio entre as partes e a excessiva onerosidade ao consumidor. - DO MÉRITO Trata-se de demanda judicial em que a parte autora busca a revisão do contrato a fim de que seja observada a limitação da taxa de juros remuneratórios a 12% ao ano, de forma simples (sem capitalização), alegando, em suma, ausência de expressa previsão e por não ser a demandada instituição financeira.
Por sua vez, a parte demandada defende que todas as informações pertinentes à operação como, por exemplo, valor das prestações, juros, capitalização etc., foram prestadas quando da contratação, que teria ocorrido de forma verbal, e que sendo uma instituição equiparada a uma administradora de cartão de crédito não se sujeita a limitação dos juros prevista no Decreto-Lei 22.622/33.
Ademais, é incontroversa a relação jurídica de direito material entre as partes, consoante documentação juntada na inicial e na contestação, remanescendo então as demais questões que serão analisadas conforme adiante. - DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS APLICÁVEL Na antiga redação do artigo 192, §3º, da Constituição Federal, que tinha pertinência especial às operações intermediadas por entidades financeiras, prescrevia-se que os juros reais, neles incluídas as comissões e outras remunerações pelo capital emprestado, não poderiam ser superiores ao percentual de 12% (doze por cento) ao ano.
Esse entendimento, contudo, vinha sendo sufragado pela jurisprudência dos tribunais, que afastavam essa limitação às instituições financeiras, conforme ficou pacificado pelo STF no enunciado da Súmula nº 596: “As disposições do Decreto 22626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional.”.
Na mesma linha, o STJ consolidou entendimento de que “com a edição da Lei 4.595/64, não se aplicam as limitações fixadas pelo Decreto 22.626/33, em 12% ao ano, aos contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, ut súmula 596/STF, salvo nas hipóteses previstas em legislação específica.”. (AgRg no REsp 599.470/RS, Rel.
Ministro Fernando Gonçalves, Quarta Turma, julgado em 19/08/2004, DJ 13/09/2004, p. 260 RJADCOAS vol. 61, p. 78).
Reforçando essa tese o Superior Tribunal de Justiça também houve por afastar a abusividade pela simples pactuação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, conforme o teor da Súmula nº 382 segundo a qual "A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade".
Com base nisso, o legislador constituinte, corroborando com o entendimento jurisprudencial de que os juros devem ter seu controle regulado pelas leis de mercado, em atenção às normas expedidas pelos órgãos que regulamentam a atividade financeira sem qualquer limitação por preceito constitucional, promulgou a Emenda Constitucional nº 40, de 29 de maio de 2003, que derrogou o dispositivo mencionado.
Entretanto, no caso dos autos, cumpre assentar que a despeito da parte demandada sustentar ser uma instituição equiparada a uma administradora de cartão de crédito e que, por isso, não se aplicariam as disposições do Decreto 22.626/1933, não merece prosperar.
Isso porque a demandada é uma instituição de arranjo de pagamento, a qual integra o Sistema de Pagamentos Brasileiros (SPB), e a despeito de ser regulada pelo Banco Central do Brasil, não integra o sistema financeiro nacional, tampouco pode ser equiparada a uma administradora de cartão de crédito.
As instituições de arranjo de pagamento são regidas pela Lei nº 12.865/2013, cuja definição e atividades precípuas são assim definidas: Art. 6º Para os efeitos das normas aplicáveis aos arranjos e às instituições de pagamento que passam a integrar o Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB), nos termos desta Lei, considera-se: I - arranjo de pagamento - conjunto de regras e procedimentos que disciplina a prestação de determinado serviço de pagamento ao público aceito por mais de um recebedor, mediante acesso direto pelos usuários finais, pagadores e recebedores; II - instituidor de arranjo de pagamento - pessoa jurídica responsável pelo arranjo de pagamento e, quando for o caso. pelo uso da marca associada ao arranjo de pagamento: III - instituição de pagamento - pessoa jurídica que, aderindo a um ou mais arranjos de pagamento, tenha como atividade principal ou acessória, alternativa ou cumulativamente: a) disponibilizar serviço de aporte ou saque de recursos mantidos em conta de pagamento: b) executar ou facilitar a instrução de pagamento relacionada a determinado serviço de pagamento, inclusive transferência originada de ou destinada a conta de pagamento; c) gerir conta de pagamento; d) emitir instrumento de pagamento: e) credenciar a aceitação de instrumento de pagamento: f) executar remessa de fundos; g) converter moeda física ou escriturai em moeda eletrônica, ou vice-versa, credenciar a aceitação ou gerir o uso de moeda eletrônica: e h) outras atividades relacionadas à prestação de serviço de pagamento, designadas pelo Banco Central do Brasil; IV - conta de pagamento - conta de registro detida em nome de usuário final de serviços de pagamento utilizada para a execução de transações de pagamento: V - instrumento de pagamento - dispositivo ou conjunto de procedimentos acordado entre o usuário final e seu prestador de serviço de pagamento utilizado para iniciar uma transação de pagamento; e VI - moeda eletrônica - recursos armazenados em dispositivo ou sistema eletrônico que permitem ao usuário final efetuar transação de pagamento. § 1º As instituições financeiras poderão aderir a arranjos de pagamento na forma estabelecida pelo Banco Central do Brasil, conforme diretrizes estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional. § 2º É vedada às instituições de pagamento a realização de atividades privativas de instituições financeiras, sem prejuízo do desempenho das atividades previstas no inciso III do caput. § 3º O conjunto de regras que disciplina o uso de instrumento de pagamento emitido por sociedade empresária destinado à aquisição de bens ou serviços por ela ofertados não se caracteriza como arranjo de pagamento. § 4º Não são alcançados por esta Lei os arranjos de pagamento em que o volume, a abrangência e a natureza dos negócios, a serem definidos pelo Banco Central do Brasil, conforme parâmetros estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional, não forem capazes de oferecer risco ao normal funcionamento das transações de pagamentos de varejo. § 5º O Banco Central do Brasil, respeitadas as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, poderá requerer informações para acompanhar o desenvolvimento dos arranjos de que trata o § 4º. - Destaques acrescidos.
O §2º do art. 6º veda expressamente que as instituições de pagamento realizem atividades privativas das instituições financeiras, como, por exemplo, a concessão de empréstimos.
O fato de a demandada emitir cartões não é suficiente para equipará-la às administradoras de cartões de crédito, uma vez que os cartões por ela emitidos funcionam como mero instrumento de pagamento (Alínea “d” do inciso III do art. 6º da Lei nº 12.865/2013).
A equiparação das instituições de arranjo de pagamento às instituições financeiras também já foi refutada pela Terceira Seção do STJ, em julgado relatado pelo Ministro Joel Ilan Paciornik, em acórdão assim ementado: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE A JUSTIÇA FEDERAL E A JUSTIÇA ESTADUAL.
NOTITIA CRIMINIS ENCAMINHADA AO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL.
SUPOSTA FRAUDE PRATICADA CONTRA INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO.
INEXISTÊNCIA DE CAPTAÇÃO OU ADMINISTRAÇÃO DE RECURSOS DE TERCEIROS.
INSTITUIÇÃO QUE ATUA COMO FACILITADORA DE PAGAMENTO.
VEDAÇÃO LEGAL À PRÁTICA DE ATOS DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
INOCORRÊNCIA DE EQUIPARAÇÃO A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
CONFIGURAÇÃO, EM TESE, DE ESTELIONATO CONTRA PESSOA JURÍDICA PRIVADA.
AUSÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1.
O presente conflito negativo de competência deve ser conhecido, por se tratar de incidente instaurado entre juízos vinculados a Tribunais distintos, nos termos do art. 105, inciso I, alínea "d" da Constituição Federal - CF. 2.
O núcleo da controvérsia consiste em definir a competência para prestar jurisdição na hipótese de suposta fraude praticada contra instituição de pagamento.
Divergem os Juízos envolvidos no conflito sobre a possibilidade de equiparação de instituição de pagamento a instituição financeira e, consequentemente, sobre a configuração de crime contra o sistema financeiro ou estelionato. 3.
Conforme definição do Banco Central do Brasil - BACEN, "instituição de pagamento (IP) é a pessoa jurídica que viabiliza serviços de compra e venda e de movimentação de recursos, no âmbito de um arranjo de pagamento, sem a possibilidade de conceder empréstimos e Financiamentos a seus clientes.".
Trata-se, portanto, de instituição não financeira que executa serviços de pagamento em nome de terceiros.
Referidas instituições de pagamento possibilitam ao cidadão realizar pagamentos independentemente de relacionamentos com bancos e outras instituições financeiras.
Assim, com o recurso financeiro movimentável, por exemplo, por meio de um cartão pré-pago ou de um telefone celular, o usuário pode portar valores e efetuar transações sem estar com moeda em espécie. 4.
As características da instituição de pagamento - vedação de concessão de empréstimos e financiamento - já demonstram ausência de similitude com as instituições financeiras.
Com efeito, a Lei n. 12.865, de 9 de outubro de 2013, em seu artigo 6º, é clara ao definir quais atividades podem ser praticadas pelas instituições de pagamento, proibindo expressamente que realizem atividades privativas de instituições financeiras. [...] (CC 159.891/SP, Rel.
Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 10/04/2019, DJe 23/04/2019) - Grifei Dessarte, em se tratando de instituição que não integra o sistema financeiro nacional, tampouco se equiparando a quaisquer entidades que integrem o SFN, havendo inclusive vedação para o exercício de atividades privativas de instituições financeiras, aplica-se ao(s) contrato(s) em análise as disposições do Decreto nº 22.626/33, que fixa o patamar dos juros em 12% ao ano, o que se extrai da leitura conjunta dos artigos 406 combinado com o art. 591, ambos do Código Civil, e do §1º do art. 161 do Código Tributário Nacional, que respectivamente dispõem: CC.
Art. 406.
Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.
Art. 591.
Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual.
CTN.
Art. 161.
O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária. § 1º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês.
Outrossim, insta salientar que a previsão contida nos artigos 406 e 591 do Código Civil não são aplicáveis aos contratos bancários, mas não há óbice para que incidam em contratos celebrados por entidades não integrantes do sistema financeiro nacional, como ocorre no caso dos autos.
Portanto, há de ser acolhida a pretensão contida na inicial para limitar os juros do contrato a 12% ao ano, nos termos do Decreto nº 22.626/33. - DA CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS (ANATOCISMO) E DA DISTINÇÃO.
Em agosto de 2001, com o objetivo de consolidar e atualizar a legislação que dispõe sobre a administração dos recursos de caixa do Tesouro Nacional, foi editada a Medida Provisória nº 2.170-36 que, dentre outras coisas, passou a admitir a capitalização dos juros nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, como constou do art. 5º da referida norma.
Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 40, de 29 de maio de 2003, que revogou o art. 192, §3º, da Constituição Federal, a taxa de juros passou a ser regulada de acordo com as leis de mercado, não havendo, pois, que se falar em imposição de taxa de juros de 1% ao mês às instituições financeiras, nem tampouco de taxa de juros de acordo com a taxa SELIC.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte tinha entendimento sedimentado acerca da ilegalidade do anatocismo e inconstitucionalidade do art. 5º da Medida Provisória nº 2.170-36/2001, de forma que era mantida a taxa de juros contratada, mas era afastado o anatocismo, posição adotada por esta magistrada.
Esse entendimento era assim ementado: INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE.
ARTIGO 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170, DE 23 DE AGOSTO DE 2011.
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS.
IMPOSSIBILIDADE.
OBRIGATORIEDADE DE LEI COMPLEMENTAR PARA REGULAMENTAR O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
ARTIGOS 192 E 62, §1º, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO DISPOSITIVO.
PROCEDÊNCIA DO INCIDENTE”. (TJRN, Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível nº 2008.004025-9/0002.00, Rel.
Desembargador AMAURY MOURA SOBRINHO, Tribunal Pleno, julgado em 08/10/2008).
Entretanto, em 04/02/2015, o Supremo Tribunal Federal, por meio do julgamento do Recurso Extraordinário nº 592.377, em regime de repercussão geral, considerou constitucional o art. 5º da Medida Provisória nº 2.170-36/2001, consoante a seguir transcrito: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, rejeitou a preliminar de prejudicialidade apontada pelo Ministério Público.
No mérito, o Tribunal, decidindo o tema 33 da repercussão geral, por maioria, deu provimento ao recurso, vencido o Ministro Marco Aurélio (Relator), que lhe negava provimento e declarava inconstitucional o art. 5º, cabeça, da Medida Provisória nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001.
A partir do entendimento acima explicitado do STF sobre o tema, o Tribunal de Justiça do RN, reviu seu anterior entendimento, para o fim de permitir a capitalização mensal de juros com periodicidade inferior a um ano, conforme julgado pelo Tribunal Pleno, senão vejamos: EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO.
CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS.
POSSIBILIDADE ANTE O DECIDIDO NO RECURSO ESPECIAL Nº 973.827 (ART. 543-c) E A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170-36/2001 AFIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 592.377 EM REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL (ART. 543-B DO CPC).
NECESSIDADE DE ADOÇÃO DO ENTENDIMENTO DO STF POR ESTA CORTE.
ART. 243, II §1º, DO RITJRN.
CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.
O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 973.827, com base no art. 543-C do CPC (sistema de recurso repetitivo), decidiu ser permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.
O Supremo Tribunal Federal por meio do julgamento do Recurso Extraordinário nº 592.377 em regime de repercussão geral (art. 543-B do CPC), considerou constitucional o art. 5º da MP 2.170-36/2001, inviabilizando a manutenção do entendimento desta Corte de Justiça exarado na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível nº 2008.004025-9/0002.00, ante o disposto no art. 243, II, §1º, do RITJRN”. (TJRN, Embargos Infringentes nº 2014.026005-6, Tribunal Pleno, de minha relatoria, julgado em 25/02/2015).
Em razão da modificação do entendimento das Cortes Superiores, esta magistrada também modificou o julgamento a respeito da matéria, para admitir a capitalização mensal de juros, já que foi declarada a constitucionalidade do art. 5º da MP nº 2.170-36/2001, tendo em conta o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça exarado no REsp nº. 973.827/RS, sob a sistemática dos recursos repetitivos, cuja ementa segue abaixo transcrita: CIVIL E PROCESSUAL.
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO.
AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO.
CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA.
CAPITALIZAÇÃO DE JUROS.
JUROS COMPOSTOS.
DECRETO 22.626/1933.
MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001.
COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.
MORA.
CARACTERIZAÇÃO. 1.
A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano é permitida pela Medida Provisória nº 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada, tem por pressuposto a circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal.
Os juros não pagos são incorporados ao capital e sobre eles passam a incidir novos juros. 2.
Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira, de “taxa de juros simples” e “taxa de juros compostos”, métodos usados na formação da taxa de juros contratada, prévios ao início do cumprimento do contrato.
A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas processo de formação da taxa de juros pelo método composto, o que não é proibido pelo Decreto 22.626/1933. 3.
Teses para efeitos do art. 543-C do CPC: “É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.” - “A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara.
A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada”. [...]. (STJ, REsp 973.827/RS, relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Segunda Seção, julgado em 08/08/2012, Dje 24/09/2012) - Destaquei Porém, as premissas fáticas e jurídicas do caso concreto são diferentes daquelas do REsp nº. 973.827/RS, uma vez que a parte ora demandada não integra o sistema financeira nacional, tampouco é possível a equiparação da ré a qualquer das entidades que integram o SFN, razão pela qual não há como se aplicar a tese firmada pelo STJ.
Como dito alhures, a incidência dos juros no(s) contrato(s) em exame é regida pelas disposições do Decreto nº 22.626/33, que expressamente proíbe a capitalização dos juros, a teor do art. 4º: Art. 4º.
E proibido contar juros dos juros: esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano.
Entretanto, no caso concreto, a parte demandada quedou inerte em comprovar que teria cumprido com o dever de informação acerca informar da capitalização de juros, da periodicidade (se mensal, semestral, anual), não demonstrando que o consumidor tinha ciência, de forma adequada e clara os serviços que estavam sendo contratados.
Cumpre ainda destacar a expressa vedação sobre a forma como a ré tem ofertado os empréstimos aos consumidores (por telefone), sem a constituição de um título adequado que represente a dívida contraída, consoante o disposto na alínea “b” do inciso IX do art. 1º da Resolução 3.258/2005, do Conselho Monetário Nacional, que dispõe: Art.1º Alterar o item IX da Resolução 1.559, de 22 de dezembro de 1988, que passa a vigorar com a seguinte redação: "IX -É vedado às instituições financeiras: (…) b) conceder crédito ou adiantamento sem a constituição de um título adequado, representativo da dívida." (NR) Por isso, a capitalização dos juros também deve ser afastada por ausência de expressa previsão no contrato, de modo que os juros, na linha do que ficou acima decidido, devem ser aplicados de forma simples. - DO MÉTODO DE AMORTIZAÇÃO Por sua vez, quanto ao método de amortização deve ser observado o Sistema de Amortização Constante – SAC, e não o Método de Gauss, como pretendo a parte autora, haja vista a ausência de previsão legal nesse sentido e por não servir o Método de Gauss par assegurar o equilíbrio contratual, conforme as lições de Luiz Donizete Teles: O Método de Gauss é um modelo de cálculo perfeito nas aplicações para as quais ele foi criado, mas não serve como alternativa de juros simples em operações financeiras.
Se levarmos em consideração que nas operações de empréstimo não pode haver a capitalização composta de juros, devemos supor que isto não pode ocorrer a favor de quem está fornecendo os recursos e nem a favor de quem os está recebendo.
O Método de Gauss toma como referência o retorno do investimento que um determinado valor poderá propiciar.
Ocorre que, no caso de operações de empréstimos, as prestações são compostas de capital e juros, juros estes que, em razão dos cálculos que são feitos para apurar o retorno do investimento, sofrem a incidência de novos juros.
Isto causa uma distorção a favor do devedor, na medida em que, justamente por causa da capitalização composta que ocorre no cálculo do retorno, para se alcançar o retorno esperado, a prestação calculada pelo Método de Gauss é menor. (TELES, Luiz Donizete.
Método de Gauss não serve como alternativa de juros simples.
Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3274, 18 jun. 2012.
Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22021.
Acesso em: 2 ago. 2020) Conclui-se que inobservância dos requisitos mínimos para a contratação do mútuo, seja quanto ao “título adequado” que represente a dívida, seja quanto às informações que devem ser prestadas ao consumidor, que devem ser claras e precisas acerca da correta especificação, características, composição, dentre outros, são suficientes para dar guarida aos pedidos da inicial em relação ao afastamento da capitalização, bem como sobre os juros a serem aplicados. - DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO No que diz respeito ao pedido de repetição do indébito, este é admitido quando alguém, ilicitamente, sem base jurídica que a justifique, aumenta o seu patrimônio em detrimento de outrem que, em contrapartida, sofre um decréscimo financeiro em decorrência de um pagamento indevido.
Sobre o tema, preleciona o Código Civil no art. 876 que “Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.”.
Por sua vez, o Código de Defesa do Consumidor também trata do tema no parágrafo único do art. 42, consignando que “O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.”.
Nesta linha argumentativa, conclui-se que a repetição de indébito prevista nos dispositivos epigrafado exige a presença de três requisitos, quais sejam o caráter indevido da cobrança, o efetivo pagamento do valor abusivamente cobrado e a má-fé do credor (construção pretoriana).
Contudo, não vislumbro demonstrada a má-fé da parte demandada, a qual não pode ser presumida, cabendo ao autor demonstrar a sua ocorrência no caso concreto, o que não ocorreu, de modo que hei de acolher o pedido de repetição do indébito, mas de forma simples.
III – DISPOSITIVO Diante do exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para o fim de revisar o contrato e declarar a nulidade da capitalização de juros, os quais devem incidir de forma simples (sem capitalização) e limitado a 12% ao ano, utilizando-se na amortização o Sistema de Amortização Constante.
A apuração nos termos acima deverá ser feita através de liquidação de sentença, observando-se para o capital a correção monetária pelo INPC da data da contratação até o ajuizamento da ação, e na hipótese de eventual inadimplência devem incidir juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, multa de 2% (dois por cento) e correção monetária pelo INPC sobre o valor das parcelas, cada um calculado de per si, de modo que sejam desprezados quaisquer outros encargos previstos no contrato diferentes dos ora determinados, deduzindo-se os valores pagos pela parte autora com base nos mesmos parâmetros.
Caso haja valor a ser restituído, este deverá ser obtido do resultado dessa subtração (valor pago a maior – valor devido apurado = valor a ser restituído), acrescido de correção monetária pela Tabela I da Justiça Federal, a partir do ajuizamento da ação, e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, estes da citação válida, condicionado à comprovação da inexistência de saldo devedor em aberto.
Tendo em vista que a parte autora sucumbiu em parte mínima do pedido, condeno a demandada a suportar todo o ônus sucumbencial, consistente no pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais, estes que fixo em 10% (dez por cento) do valor do proveito econômico em favor da autora a ser apurado na liquidação, o que faço com fundamento no art. 85, §2º, e parágrafo único do art. 86, ambos do CPC.
Cumpridas as formalidades e certificado o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com baixa na distribuição e registro, sem prejuízo de posterior desarquivamento para fins de cumprimento da sentença.
Intimem-se.
Natal/RN, na data registrada pelo sistema.
AMANDA GRACE DIÓGENES FREITAS COSTA DIAS Juíza de Direito (documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06)
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
30/06/2025
Ultima Atualização
29/08/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Acórdão • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Documento de Comprovação • Arquivo
Documento de Comprovação • Arquivo
Documento de Comprovação • Arquivo
Sentença • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Sentença • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Outros documentos • Arquivo
Outros documentos • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
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