TJRN - 0802007-84.2023.8.20.5112
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gab. Des. Ibanez Monteiro Na Camara Civel
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
30/11/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0802007-84.2023.8.20.5112 Polo ativo IRENE ALZIRA DE MORAIS BRITO Advogado(s): FRANCISCO RAFAEL REGIS OLIVEIRA registrado(a) civilmente como FRANCISCO RAFAEL REGIS OLIVEIRA Polo passivo BANCO BMG SA Advogado(s): ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO ORDINÁRIA DE ANULAÇÃO DE DÍVIDA E DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO BANCÁRIO.
DESCONTOS INDEVIDOS RELATIVOS A TARIFAS BANCÁRIAS.
EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
FRACIONAMENTO E PULVERIZAÇÃO DE AÇÕES DA MESMA PARTE E EM RELAÇÃO À MESMA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
PEDIDO E CAUSA DE PEDIR SEMELHANTES OU DECORRENTES DA MESMA RELAÇÃO JURÍDICA.
CONDUTA NÃO ADMISSÍVEL.
VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA TRANSPARÊNCIA, DA LEALDADE, DA BOA-FÉ PROCESSUAL, DA COOPERAÇÃO E DA ECONOMIA PROCESSUAL.
ARTIGOS 5º, 6º E 8º DO CPC.
NOTA TÉCNICA DO CIJ/TJRN.
PRECEDENTES DE VÁRIOS TRIBUNAIS.
DESPROVIMENTO DO RECURSO.
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível, em votação com o quórum ampliado, por maioria, conheceu e desproveu o recurso, nos termos do voto do Relator, vencidos os Desembargadores Berenice Capuxú e Virgílio Macêdo Jr.
Apelação interposta por Irene Alzira de Morais Brito, em face da sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito, na forma do art. 485, VI do CPC, no afã de “prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias”, impôs a determinação de concentração dos fatos discutidos nas ações ajuizadas em uma única.
Ainda condenou a parte autora em custas e honorários e por litigância de má-fé.
Alegou que não há identidade de causa de pedir e pedido entre as ações ajuizadas sob o nº 0802007-84.2023.8.20.5112 e nº 0802006-02.2023.8.20.5112, os quais versam sobre contratos distintos e discussões diferentes.
Informou que a outra ação já foi julgado pelo juízo da 2ª Vara Cível de Apodi.
Negou a existência de litigiosidade predatória e sustentou estar equivocada a sentença pela imposição de multa por litigância de má-fé.
Defendeu o direito de acesso ao Poder Judiciário e o necessário retorno do feito ao primeiro grau para prosseguimento.
Requereu o provimento do recurso.
Contrarrazões apresentadas pelo desprovimento do recurso.
A sentença registrou que a parte autora propôs outras demandas judiciais com base em narrativas quase idênticas (valores indevidamente descontados em sua conta bancária), bem como que “a autora poderia ter manejado apenas uma ação, sem que houvesse qualquer prejuízo para a defesa de seus interesses” e o processo foi extinto sem resolução de mérito (art. 485, IV e VI do CPC).
Os processos discutem a cobrança de valores debitados em conta corrente da parte apelante, provenientes de empréstimos e ou tarifas bancárias, e em todas as demandas, a parte autora postulou indenização por danos materiais e morais decorrentes de tais cobranças.
Estamos a analisar recurso em demandas judiciais que buscam diluir a pretensão da parte demandante no maior número possível de ações, mediante o fracionamento da causa de pedir, que se poderia cumular em uma única ação, mas optou-se por utilizar o Poder Judiciário para conseguir vantagens indevidas ou várias indenizações decorrentes da mesma relação jurídica.
Esse método, assemelhado a um "modelo de negócio", muitas vezes traz grandes benefícios à parte e a seus patronos porque aumenta suas chances de, ao menos em uma das ações, por exemplo, ocorrer revelia ou a instituição financeira demandada deixar de apresentar provas, em especial o contrato assinado, a refutar as alegações da parte autora, sobretudo nas relações de consumo que se tem em seu favor a inversão do ônus da prova.
A apelação interposta pela parte autora baseia-se na multiplicidade de ações ajuizadas pela mesma parte autora contra o mesmo banco.
A sentença extinguiu o processo sem resolução do mérito, na forma do art. 485, IV e VI do CPC, ao verificar a existência de diversos processos.
O uso dessa prática tem se tornado comum no Judiciário: o ajuizamento de ações de forma fracionada e pulverizada, que poderiam ser aglutinadas em um único processo.
Isso causa prejuízos ao Judiciário e contraria o princípio da lealdade processual e contrapõe-se ao uso indevido do Poder Judiciário para obter vantagem indevida.
De fato, é um artifício a violar frontalmente os princípios da transparência, da lealdade, da boa-fé processual, da cooperação e da economia processual.
As demais ações envolvem as mesmas partes e possuem a mesma causa de pedir e pedidos semelhantes, cuja única diferença é o fato de que os descontos se referem a nomenclaturas e descontos diversos e possíveis contratos distintos, porém realizados na mesma conta (às vezes, o número do contrato é distinto porque coloca-se o número da parcela).
A pulverização ou o fracionamento de demandas não pode ser admitida.
Se é possível solucionar o conflito em um único processo, não razão a justificar o ingresso de várias ações com o nítido propósito de dificultar a defesa dos réus e obter a cumulação de indenizações, confiando muitas vezes que em algumas ou, ao menos em um, haverá deficiência de defesa ou até mesmo total ausência de contestação dos pedidos.
Vejamos os artigos 5º, 6º e 8º do CPC: Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.
Art. 5º Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.
Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. (...) Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência".
O núcleo do fundamento da sentença consiste na afirmação exaustivamente provada, que esta demanda se caracteriza como artificial e predatória e essa conclusão encontra amparo nos autos a justificar sua extinção sem resolução do mérito, especialmente pela dicção do art. 485, VI do CPC (ausência de interesse processual).
O exercício abusivo do direito de acesso à justiça pode e deve ser reprimido pelo Judiciário, e o ajuizamento em massa de litígios, de maneira indevida, prejudica o acesso à justiça de quem realmente necessita de intervenção judicial para solucionar alguma questão, eis que assoberba o Judiciário, influindo na qualidade da prestação jurisdicional.
A demanda em exame apresente forte carga de litigiosidade artificial, e essa conclusão também encontra abrigo no art. 375 do CPC, que impõe ao juiz aplicar as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece, e ninguém melhor do que ele para observar e combater tal fenômeno, o que fez com maestria singular.
A sentença deu fiel interpretação e correta aplicação à norma legal fazendo uso adequado dos poderes e deveres que lhe são conferidos pelo art. 139, III do CPC Art. 139.
O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: I ( ...) II ( ...) III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias (negrito acrescido).
Os Tribunais também reconhecem o poder-dever do juiz de reprimir demandas predatórias.
Eis alguns julgados recentes: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO - DEMANDA ARTIFICIAL E PREDATÓRIA - IRREGULARIDADE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO - CABIMENTO.
Para evitar a litigiosidade artificial e práticas predatórias no âmbito do Poder Judiciário, o Magistrado possui o poder-dever de tomar medidas saneadoras para coibir o uso abusivo do acesso à Justiça.
A capacidade processual e a representação judicial das partes constituem pressupostos processuais de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.
Tendo o procurador dado ensejo à movimentação indevida do aparato judicial, pelo princípio da causalidade, cabível sua condenação ao pagamento das custas e despesas do processo. (TJMG - Ap.
Civ. 1.0000.23.169309-4/001, Rel.
Des.
Estevão Lucchesi , 14ª CÂMARA CÍVEL, j. em 19/10/2023, pub. da súmula em 19/10/2023).
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA - NEGATIVAÇÃO INDEVIDA - NOTA TÉCNICA Nº 01/2022 EMITIDA PELO CIJMG - LITIGÂNCIA PREDATÓRIA - VICIO DE REPRESENTAÇÃO - AUSENCIA DE PODERES VÁLIDOS - PRESSUPOSTO DE VALIDADE INOCORRENTE - EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. - A nota técnica nº 01/2022 - emitida pelo CIJMG - aponta parâmetros para identificação de demandas predatórias e orienta boas práticas de gestão de processos judiciais para o enfrentamento (prevenção e combate) da litigância predatória. (TJMG - Ap.
Civ. 1.0000.23.091864-1/001, Relatora: Des.(a) Lílian Maciel , 20ª CÂMARA CÍVEL, j. em 18/10/2023, pub da súmula em 19/10/2023). “Para evitar a litigiosidade artificial e práticas predatórias no âmbito do Poder Judiciário, o Magistrado possui o poder-dever de tomar medidas saneadoras para coibir o uso abusivo do acesso à Justiça.
A capacidade processual e a representação judicial das partes constituem pressupostos processuais de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo.
Tendo o procurador dado ensejo à movimentação indevida do aparato judicial, pelo princípio da causalidade, cabível sua condenação ao pagamento das custas e despesas do processo. (TJMG - Ap.
Cív. 1.0000.22.107335-6/002, Rel.
Des.
Estevão Lucchesi , 14ª CÂMARA CÍVEL, J. em 05/10/2023, pub. da súmula em 06/10/2023).
Há pouco tempo, falava-se em “indústria do dano moral”, ações a buscar indenização por dano moral, em que se denunciava a banalização daquele instituto.
Com as facilidades criadas pelo CNJ por meio “Juízo 100% digital”, que gerou como consequência o baixo custo financeiro para ajuizar cada demanda, para quem exerce a nobilitante função da advocacia, essa prática alcançou hoje proporções geométricas mediante a confecção de petições padronizadas, elaboradas em mídias digitais, que narram fatos idênticos, muitas vezes sequer constara qualificação do(a) autor(a).
Com efeito, o que antes era a “indústria do dano moral”, hoje trocou de roupagem e avançou para "demandismo judicial", "demandas predatórias", “litigiosidade artificial”, “demandas fabricadas”, "demandas frívolas” loteria judicial” Sham Litigation (falso litígio) ou "fake lides", pouco importando o nome com que é rotulada ou qualquer outro nome que se dê a esse fenômeno.
No âmbito estadual, no combate às demandas desse quilate, esta Corte foi a pioneira quando em outubro deste ano, o Núcleo de Cooperação Judiciária - NUCOOP, vinculado à Vice-presidência, firmou o ATO DE COOPERAÇÃO JURISDICIONAL N° 01/2023, que estabelece Protocolo de Cooperação judicial para tratamento e combate das demandas predatórias, com criação de Núcleo próprio para tratar as demandas que tramitam nas Unidades do 11°, 12° e 13° Juizados Especiais Cíveis de Natal, mediante análise minuciosa da inicial e dos documentos que a acompanham.
Alguns tribunais têm acolhido esse teme, e um dos que o adota com maior frequência é o TJMT: O fracionamento de Ações com o mesmo fundamento e contra o mesmo réu configura demanda predatória e, portanto, é indevida a indenização por dano moral, sob pena de enriquecimento ilícito. (N.U 1000119-05.2022.8.11.0029, rel.
RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, 4ª Câmara de Direito Privado, j. em 18/10/2023, DJE 20/10/2023).
Com o mesmo entendimento: N.U 1002160-25.2021.8.11.0046, Rel.
RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, 4ª Câmara de Direito Privado, j. em 04/10/2023, DJE 10/10/2023).
Vários Tribunais estão atentos a essa realidade e não mais relutam em agir e combater o uso do processo como “modelo de negócio”.
Em casos extremos, quando devidamente comprovado, condenam o advogado em litigância de má-fé.
E isso se dá diante do cenário visto em quase todo o território nacional e do mal que atormenta todas as esferas do Judiciário, que tem reagido às tentativas de barrar aqueles que buscam no processo judicial outros fins que não dirimir contendas legítimas e concretas, adotando medidas enérgicas para enfrentar tamanho desafio e erradicar o problema de modo eficaz.
Cito alguns julgados recentes do TJMT e do TJAL: EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – IMPROCEDÊNCIA – ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA CONDENAÇÃO EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ, TANTO DA PARTE AUTORA QUANTO DO SEU ADVOGADO – DESCABIMENTO – CONTRATAÇÃO EVIDENCIADA PELA APRESENTAÇÃO DA CÓPIA DO CONTRATO, DA LIBERAÇÃO DO CRÉDITO PELO REQUERIDO E DA LEGALIDADE DE TODOS OS ENCARGOS CONTRATADOS – FATOS INCONTROVERSOS – ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS E AJUIZAMENTO DE TRÊS (3) AÇÕES EM NOME DO AUTOR – OBRIGAÇÕES/CONTRATOS QUE PODERIAM SER DISCUTIDAS EM UNICAMENTE UMA AÇÃO – ABUSO DO DIREITO DE DEMANDAR – CONDUTA TEMERÁRIA – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ CONFIGURADA –– CONDENAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO. (...) Deve ser mantida a condenação da parte autora e de seu patrono às penas de litigância de má-fé, porquanto além de deduzir pretensão contra questão devidamente contratada, procedeu a alteração da verdade dos fatos e utilizou do processo para conseguir objetivo ilegal, por flagrante abuso do direito de demandar, visto que distribuiu na Comarca de Juara - MT, nada menos do que três (3) ações distintas em nome do autor para demandar contra três instituições financeiras, quando na realidade todas as obrigações/contratos poderiam ser discutidos unicamente em uma ação.
Logo, a conclusão possível é que o propósito único para o ajuizamento de tantas demandas dessa natureza, caracteriza verdadeiro “demandismo” ou a denominada “demanda predatória”, que se traduz na mera busca pela condenação das instituições financeiras nas verbas de sucumbência, abarrotando o Poder Judiciário com ações repetidas/fragmentadas e idênticas, circunstância que evidencia a má-fé processual e que deve ser rechaçada pelo julgador (N.U 1002205-16.2021.8.11.0018, _ TJMT - CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, 2ª Câmara de Direito Privado, Julg. em 05/07/2023, DJE 12/07/2023).
RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ORDINÁRIA – DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO – ABUSIVIDADE – REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS – IMPROCEDENCIA - EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS – PREJUDICIAL DE MÉRITO – NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA – CONFUSÃO COM O MÉRITO – MÉRITO – ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE PERÍCIA GRAFOTÉCNICA E CONTRATOS FRAUDULENTOS – DESCABIMENTO – DOCUMENTOS PESSOAIS DA AUTORA E CONTRATOS – ASSINATURAS SEMELHANTES – CONTRATAÇÕES EVIDENCIADAS – CRÉDITOS LIBERADOS NA CONTA DA AUTORA – ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS E AJUIZAMENTO DE SETE (7) AÇÕES EM NOME DA AUTORA – ABUSO DO DIREITO DE DEMANDAR – CONDUTA TEMERÁRIA – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ DA AUTORA E ADVOGADO CONFIGURADA –– CONDENAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO. (...) Deve ser mantida a condenação da parte autora e de seu patrono às penas de litigância de má-fé, porquanto além de deduzir pretensão contra questão devidamente contratada, procedeu a alteração da verdade dos fatos e utilizou do processo para conseguir objetivo ilegal, por flagrante abuso do direito de demandar, visto que distribuiu na Comarca de Sinop - MT, nada menos do que sete (7) ações distintas em nome da autora para demandar contra duas instituições financeiras, quando na realidade todas as obrigações/contratos poderiam ser discutidos unicamente em duas ações.
Logo, a conclusão possível é que o propósito único para o ajuizamento de tantas demandas dessa natureza, caracteriza verdadeiro “demandismo” ou a denominada “demanda predatória”, que se traduz na mera busca pela condenação das instituições financeiras nas verbas de sucumbência, abarrotando o Poder Judiciário com ações repetidas/fragmentadas e idênticas, circunstância que evidencia a má-fé processual e que deve ser rechaçada pelo julgador (N.U 1016730-12.2021.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julg. em 24/05/2023, DJE 29/05/2023).
APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO.
INDEFERIMENTO DA INICIAL POR INÉPCIA.
AJUIZAMENTO DE SENTENTA DE AÇÕES COM A MESMA CAUSA DE PEDIR, ALTERANDO, TÃO SOMENTE, A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ.
MEDIDA QUE EXTRAPOLA, EXCEPCIONALMENTE, O DIREITO FUNDAMENTAL AO ACESSO À JUSTIÇA.
AÇÃO QUE SE ASSEMELHA À SHAM LITIGATION (FALSO LITÍGIO).
O EXERCÍCIO DESENFREADO, REPETITIVO E DESPROVIDO DE FUNDAMENTAÇÃO SÉRIA E IDÔNEA PODE, AINDA QUE EM CARÁTER EXCEPCIONAL, CONFIGURAR ABUSO DO DIREITO DE AÇÃO.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO NÃO VERIFICADA.
CONDENAÇÃO DO ADVOGADO AO ADIMPLEMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS.
POSSIBILIDADE.
APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE.
PATRONO DA PARTE AUTORA QUE DEU AZO À MOVIMENTAÇÃO DESENFREADA E INDEVIDA DO PODER JUDICIÁRIO, EM NÍTIDO ABUSO DO DIREITO DE DEMANDAR.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (Ap.
Civ. n. 0700130-60.2021.8.02.0040).
Colhe-se do voto do relator a seguinte fundamentação, que, por analogia, aplica-se ao caso em julgamento: Ao analisar a peça inicial, o magistrado singular proferiu uma extensa e bem fundamentada sentença, pormenorizando toda a situação em análise, motivo pelo qual, transcrevo trechos para uma melhor compreensão do caso posto em julgamento: A inicial foi subscrita pelo advogado e, somente em janeiro de 2021, foram distribuídas 70 (setenta) petições com o mesmo teor: E cita a Nota Técnica do CIJ/TJRN: Tais demandas em massa, inclusive, vem sendo observadas em outros Tribunais, como no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, onde o Centro de Inteligência dos Juizados Especiais do Rio Grande do Norte afirmou que advogados usam os processos de pequenas causas para "captação de clientela em massa" e enriquecimento ilícito.
Nas palavras do magistrado responsável pelo estudo, "a demanda agressora se caracteriza pelo ajuizamento de causas fabricadas em lotes imensos de processos, geralmente trazidas por poucos escritórios de advocacia que praticam captação de clientela em massa e dizem respeito a uma tese jurídica 'fabricada' com o objetivo de enriquecer ilicitamente partes e advogados, independentemente da plausibilidade daquele pedido" (Nota Técnica nº 01/2020.
Relator: Juiz Paulo Luciano Maia Marques.
TJRN.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/dl/justica-rn-advogados-usam-acoes.Pdf.) (...) "O que rechaço, deste modo, é o exercício desenfreado, repetitivo, com peças e fundamentos genéricos, com a interposição de processos em lotes, que, a meu sentir, demonstram ato ilícito de abuso do direito de ação. É importante salientar que a figura do abuso de direito é mais conhecida e estudada no Brasil sob a perspectiva do direito material e, sobretudo, no âmbito do direito privado.
No entanto, embora não seja da tradição do direito processual civil brasileiro, é admissível o reconhecimento da existência do ato ilícito de abuso processual, tais como o abuso do direito fundamental de ação ou de defesa, não apenas em hipóteses previamente tipificadas na legislação, mas também quando configurada a má utilização dos direitos fundamentais processuais.
Assim, conforme entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça, o ajuizamento de sucessivas ações judiciais, desprovidas de fundamentação idônea e intentadas com propósito doloso, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa, o denominado assédio processual. (STJ. 3ª Turma.
REsp 1.817.845-MS, Rel.
Min.
Paulo de Tarso Sanseverino, Rel.
Acd.
Min.
Nancy Andrighi, julgado em 10/10/2019).
Saliento, por fim, que não merecem retoques a condenação do próprio advogado ao adimplemento das custas processuais.
Conforme esclarecido na sentença, deve ser aplicado o princípio da causalidade, extraído a partir do art. 85 do CPC, ou seja: arca com as custas e com os honorários advocatícios a parte que deu causa, indevidamente, à demanda.
No caso vertente, quem deu azo à movimentação indevida de todo o aparato do Poder Judiciário estatal foi o próprio patrono da parte autora, o qual, desde a petição inicial, não se preocupou em cumprir seu dever legal de advogado, em nítido abuso do direito do acesso à justiça.
O Superior Tribunal de Justiça também aborda esse tema: Ocorre que o ardil, não raro, é camuflado e obscuro, de modo a embaralhar as vistas de quem precisa encontrá-lo.
O chicaneiro nunca se apresenta como tal, mas, ao revés, age alegadamente sob o manto dos princípios mais caros, como o acesso à justiça, o devido processo legal e a ampla defesa, para cometer e ocultar suas vilezas.
O abuso se configura não pelo que se revela, mas pelo que se esconde. É preciso repensar o processo à luz dos mais basilares cânones do próprio direito, não para frustrar o regular exercício dos direitos fundamentais pelo litigante sério e probo, mas para refrear aqueles que abusam dos direitos fundamentais por mero capricho, por espírito emulativo, por dolo ou que, em ações ou incidentes temerários, veiculem pretensões ou defesas frívolas, aptas a tornar o processo um simulacro de processo. (STJ - REsp: 1817845 MS 2016/0147826-7, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 10/10/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/10/2019).
Tem-se ainda na Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que: "Entrar na Justiça com sucessivas ações desprovidas de fundamentação idônea, intentadas com propósito doloso e abusivo, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa e levar ao reconhecimento do assédio processual".
Entendimento adotado pela 3ª Turma no REsp 1.817.845.
Importante destacar que a litigância predatória é hoje uma preocupação dos Tribunais (e de seus Centros de Inteligência), e do CNJ, cuja Meta 5 aplica-se somente às Corregedorias dos Tribunais de Justiça, que expediu quinze Diretrizes Estratégicas (DE) para 2023, dentre elas a DIRETRIZ ESTRATÉGICA 7, que visa a: Regulamentar e promover práticas e protocolos para o combate à litigância predatória, preferencialmente com a criação de meios eletrônicos para o monitoramento de processos, bem como transmitir as respectivas informações à Corregedoria Nacional, com vistas à alimentação de um painel único, que deverá ser criado com essa finalidade.
Há ainda no site do CNJ a “Rede de Informações sobre a Litigância Predatória”, que disponibiliza Banco de Decisões e Notas Técnicas.
O CNJ publicou a Portaria nº 389 de 04/11/2022, que institui Grupo de Trabalho com o objetivo de apresentar propostas para o enfrentamento da litigância predatória associativa.
Notícia publicada no site Migalhas de 24/10/2023, n° 5.713, registra que o "TJ/SP estima prejuízo de R$ 2,7 bi ao ano por litigância predatória" (link: https://www.migalhas.com.br/quentes/395106/tj-sp-estima-prejuizo-de-r-2-7-bi-ao-ano-por-litigancia-predatoria.
Estima-se que essa prática gerou, em média, 337 mil novos processos por ano no período de 2016 a 2021, o que levaria a um déficit anual de aproximadamente R$ 2,7 bilhões.
No período estudado, o impacto seria, portanto, superior a R$ 16 bilhões.
As demandas predatórias causam o aumento exacerbado do número de processos nas unidades judiciais e, em consequência, um tempo maior de tramitação); o esgotamento dos recursos dos Tribunais (humanos e materiais, muitas vezes já insuficientes); impede o cidadão que tem uma demanda concreta e legítima de receber a prestação jurisdicional em tempo razoável.
Do ponto de vista processual, o princípio constitucional do acesso à Justiça e da inafastabilidade da Jurisdição (artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal) deve ser mitigado, pois o juiz, na verdade, agiu nos limites da lei e de acordo com o ordenamento jurídico, de modo a afastar a proliferação de demandas deste quilate.
Conclui-se que a sentença coaduna-se com a Recomendação nº 127/2022, com as metas e diretrizes do Conselho Nacional de Justiça e como a Nota Técnica nº 01/2020 do Centro de Inteligência dos Juizados Especiais do RN – CIJESP/TJRN, a implicar a atitude da parte autora em violação os princípios norteadores do processo civil, conforme demonstrado, razão pela qual o entendimento adotado na sentença deve ser mantido em face da ausência de interesse processual a caracterizar a litigância predatória.
Importante lembrar o saudoso Min.
Sávio de Figueiredo Teixeira, que no século passado, já se preocupava com problemas como esse.
Afirmou sua Excelência: “O processo não é um jogo de esperteza, mas instrumento ético da jurisdição para efetivação dos direitos da cidadania" (STJ.
REsp nº 65.906/DF, Quarta Turma, Dj: 02.03.1998).
Ante o exposto, voto por desprover recurso.
Data de registro no sistema.
Des.
Ibanez Monteiro Relator Natal/RN, 6 de Novembro de 2023. -
09/10/2023 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Segunda Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0802007-84.2023.8.20.5112, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (votação exclusivamente pelo PJe) do dia 30-10-2023 às 08:00, a ser realizada no 2ª CC Virtual (NÃO HÍBRIDA).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 6 de outubro de 2023. -
21/09/2023 08:19
Recebidos os autos
-
21/09/2023 08:19
Conclusos para despacho
-
21/09/2023 08:19
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
26/11/2024
Ultima Atualização
13/11/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
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