TJRN - 0808080-37.2025.8.20.5004
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) (Inativo) 2ª Turma Recursal
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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27/08/2025 08:31
Recebidos os autos
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27/08/2025 08:31
Conclusos para julgamento
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27/08/2025 08:31
Distribuído por sorteio
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21/07/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Fórum dos Juizados Especiais Cíveis Prof.
Jalles Costa 2ª Secretaria Unificada dos Juizados Especiais Cíveis 8º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal Praça André de Albuquerque, 534 (por trás da parada metropolitana), Cidade Alta, Natal/RN, CEP: 59.025-580, fone: (84) 3673-8855, e-mail: [email protected] Processo: 0808080-37.2025.8.20.5004 Parte autora: ELIANA GRACIELLA PINHEIRO MARTINS DE SOUSA Parte ré: Pagseguro Internet Ltda SENTENÇA Vistos, etc.
Relatório dispensado (art. 38 da lei n° 9.099/95).
Trata-se de Ação cível alegando a autora ter sido vítima de fraude eletrônica, realizando transferências para uma conta mantida na instituição ré, após ser induzida por terceiro que utilizava o perfil invadido de uma conhecida no Instagram.
Em contestação, a empresa bancária demandada, suscita, em preliminar, sua ilegitimidade passiva em relação à lide e a necessária denunciação da lide e no mérito, aduz que a demandante sofreu um tipo de golpe bancário no qual terceiro utilizou da boa-fé da vítima para requisitar transferências bancárias para suas contas digitais remotamente, utilizando transferência/pix.
A empresa afasta sua responsabilidade ao afirmar que o nexo de causalidade não tem relação com os serviços oferecidos pela empresa.
Decido.
Afasto a preliminar de ilegitimidade passiva por parte da instituição financeira requerida, visto que ao mérito será verificada a culpa no objeto da deslinde da ação.
A relação jurídica entre as partes é de consumo, aplicando-se, portanto, as disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
A responsabilidade do fornecedor de serviços é objetiva, conforme o artigo 14 do CDC.
Contudo, o § 3º do mesmo artigo estabelece causas excludentes de responsabilidade, quais sejam, a inexistência de defeito na prestação do serviço (inciso I) e a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros (inciso II).
No caso em análise, a demandante efetuou transferências via PIX para a conta de titularidade de terceiro fraudador e tal fraude ocorreu por meio de “engenharia social”, onde a demandante foi ludibriada por um perfil falso em rede social, acreditando negociar com uma conhecida.
A ré, como instituição mantenedora da conta, não possui ingerência sobre as intenções de seus correntistas, nem sobre transações realizadas por iniciativa do próprio cliente em ambiente externo à sua plataforma.
Ademais, a natureza instantânea das operações via PIX, que credita o valor na conta do beneficiário imediatamente, dificulta ou impossibilita o bloqueio e a recuperação dos valores pela instituição financeira quando a comunicação da fraude ocorre tardiamente.
O objeto do processo consiste em saber se houve ou não falha por parte da instituição financeira demandada em prestar o serviço que lhe é competente ou se contribuiu para o evento danoso.
A conduta da autora em realizar as transferências, sem as devidas cautelas para verificar a autenticidade do anúncio e a identidade do interlocutor, configura culpa exclusiva da vítima ou de terceiro.
Tal situação caracteriza o que a doutrina e a jurisprudência denominam “fortuito externo”, que rompe o nexo de causalidade entre a conduta da instituição financeira e o dano sofrido.
O fortuito externo se refere a eventos alheios à atividade do fornecedor, estranhos ao produto ou serviço ofertado.
Verifica-se então que foi este fato que contribuiu decisivamente para o evento danoso, afastando a responsabilidade da instituição financeira demandada, nos termos do artigo 14, §3º, inc.
II, do Código de Defesa do Consumidor, configurada a culpa exclusiva do autor/consumidor, constituindo fortuito externo causado por terceiros, tratando-se aqui de excludente de responsabilidade, quebrando o nexo de causalidade entre a atividade bancária desenvolvida pela requerida PAGSEGURO INTERNET INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO S.A, e os fatos narrados, afastando inclusive a aplicação da súmula 479 do STJ, que trata da responsabilidade objetiva das instituições financeiras.
Cumpre esclarecer que nos pedidos de natureza indenizatória, tornam-se necessários a presença dos seguintes elementos: a) existência de um dano indenizável; b) prova da ação dolosa ou culposa da parte do réu; c) prova do nexo de causalidade entre a conduta do réu e o prejuízo do autor.
Assim, para que possa ser imputada a alguém a efetiva participação de em qualquer evento danoso, necessário que esteja devidamente comprovado quem foi o agente causador, presente a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão e o dano, que deve estar devidamente provado a fim de que possa haver a responsabilidade civil com a posterior reparação, ou seja, cumpre verificar se o dano material foi causado por algum comportamento do agente, devendo ser analisada ainda a possibilidade de ocorrência de qualquer excludente da responsabilidade civil. É certo que existem situações que mesmo presente o dano, o agente se isenta da obrigação de ressarcir, como acontece quando presente alguma excludente, como quando o ato é praticado em legítima defesa, exercício regular de direito, estado de necessidade e ainda, por fato da vítima, seja exclusivo ou concorrente.
Explicita Caio Mário da Silva Pereira: “Quando se verifica a culpa exclusiva da vítima, tollitur quaestio, inocorre indenização.
Inocorre igualmente se a concorrência de culpas do agente e da vítima chegam ao ponto de, compensando-se, anularem totalmente a imputabilidade do dano. (Responsabilidade Civil, Forense, pág. 296)”.
Nesse sentido, de forma análoga, segue o entendimento jurisprudencial: “JUIZADO ESPECIAL CÍVEL.
CONSUMIDOR.
INSTITUIÇÃO BANCÁRIA.
TRANSFERÊNCIAS REALIZADAS PELO CONSUMIDOR.
AUSENTE DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES DAS QUAIS O BANCO TEM DEVER DE SIGILO.
DANO MORAL NÃO CONFIGURADO.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1.
Trata-se de recurso inominado interposto em face da sentença exarada pelo Juízo do Juizado Especial Cível e Criminal do Riacho Fundo, que julgou improcedente o pedido formulado na inicial. 2.
Na origem, o autor ajuizou ação em que pretende a condenação do banco a lhe pagar o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), em reparação por danos morais.
Narrou que foi vítima de um golpe e que, no dia 23/06/2022, transferiu o valor total de R$ 12.098,00, para quatro contas distintas, sendo três delas gerenciadas pelo banco réu e uma gerida por outra instituição.
Alegou que apresentou contestação junto ao réu, no dia 26/06/2022, contudo, o banco lhe somente apresentou resposta em 28/06/2022, negando-lhe o ressarcimento sem apreciação dos fatos específicos.
Argumentou que solicitou as gravações das tratativas referentes ao caso, o lhe fora negada por suposta impossibilidade.
Sustentou que apresentou notificação extrajudicial ao banco, em 29/09/2022, a qual foi recebida por preposto, bem como que somente obteve resposta em 09/10/2022, de forma incompleta.
Destacou que banco agiu com descaso e adotou conduta ilícita, bem como que houve falha na prestação do serviço.
Frisou que se sentiu desamparado e suportou ofensas morais. 3.
Recurso tempestivo, adequado à espécie e desacompanhado de preparo, ante o requerimento de gratuidade judiciária.
Benefício concedido em favor do recorrente, considerando que aufere rendimento inferior a 5 salários mínimos, consoante disposto na Resolução nº 140, de 24 de junho de 2015, editada pela Defensoria Pública do Distrito Federal, e adotada como parâmetro para o reconhecimento da hipossuficiência judiciária.
Foram ofertadas contrarrazões, com impugnação ao pedido de gratuidade de justiça (ID 49456470). 4.
A questão devolvida ao conhecimento desta Turma Recursal consiste na análise da existência dos requisitos caracterizadores da responsabilidade civil e de dano moral indenizável.
Em suas razões recursais, o recorrente alega que foi vítima de golpe aplicado com a utilização de contas geridas pela instituição financeira recorrida, o que caracteriza fortuito interno.
Argumenta que o banco agiu com descaso e que houve falha na prestação do serviço.
Destaca que não foram apreciadas as provas produzidas nos autos, bem como que o banco não apresentou resposta aos questionamentos apresentados pelo autor.
Afirma que o banco é responsável pelas contas utilizadas para cometimento de suposto crime, devendo ser responsabilizado pelos danos, independente de culpa.
Aduz que o banco deveria ter efetuado o bloqueio das contas, em razão da existência de suposta fraude.
Requer a reforma da sentença para condenação do banco a lhe pagar o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), em sede de reparação por danos morais 5.
Preliminar de impugnação à gratuidade judiciária rejeitada, conquanto atendidos os critérios para a concessão do benefício, sem que o impugnante comprovasse ocultação de renda e/ou qualquer dado que pudesse levar à conclusão diversa. 6.
A hipótese em exame configura relação jurídica de natureza consumerista, uma vez que as partes se enquadram nos conceitos de fornecedor e de consumidor previstos no Código de Defesa do Consumidor.
Dessa forma, aplicável ao caso as regras do direito do consumidor, inclusive as que tratam da responsabilidade objetiva na prestação de serviços.
Nesse contexto, a reparação de danos pelo fornecedor ocorrerá, independente da existência de culpa, em razão de defeito na prestação do serviço, o qual leva em consideração os riscos do negócio, nos termos do art. 14, § 1º, II do CDC. 7.
No caso, o recorrente não logrou êxito em comprovar que houve defeito na prestação de serviço por parte do banco, ônus a si atribuído nos termos do art. 373, I do CPC, sobretudo na medida em que o banco respondeu a contestação das transações em dois dias (ID 49455993), bem como a notificação foi respondida em prazo razoável (ID 49455989).
O fato do recorrente não ter obtido as informações solicitadas, por si só, não caracteriza descaso do recorrido, uma vez que não é papel da instituição financeira repassar dados e documentos de seus clientes para terceiros, informações protegidas pelo sigilo bancário, sem autorização judicial ou realizar investigação em relação à supostas transações fraudulentas.
A não disponibilização das gravações solicitadas pelo recorrente não evidencia desídia do banco, pois o autor não especificou quais seriam as gravações, se limitando a fazer pedido genérico "entregar as gravações solicitadas" (ID 49455984, pg. 4).
Ademais, a ausência de atendimento às solicitações feitas pelo cliente não enseja a reparação extrapatrimonial almejada. 8.
O recorrente registrou ocorrência policial, na qual informou textualmente que um amigo seu "...este estava fazendo um anúncio no story em que prometia que o valor transferido em pix para ele renderia 300%.
A vítima acreditou na promessa por se um amigo de muito tempo e efetuou a transferência..." (ID 49455981).
Dessa forma, o autor agiu sem cautela e concorreu para ocorrência do dano, na medida em que confiou na promessa do amigo e realizou as transferências, inclusive com a utilização de senha pessoal.
Não cabe ao banco a adoção de providências para que o autor recupere o recurso que ele enviou por vontade própria para terceiros.
Assim, resta caracteriza a culpa exclusiva do consumidor, a qual afasta o dever de reparação de danos pelo fornecedor, nos termos do art. 14, § 3º, II do CDC.
Como vítima de golpe, cabe à parte notificar a autoridade policial competente, sendo que a tentativa de empreender investigação por conta própria para rastrear o destino do valor esbarra nos deveres de sigilo da instituição financeira, o qual somente deve ser quebrado por meio de decisão judicial. 9.
Ainda que a Súmula 479 do STJ disponha que "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias", esse entendimento não se aplica ao caso em exame, pois o ilícito ocorreu fora do estabelecimento bancário, fato que configura hipótese de fortuito externo.
A dinâmica utilizada pelos fraudadores para realização das transferências pelo autor não envolveu qualquer falha na segurança dos sistemas do recorrido.
A mera utilização de contas abertas juntas ao recorrido, por si só, não caracteriza fortuito interno, uma vez que a responsabilidade pela utilização/administração da conta cabe ao seu titular. 10.
Assim, considerando que não restou comprovado qualquer conduta ilícita do banco ou defeito na prestação de serviço apto a enseja a reparação extrapatrimonial, não cabe reparo à sentença proferida. 11.
Recurso conhecido e não provido. 12.
Condenado o recorrente vencido ao pagamento de custas e de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95.
Suspensa a exigibilidade da verba sucumbencial em razão da gratuidade de justiça concedida. 13.
A súmula de julgamento servirá de acórdão, consoante disposto no artigo 46 da Lei 9.099/95.” (Acórdão 1750366, 07019152020238070017, Relator: SILVANA DA SILVA CHAVES, Segunda Turma Recursal, data de julgamento: 28/8/2023, publicado no PJe: 6/9/2023.
Pág.: Sem Página Cadastrada.)”.
Não verificado o ato ilícito, restando configurada a ausência de nexo de causalidade entre a conduta da instituição ré e os danos alegados pela autora, o que, à luz do artigo 927 do Código Civil, inexiste o dever de indenizar, dada a ausência dos requisitos autorizadores que caracterizariam tal obrigação.
Eventual pedido de justiça gratuita será objeto de análise em eventual interposição de recurso, dada a ausência de custas iniciais no âmbito da Lei n.° 9099/95.
DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos iniciais.
Sem condenação em custas e honorários advocatícios (arts. 54 e 55 da Lei n.º 9.099/95).
Decorrido o prazo recursal, certifique-se o trânsito em julgado e arquivem-se os autos.
Intimem-se as partes.
Natal/RN, 18 de julho de 2025. (documento assinado digitalmente na forma da Lei n° 11.419/06) ANNA CHRISTINA MONTENEGRO DE MEDEIROS Juíza de Direito
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
27/08/2025
Ultima Atualização
26/08/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Despacho • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Sentença • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Despacho • Arquivo
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