TRF1 - 1034486-89.2024.4.01.3200
1ª instância - 7ª Manaus
Polo Ativo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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08/10/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL Seção Judiciária do Amazonas 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJAM Autos: 1034486-89.2024.4.01.3200 Classe: Ação Civil Pública (65) Polo Ativo: Ministério Público Federal (Procuradoria) Polo Passivo: Francismar Maria de Jesus DECISÃO Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra Francismar Maria de Jesus, por meio da qual pretende a reparação de danos ambientais.
Narrou que, entre 26/06/2020 e 06/06/2023, o IBAMA detectou, por meio de análise de imagens do satélite Sentinel 2, a supressão vegetal ilegal de 217,43 hectares no imóvel rural Sítio Tapajós, localizado na zona rural do Município de Maués/AM.
Em consulta ao sistema SICAR, verificou-se que o Sítio Tapajós pertence à ré Francisamar Maria de Jesus, que realizou o registro do imóvel no CAR em 31/07/2015.
O cadastro está suspenso preventivamente devido à detecção de supressão vegetal não autorizada.
Requereu a concessão de tutela provisória de urgência para proibição de explorar de qualquer modo a área desmatada cuja regeneração se busca; a proibição para a emissão de Guias de Transporte Animal (GTAs); a suspensão e proibição ao acesso a financiamentos públicos e benefícios fiscais; a autorização a todo órgão de controle e fiscalização para a imediata apreensão, retirada e destruição de qualquer bem móvel ou imóvel existentes na área desmatada que estejam impedindo a regeneração natural da floresta.
Requereu, ainda, a inversão do ônus da prova. É o relatório.
DECIDO. i.
Está demonstrada a competência da Justiça Federal, uma vez que o desmatamento e respectivo dano ambiental teria ocorrido em área sobreposta à Gleba Federal Imóvel Buiuçú, portanto, área pertencente à União (art. 109, I da CRFB). ii.
Nos termos do art. 300 do CPC, para a concessão da tutela de urgência são exigidos elementos que evidenciem a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (periculum in mora).
A antecipação dos efeitos da tutela tem por função a imediata realização da tutela pretendida nos autos, nos casos em que o transcurso do lapso entre o ajuizamento da demanda e a prolação da sentença final possa colocar em risco ou mesmo comprometer a própria realização do direito material discutido.
Como tempo necessário para a obtenção da tutela definitiva pode colocar em risco o direito discutido, trata-se de importante técnica processual, cuja principal finalidade é minimizar os males do tempo e garantir a efetividade da jurisdição (os efeitos da tutela), consoante lição de Luiz Guilherme Marinoni.
Conforme Relatório de Fiscalização do IBAMA (id. 2150804248), foi lavrado o Auto de Infração n° 2J445S6-N e o Termo de Embargo nº DQA7LSJ-T em razão deste descumprimento e impedimento à regeneração natural de floresta nativa.
A requerida Francismar Maria de Jesus é titular do imóvel rural desmatado, denominado Sítio Tapajós, CAR n°1302900-ED321E04B6D441B89C911E41AB6AA95D, (id. 2150638372).
De acordo com o relatório técnico do órgão, não foi identificada autorização para desmatamento ou supressão vegetal na área.
Estão demonstrados os pressupostos legais para deferimento da tutela de urgência de natureza antecipatória, porquanto demonstrada a prática contínua de ilícitos.
A presente ação civil pública discute responsabilidade civil ambiental, por desmatamento florestal, tendo o MPF sustentado a necessidade de fazer cessar o estado de ilicitude que vem, ao longo de anos, gerando danos ambientais na localidade.
Assim, a tutela de urgência pretendida tem por finalidade garantir que futura obrigação de recuperar integralmente a área possa operar-se de forma eficaz.
Enquanto explorada ilegalmente a área, consolida-se tanto o desmatamento já existente (impedindo a regeneração natural da vegetação), como também perpetua os ilícitos já detectados, em violação ao sistema jurídico, com destaque aos princípios, normas e mecanismos protetivos do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e sadio (caput do art. 225 da CRFB).
Somada a esta grave violação de normas protetivas a direitos fundamentais, existe o dano às comunidades agroextrativistas, que são privadas de seus meios de subsistência, porquanto a implantação de pecuária extensiva pressupõe desmatamento a corte raso, com formação de pasto e retirada da cobertura florestal da qual dependem comunidades de castanheiros, açaizeiros e outras comunidades que dependem da floresta em pé para a sua subsistência.
O descumprimento sistemático e insistente das sanções administrativas impostas pelos órgãos ambientais no exercício do poder de polícia ambiental também compromete os pilares de concretização do Estado Socioambiental de Direito, na medida em que sinaliza que a transgressão ambiental “compensa” para o infrator, afinal, este aufere ganhos fáceis com a exploração de recursos naturais (tais como o solo), sem que lhe seja imposta a obrigação de internalizar os impactos negativos sentidos pela coletividade difusa.
A manutenção desse estado de ilicitude quanto à ocupação e exploração de área ilegalmente desmatada consolida o dano ambiental e perpetua as perdas ecossistêmicas já verificadas.
Aliás, a continuidade da prática danosa ao meio ambiente, agrava ainda mais o dano ambiental, na medida em que a fragmentação da Floresta Amazônica facilita o acesso a áreas ainda preservadas, permitindo que a floresta sofra incrementos de desmatamento que, segundo a ciência, podem levá-la ao ponto de inflexão (também conhecido como ponto de não retorno ou “tipping point”1), circunstância na qual a floresta, sofrendo grandes perturbações em seu ecossistema, perde suas características essenciais bem como sua capacidade de resiliência.
Logo, está caracterizado o periculum in mora, consistente em fundado receio de dano ambiental irreparável ou de difícil reparação, porquanto enquanto se mantém a exploração da área ilegalmente desmatada, fica comprometida a possibilidade de regeneração da vegetação.
A área desmatada ilicitamente soma 217,43 hectares e, estimado pelo IBAMA o custo de reparação do dano em R$ 10.742,00 por hectare, o MPF pretende a condenação dos requeridos em indenização correspondente a R$ 2.335.633,06, não contabilizados os danos intermediários e residuais, custo social do ilícito e dos lucros ilicitamente obtidos.
Descabe, neste momento, tecer considerações acerca da natureza jurídica da responsabilidade civil ambiental, porquanto a tutela de urgência, considerada isoladamente, tem por finalidade fazer cessar a infração e o ilícito ambiental constatado na área, ou seja, tem por finalidade impedir que a área continue sendo explorada, a fim de permitir ao meio ambiente a sua regeneração natural.
Em se permitindo que o estado de ilicitude ambiental perpetue-se no tempo (supressão vegetal ilícita da área, o que ocasiona impedimento de regeneração), os danos existentes no local podem tornar-se irreversíveis para o meio ambiente e para a integridade da Floresta Amazônica.
A ausência de licenciamento ambiental para a atividade exercida na área, por si só, evidencia o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, pela dificuldade de se identificar o status quo que servirá de parâmetro para a reparação integral do dano.
Desse modo, está satisfeito, portanto, o pressuposto do periculum in mora.
No que concerne ao fundado receio de dano irreparável, ainda é preciso lembrar que o ilícito dos autos coloca em risco não apenas os valores e bens de natureza estritamente ambiental, mas também compromete os meios para concretização de uma política agrária que seja conducente à justiça socioambiental.
Para além da violação dos princípios da função socioambiental da propriedade, milita em favor do deferimento da tutela de urgência o princípio in dubio pro natura, que, no caso dos autos, recomenda, diante das incertezas e complexidades quanto à possível recomposição integral da área degradada, que se deve optar por medida que maximize a proteção ambiental.
Estão demonstrados os pressupostos de fumus boni iuris e periculum in mora, impondo-se o deferimento das medidas para desocupação a área, retirada do gado e para fazer cessar o estado de degradação ambiental florestal na área.
No mesmo sentido, impõe-se suspender a emissão de GTAs e notas fiscais para eventual rebanho na área.
A suspensão de eventuais financiamentos públicos e benefícios fiscais de titularidade dos requeridos vinculados à exploração de atividades rurais, até julgamento final da ação, é medida cautelar que evitará a captação e a utilização de recursos públicos para atividades nocivas ao meio ambiental, razão pela qual deve ser deferida.
Sobre o assunto, colaciono julgado do TRF 1ª Região: PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO IBAMA PARA IMPEDIR DESMATAMENTO OU QUALQUER ESPÉCIE DE EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE PECUÁRIA OU FLORESTAL SOBRE ÁREA DA AMAZÔNIA LEGAL.
DESOCUPAÇÃO E RECUPERAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA.
AUTUAÇÃO POR INFRAÇÃO E IMPOSIÇÃO DE MULTA.
INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ADMINISTRATIVO.
EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO SOB FUNDAMENTO DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR DO IBAMA ENQUANTO NÃO ESGOTADA PELO ADMINISTRADO A VIA ADMINISTRATIVA.
REFORMA DE SENTENÇA.
PRESENÇA DO INTERESSE DE AGIR EM JUÍZO DO ÓRGÃO AMBIENTAL PARA REPARAÇÃO CÍVEL DO DANO.
DEVOLUÇÃO DOS AUTOS A ORIGEM PARA REALIZAÇÃO DE PERÍCIA TÉCNICA REQUERIDA PELO RÉU APELADO E PARA RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
PEDIDO DE CONCESSÃO DE LIMINAR FORMULADO PELO IBAMA EM SEDE DE APELAÇÃO FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA. [...] 10.
O desmate com corte raro de 698,3/ha de floresta nativa, na Amazônia Legal, com ou sem autorização do IBAMA altera adversamente as características do meio ambiente.
A ocorrência de degradação da qualidade ambiental decorrente da atividade do réu afeta desfavoravelmente a biota, ex vi do art. 3º da Lei 6.938/1981. 11. [...]. 12.
O desmatamento incontrolado para prática de pastagem e plantio de soja em área protegida e a necessidade de se manter o equilíbrio ecológico global, impõe a concessão da liminar requerida pelo IBAMA para ordenar: (a) que o réu se abstenha de promover o desmatamento ou qualquer outra espécie de exploração ou atividade agropecuária ou florestal sobre a área desmatada, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais) por hectare; (b) desocupação imediata pelo réu e seus prepostos da área degradada, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); (c) suspensão do réu da participação em linha de financiamento oficiais de crédito, até julgamento final da ação; (d) suspensão a incentivos e benefícios fiscais. 13.
Oficiar ao Banco Central, a Receita Federal do Brasil, à Secretaria do Estado de Mato Grosso e Secretaria da Fazenda do Município de Feliz Natal. (AC 0002835-36.2009.4.01.3603 / MT, Rel.
DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA, QUINTA TURMA, e-DJF1 p.570 de 07/12/2012).
Ressalte-se que, de acordo com os documentos trazidos à colação, foi possível identificar a requerida como a responsável pela área degradada. iii.
Quanto ao pedido de inversão do ônus da prova, a sua distribuição dinâmica apresenta dois aspectos: objetivo (regra de julgamento) e subjetivo (regra processual de produção e custeio da prova).
Ademais, a inversão pode decorrer da lei (“ope legis”) ou decorrer de determinação judicial (“ope judicis”).
Na hipótese dos autos, o influxo dos princípios de Direito Ambiental, com destaque aos princípios da precaução, prevenção, in dubio pro natura e até mesmo o princípio do poluidor pagador, costumam fundamentar normativamente a inversão do ônus da prova, com vistas a recair para o requerido o dever de demonstrar que não concorreu para o evento danoso e tampouco omitiu-se quanto ao dever de proteção do meio ambiente, imposto constitucionalmente ao Poder Público e à coletividade, nos moldes do art. 225, caput, da CF/88.
Não obstante, a inversão é quase sempre feita judicialmente na fase de saneamento, até mesmo para franquear à parte contrária manifestar-se expressamente quanto a este pedido.
A despeito da gravidade dos danos noticiados nos autos (desmatamentos de grandes áreas), que podem colocar em risco o equilíbrio do ecossistema amazônico (com preservação da sua biodiversidade), dos recursos hídricos e do ciclo hidrológico, além da possibilidade de alterarem drástica e irreversivelmente o clima do planeta; a inversão liminar do ônus da prova não terá o condão de propiciar o pronto reflorestamento imediato das áreas desmatadas.
Em outras palavras, inverter o ônus da prova liminarmente ou após o prazo de contestação não modificará a realidade processual quanto à produção e custeio da prova pela parte requerida, mormente quando, para desincumbir-se do ônus, deverá o requerido ser comunicado processualmente da decisão.
Por fim, não se deve confundir questões sujeitas à inversão do ônus da prova, com matéria cuja prova está sujeita a ônus do próprio requerido.
Assim, demonstrar a existência de licenciamento ambiental, ou de posse regular/autorizada na área, é ônus do requerido, o que dispensaria, em princípio, a inversão pleiteada.
Mesmo assim, todas estas questões deverão ser analisadas após a fase postulatória, razão pela qual o pedido de inversão do ônus fica postergado para a fase de saneamento.
Diante do exposto, DEFIRO a antecipação de tutela pleiteada na inicial para ordenar: 1.
Que a parte requerida RETIRE, caso haja, no prazo de 15 (quinze) dias, a contar da ciência efetiva desta decisão, todo o rebanho bovino da área correlata ao imóvel rural (Sítio Tapajós) objeto da presente ação; 2.
A PROIBIÇÃO, pela ADAF e pela SEFAZ, de emissão de quaisquer Guias de Transporte Animal – GTA e de notas fiscais para a movimentação de gado proveniente de ou destinada ao imóvel rural (Sítio Tapajós) objeto destes autos. 3.
A SUSPENSÃO e a PROIBIÇÃO a acessos a financiamentos públicos e benefícios fiscais vinculados ao imóvel rural (Sítio Tapajós) objeto do feito, bem como a quaisquer financiamentos rurais em nome dos requeridos, ainda que relativos a outros imóveis, a fim de evitar-se o financiamento indireto fraudulento.
Para tanto, OFICIE-SE ao Banco Central do Brasil, a fim de que seja emitido comunicado a todas as instituições oficiais de crédito – integrantes do SFN. 4.
SUSPENSÃO, pelo IPAAM e pelo INCRA, de todos os Cadastros Ambientais Rurais - CAR e inscrição SIGEF de titularidade da parte requerida incidentes sobre o Projeto de Assentamento Rio Juma e glebas públicas federais, notadamente referentes ao seguinte imóvel rural: (Sítio Tapajós) (CAR n°1302900-ED321E04B6D441B89C911E41AB6AA95D).
Para tanto, OFICIE-SE ao IPAAM e ao INCRA, para cumprimento da medida.
COMUNIQUE-SE os órgãos responsáveis pela emissão da GTA e de notas fiscais, notadamente a Agência de Defesa Agropecuária e Florestal do Amazonas – ADAF e a Secretaria de Estado da Fazenda do Amazonas – SEFAZ, para cumprirem o quanto consignado nesta decisão. 5.
AUTORIZO aos órgãos de controle e fiscalização a imediata apreensão, retirada e destruição de qualquer bem móvel ou imóvel existentes na área que estejam impedindo a regeneração natural da floresta ilegalmente desmatada.
CUMPRA-SE em caráter de urgência.
Cumpridas as determinações supra, CITE-SE e INTIME-SE o requerido para a ciência.
Manaus/AM, data da assinatura digital.
MARA ELISA ANDRADE Juíza Federal -
01/10/2024 15:22
Recebido pelo Distribuidor
-
01/10/2024 15:22
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
-
01/10/2024 15:22
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
01/10/2024
Ultima Atualização
08/10/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Decisão • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
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