TRF1 - 1018243-95.2023.4.01.3300
1ª instância - 10ª Salvador
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Polo Ativo
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26/09/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária da Bahia 10ª Vara Federal Cível da SJBA SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1018243-95.2023.4.01.3300 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: ELIANA REIS DOS ANJOS e outros REPRESENTANTES POLO ATIVO: ROBERTA MIRANDA TORRES - BA50669, MARCOS SAMPAIO DE SOUZA - BA15899, TERCIO ROBERTO PEIXOTO SOUZA - BA18573, NEILA CRISTINA BOAVENTURA AMARAL - BA35841 e ELBAMAIR CONCEICAO MATOS DINIZ GONCALVES - BA44797 POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros SENTENÇA TIPO "A" I As partes autoras, devidamente qualificadas na inicial, ajuizaram ação ordinária contra a UNIÃO e o IBAMA objetivando, liminarmente, seja determinada a reparação pecuniária emergencial de caráter alimentar no valor de R$ 1.996,00, em duas parcelas iguais, respectivamente, nos prazos de 15 e 30 dias aos pescadores atingidos, já que foram afetados pelo derramamento de óleo que atingiu a costa brasileira, conforme previsto na Medida Provisória n. 908, 28/11/2019 e, no mérito, que se confirme a concessão da liminar, bem como sejam os réus condenados ao pagamento de danos morais e materiais.
Os fundamentos fáticos e jurídicos foram explicitados na peça de ingresso.
Gratuidade da justiça deferida.
Pedido de tutela indeferido.
Os réus apresentaram suas contestações.
Não havendo manifestação das partes quanto a produção de outras provas, os autos vieram-me conclusos para julgamento. É o relatório.
DECIDO.
II Inicialmente cabe registrar que não se revela possível o pleito de inversão do ônus da prova por se tratar de dano ambiental, pois ele NÃO pode ser imputado aos réus, senão de forma indireta por suposta omissão, motivo porque impossível de aplicabilidade o artigo 373, §1º, do Código de Processo Civil.
Outrossim, o fundamento do IBAMA ao arguir a preliminar de inépcia de inicial é de que os pedidos formulados pelas partes autoras são excessivamente genéricos e imprecisos.
Ocorre que, somente após a apreciação do mérito será possível quantificar e dimensionar o dano sofrido, caso este seja comprovado, de modo que tal argumento não é suficiente para configurar inépcia da inicial que, segundo o § 1º, do artigo 330, do CPC, ocorre apenas quando: faltar na inicial pedido ou causa de pedir, o pedido for indeterminado, da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão e contiver pedidos incompatíveis entre si.
Superadas as questões processuais, passo agora ao exame do mérito.
O artigo 1º da Medida Provisória n. 908 de 28 de novembro de 2019 instituiu auxílio emergencial pecuniário, no valor de R$ 1.996,00 (um mil novecentos e noventa e seis reais), a ser pago em duas parcelas iguais, para os pescadores profissionais artesanais inscritos e ativos no Registro Geral da Atividade Pesqueira, com atuação em área marinha ou em área estuarina, domiciliados nos municípios afetados pelas manchas de óleo, conforme relação disponível no sítio eletrônico do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), até a data de publicação da referida medida provisória.
A exposição de motivos da Medida Provisória n. 908/2019, esclarece, a propósito, que: “Segundo informações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, aproximadamente 100 municípios, distribuídos nos 9 estados da costa do nordeste brasileiro, foram atingidos pelas manchas de óleo, com diferentes níveis de impacto”.
No sítio eletrônico da Marinha do Brasil, consta, por sua vez, que: “O crime ambiental que afetou a costa brasileira do Nordeste e Sudeste, desde 30 de agosto de 2019, é inédito e sem precedentes na nossa história, por ter ocorrido sem que o responsável tenha se apresentado voluntariamente e, também, prestado apoio para conter o derramamento de óleo.
Desde o início da identificação das primeiras manchas de óleo, o Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA), composto pela MB, IBAMA e ANP, juntamente com instituições governamentais (federais, estaduais e municipais), demais Forças Armadas, comunidade científica, universidades, além da valorosa participação de voluntários, uniram esforços para mitigar os efeitos do óleo, com êxito.
Da mesma forma, a MB iniciou uma investigação complexa, contando com a participação de diversas instituições, técnicas, científicas e especializadas, brasileiras e estrangeiras, exigindo conhecimento em várias áreas de estudo: oceanografia, meteorologia, química do petróleo e seus derivados, modelagem matemática, estatística e criminalística.
A MB tem trabalhado de forma cooperativa com o inquérito criminal instaurado pela Polícia Federal e realizado reuniões com representantes da CPI do Óleo, de modo a mantê-los a par da complexidade do trabalho e da evolução sobre a apuração desse inédito incidente.
Sob coordenação do GAA, entre setembro de 2019 e fevereiro de 2020, foram recolhidos mais de 5.000 toneladas de óleo e resíduos oleosos, entre os estados do Maranhão e Rio de Janeiro, devidamente destinados, observando protocolos ambientais.
No mesmo período, a MB realizou a Operação ‘Amazônia Azul – Mar Limpo é Vida’, em três fases, com emprego maciço de meios e pessoal, em coordenação com os entes supramencionados”.
Com efeito, o artigo 225 da Carta Magna de 1988 assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações, mediante, dentre outras providências, a preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais, provendo o manejo das espécies e ecossistemas; além de proteger a fauna e flora, vedadas as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
Dentro dessa seara, o parágrafo 3º do mesmo dispositivo sujeita o infrator, seja pessoa física, seja pessoa jurídica, às sanções penais e administrativas, independente da obrigação de reparar os danos causados, nos casos de condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente.
Em se tratando de incidentes por poluição por óleo em águas sob jurisdição nacional, tal como sói ocorrer in casu, o artigo 27, parágrafo 2º do Decreto n. 8.127/2013 atribui ao Poder Executivo Federal, enquanto não identificado o poluidor, os custos relativos às atividades de resposta e mitigação dos danos causados.
A Lei n. 8.742/93 – dispõe sobre a Assistência Social, dentre outras providências –, em seu artigo 12, inciso III, atribui à União, por sua vez, a obrigação de “atender, em conjunto com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, às ações assistenciais de caráter de emergência”.
Tanto é assim que, na exposição de motivos da Medida Provisória n. 908/2019, a necessidade de pagamento do auxílio emergencial aos pescadores foi justificada nos seguintes termos: “Diante da situação em que se encontra os pescadores dos municípios atingidos pelo óleo, é de fundamental importância que a União os auxiliem a fim de minimizar os impactos sociais e econômicos desastrosos advindos pela chagada do óleo no litoral brasileiro”.
Como acima consignado, a Medida Provisória n. 908/2019 estabeleceu a necessidade de atendimento de dois requisitos para a concessão do auxílio emergencial pecuniário.
O primeiro deles reclama a qualidade de pescador profissional artesanal inscrito e com registro ativo no Registro Geral da Atividade Pesqueira.
Não se trata, portanto, de todo aquele que se dedica à atividade pesqueira, mas apenas do pescador profissional artesanal, que consiste, de acordo com o artigo 2º, inciso I do Decreto n. 8.425/2015, na “pessoa física, brasileira ou estrangeira, residente no País, que exerce a pesca com fins comerciais de forma autônoma ou em regime de economia familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parceria, podendo atuar de forma desembarcada ou utilizar embarcação de pesca com arqueação bruta menor ou igual a vinte”.
A Medida Provisória n. 908/2019 não contemplou, portanto, o pescador profissional industrial (empregado), o armador de pesca (atua em embarcação própria ou de terceiro), o aprendiz de pesca (maior de 14 e menor de 18 anos), o pescador amador ou esportivo (atua com finalidade de lazer ou desporto), tampouco os pescadores de subsistência (praticam a atividade de pesca com fins de consumo doméstico ou escambo sem fins de lucro e que utilizem petrechos previstos em legislação específica – artigo 3º, parágrafo 1º, inciso I do Decreto n. 8.425/2015).
E tal proceder decorre do escopo de minimizar os impactos decorrentes do desastre ambiental para as pessoas que sobrevivem artesanalmente do exercício da pesca, considerando, inclusive, que, embora não tivesse havido proibição oficial do consumo e comercialização do pescado em virtude das manchas de óleo, como ocorre nas situações ensejadoras do seguro defeso, por exemplo, a exposição de motivos da Medida Provisória n. 908/2019 reconheceu que “a atividade de pesca está inviabilizada, pois a precaução impera entre pescadores e consumidores das regiões afetadas”.
Com efeito, objetivando delimitar os atingidos e, por conseguinte, os beneficiários do auxílio emergencial pecuniário, a Administração precisava se valer de um critério objetivo capaz de evidenciar, a um só tempo, não apenas o exercício, mas igualmente a atualidade da atividade pesqueira de pequeno porte.
Por essa razão, foi exigido o registro ativo no RGP (Registro Geral de Pesca), na qualidade de pescador artesanal profissional.
Note-se que não se revelaria cabível a inclusão dos pescadores de subsistência, haja vista que para os mesmos é dispensada a inscrição no RGP (Registro Geral de Pesca), na forma prevista no artigo 3º, parágrafo 1º, inciso I do Decreto n. 8.425/2015, a impedir o efetivo controle do exercício da atividade de pesca.
Na hipótese em exame, embora os integrantes do pólo ativo tivessem exibido suas respectivas carteiras de pescador profissional, não demonstraram, como lhes competia, na forma prevista no artigo 373, inciso I do Código de Processo Civil, que o registro estivesse ativo, a infirmar o atendimento da primeira exigência reclamada para a concessão do auxílio emergencial pecuniário.
Além disso, os suplicantes sequer comprovaram terem sido afetados diretamente pelo derramamento de óleo, uma vez que não se desincumbiram de seu ônus probatório.
Sendo assim, à míngua da comprovação do atendimento das exigências previstas no artigo 1º da Medida Provisória n. 908/2019, outro caminho não resta a não ser a rejeição da pretensão deduzida.
Mas não é só.
As justificativas apresentadas pelos réus são pertinentes, descaracterizando a alegada omissão e, por consequência, a responsabilidade que se lhes pretendem atribuir, pois, na situação, o Poder Público somente responderia se fosse demonstrada a sua omissão culposa na fiscalização da atividade, não se podendo atribuir ao ente público a responsabilidade solidária por todo e qualquer dano ambiental ocorrido sem a sua fiscalização.
Nesta trilha, colhe-se da jurisprudência: “O Poder Público responde pelos danos ambientais não só em razão da prática de atos lícitos dos quais decorra lesão imediata ao meio ambiente, como no caso da construção de estradas, aterros sanitários, etc., quando sua responsabilidade será objetiva, mas também quando se omite em seu dever de fiscalizar atividades que importem em degradação ao meio ambiente, casos em que sua responsabilidade será subjetiva em razão de ato omissivo.
Nestes casos, há que ser demonstrada a omissão culposa (culpa lato sensu) na fiscalização da atividade, não se podendo atribuir ao ente público a responsabilidade solidária por todo e qualquer dano ambiental ocorrido sem a sua fiscalização.” (APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0433.10.007924-6/001 - COMARCA DE MONTES CLAROS - 1º APELANTE: MARIA DE JESUS RODRIGUES PEREIRA ME (MICROEMPRESA) , E OUTRA, MARIA DE JESUS RODRIGUES PEREIRA - 2º APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - APELADO (A)(S): MARIA DE JESUS RODRIGUES PEREIRA ME (MICROEMPRESA) , E OUTRA, MARIA DE JESUS RODRIGUES PEREIRA, MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, ESTADO DE MINAS GERAIS).
Os autores parecem que não aquilataram adequadamente a compreensão jurídica da responsabilidade ambiental dos réus ao instituí-los ou mesmo equipara-los a poluidor ou degradador ambiental e, a partir daí, caracterizar sua responsabilidade objetiva, o que não tem fundamento na ordem jurídica, seja por não configurada a imaginada omissão, seja por não terem participado direta ou indiretamente do desastre ambiental.
Aliás, por isso, não tem pertinência temática nesta demanda o Tema 439/STJ, pois inexiste responsabilidade por omissão ou comissão dos réus, até porque, repita-se, trata-se de desastre ambiental de proporções elevadas que escapam ao controle dos entes estatais.
Aqui igualmente merece ser rechaçado invocar a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, da qual o Brasil é signatário (Decreto nº 1539/1995), porque o seu artigo 194, de forma coerente, registra que as medidas que os Estados soberanos devem tomar para prevenir e coibir a poluição ao meio ambiente se circunscreve “as suas possibilidades e devem esforçar-se por harmonizar as suas políticas a esse respeito”.
Da mesma forma, por não existir a propalada omissão dos requeridos quanto ao desastre ambiental e às suas imediatas consequências (difíceis de se evitar na situação examinada) inapropriada a jurisprudência colecionada pelos autores.
Desse modo, não caracterizada responsabilidade dos réus quanto ao desastre ambiental e às suas consequências, também resta prejudicada a responsabilização destes ao pagamento de danos materiais e morais decorrentes do alegado desastre.
III ISTO POSTO, julgo IMPROCEDENTES os pedidos.
Condeno as partes autoras no pagamento de custas e honorários advocatícios de sucumbência, ora fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, observado o artigo 98, § 3º, do Diploma Processual, eis que deferida a gratuidade de justiça.
Interposta apelação, antes do encaminhamento dos autos para o Tribunal, a parte recorrida deverá ser intimada para respondê-la no prazo legal.
Advindo o trânsito em julgado sem modificação do conteúdo desta sentença, arquivem-se.
Registrada automaticamente.
Intimem-se.
Salvador/BA, data constante da assinatura eletrônica.
CRISTIANO MIRANDA DE SANTANA Juiz Federal -
13/03/2023 16:24
Recebido pelo Distribuidor
-
13/03/2023 16:24
Distribuído por dependência
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
13/03/2023
Ultima Atualização
18/10/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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